Cerca de 6 mil contêineres deixaram de ser movimentados na Bahia

Por conta dos protestos, o acesso de caminhões ao Porto de Salvador está bloqueado há uma semana

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  • Da Redação

Publicado em 22 de maio de 2018 às 05:00

- Atualizado há um ano

. Crédito: Foto: Mauro Akin Nassor/CORREIO

Caminhoneiros bloquearam trecho da BA-526, que dá acesso ao CIA/Aeroporto (Foto: Mauro Akin Assor) Insatisfeitos com uma alta no custo do óleo diesel – que chegou a 56,5% desde que a Petrobras adotou a política de reajustes diários nos derivados de petróleo – caminhoneiros fizeram bloqueios em pistas de 17 estados brasileiros, segundo a Polícia Rodoviária Federal (PRF). Os motoristas pedem a retirada dos tributos sobre o diesel. Os estados com maior número de bloqueios foram o Paraná (19), Bahia (14), Minas Gerais (14) e Goiás (10), segundo a polícia.  

Na Bahia, de acordo com a PRF, houve bloqueios na BR-324, na altura de Amélia Rodrigues. Os caminhoneiros fecharam outro trecho da BR-324, no Km 430, em Riachão do Jacuípe, a 186 km de Salvador.  Por volta das 4h, os motoristas interditaram dois pontos da BR-116, no Sudoeste do estado, segundo a ViaBahia: no Km 814, no trecho da cidade de Vitória da Conquista, e no Km 672, da BR-116, em Jequié. No Km 875 da BR-242, na cidade de Luis Eduardo Magalhães, Oeste do estado, os manifestantes fecharam os dois sentidos da via. 

Mas aqui no estado, o protesto começou há pouco mais de uma semana. Desde o último dia 14, caminhoneiros autônomos, que trabalham fazendo a carga e descarga de produtos importados e exportados no Porto de Salvador, cruzaram os braços. Além disso, os trabalhadores estariam fazendo pressão para evitar a movimentação de cargas por parte das empresas transportadoras, como noticiado ontem na coluna Farol Econônomico. 

A estimativa de representantes das transportadoras é de que até 6 mil contêineres tenham deixado de ser movimentados no período. O Terminal de Contêineres (Tecon) não se pronunciou a respeito do assunto. 

O que eles querem

Aqui na Bahia, a pauta de reivindicações dos motoristas é pelo reajuste na tabela de frete, que estaria congelada há três anos, e a reposição de parte da alta do óleo diesel. O percentual cobrado é de 38%. As empresas transportadoras ofereceram na última semana uma contraproposta de 15%, parcelados em duas vezes. 

Nacionalmente, a Associação Brasileira dos Caminhoneiros (Abcam) pede que o governo zere a carga tributária que incide sobre o óleo diesel. Também cobra a isenção da Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico (Cide) sobre a receita decorrente da venda interna de óleo diesel ao transportador autônomo de cargas. 

Associações que representam o setor produtivo, como a Associação dos Produtores de Soja e Milho de Mato Grosso (Aprosoja-MT) e Associação das Empresas Cerealistas do Brasil (Acebra), se mostraram preocupadas com o efeito da paralisação no escoamento da soja. A Associação Brasileira das Indústrias de Óleos Vegetais (Abiove) disse que ainda é cedo para traçar potenciais prejuízos, mas destacou estar monitorando os protestos.

O vice-presidente do Conselho de Portos da Fieb, Sérgio Faria, avalia o cenário de reajustes diários dos combustíveis como muito negativo para o país. “O governo precisa rever isso”, acredita. Apesar disso, ele lamenta que o setor produtivo esteja sendo prejudicado por uma questão que, na opinião dele, deveria ser solucionada pelas transportadoras e os motoristas autônomos. “Várias fábricas dependem de peças e insumos que chegam pelo porto ou saem por terminais secundários que não podem ser abastecidos. É de se imaginar que é assustador ter, por uma semana, toda uma parcela significativa da economia baiana paralisada”, disse.

Empresas como a Ford, Continental e Engepack, entre outras instaladas no Polo Industrial de Camaçari, estariam tendo dificuldades para receber matéria-prima, e manter as unidades em operação, como mostrou o Farol Econômico. Em outros casos, a paralisação prejudica aquelas indústrias que produzem, mas não conseguem escoar os seus produtos. 

Pelo Brasil

No Porto de Santos, caminhoneiros protestaram, mas a Companhia Docas do Estado de São Paulo (Codesp) disse que o ato era pacífico, sem bloqueio à entrada de caminhões cujos motoristas queriam seguir. O protesto começou na madrugada e não houve interrupção no acesso ao porto. O único incidente ocorreu em acesso no município de Guarujá (SP), onde uma carreta foi desatrelada e atrapalhou o fluxo da via urbana até a região portuária. 

Em Mato Grosso, estado que lidera a produção de grãos do país, caminhoneiros bloquearam no início da tarde a BR-364 no Km 398 sentido sul, no Distrito Industrial de Cuiabá, informou a concessionária Rota do Oeste. A manifestação começou às 8h12, foi interrompida ao meio-dia e retomada à tarde. 

Em Pernambuco, a manifestação aconteceu no Km 83 da BR-101, em Jaboatão dos Guararapes, Região Metropolitana do Recife. O ato ocorre nas imediações da fábrica da Vitarella. De acordo com a PRF, os caminhões estão estacionados em uma das faixas da rodovia. 

No Ceará, cerca de 50 caminhoneiros bloqueiam trecho da BR-020. Um dos bloqueios é no Anel Viário, em Maracanaú, no Km 419, em frente ao Posto Pioneiro. Os sentidos Caucaia/Fortaleza e Fortaleza/Caucaia estão alterados. Os trabalhadores queimaram pneus para impedir a circulação do trânsito. O Corpo de Bombeiros foi acionado. 

A Petrobras defende que as revisões diárias podem ou não se refletir para o consumidor final. Mas, segundo a Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e dos Biocombustíveis (ANP), o preço médio do diesel este ano já acumula alta de 8%. No mesmo período, a inflação acumulada é de 0,92%.

Motorista vende os caminhões

O caminhoneiro Nildo Santos, 41 anos, trabalha há 10 anos pelas estradas do Brasil. Conquistou sucesso profissional e chegou a ter cinco caminhões na sua frota particular. Há oito meses começou a se desfazer dos veículos: vendeu quatro e ficou apenas com um para trabalhar. Alguns dos veículos chegaram a valer R$ 200 mil. O preço do diesel e a redução de fretes colaboraram para uma queda de 80% no faturamento dele, que é natural de Maraú, no Baixo Sul baiano, mas vive em Lauro de Freitas. Longe de representar um caso único, a realidade de Nildo é reflexo da crise vivenciada pela atividade, após a alta do diesel

“A situação está cada vez mais difícil. Eu já cheguei a abastercer o caminhão com o litro do diesel por R$ 2. Esta semana,  o valor estava R$ 4,20 em Ilhéus (Sul do estado). O problema é que o valor do frete não aumenta junto. A conta não fecha. O preço do combustível está cada vez mais alto e os fretes não acompanham”, explica. 

Segundo Luciano Oliva, diretor do sindicato que representa a categoria na mesa de negociação com as empresas transportadoras, o valor de referência do frete está congelado desde 2015. Uma viagem entre Camaçari e o Porto de Salvador, por exemplo, rende aos motoristas os mesmos R$ 650, apesar dos aumentos nos custos operacionais. “Nós pedimos um reajuste de 38%, eles nos ofereceram 15%, em duas vezes. São R$ 45 agora e mais R$ 45 em setembro, que não pagam nem a manutenção dos veículos”, diz. 

Há 30 anos, o motorista Wellington Santos, 60, trabalha como caminhoneiro pelas estradas do país. Conseguiu, no auge do trabalho, ter três caminhões com dois funcionários. Hoje, trabalha sozinho e tem apenas um dos três veículos.

Temer convoca reunião para tratar do tema

O ministro Eliseu Padilha (Casa Civil) afirmou que o presidente Michel Temer quer rever a situação da alta nos combustíveis para que o preço seja “previsível” para os consumidores. Segundo ele, Temer demonstrou preocupação com os aumentos constantes do valor da gasolina e do diesel. Ontem, o presidente convocou uma reunião com seus ministros para tratar do assunto. O ministro disse ainda, antes de entrar na reunião, que o governo não deve se posicionar sobre o tema antes de uma conversa com representantes da Petrobras, que está agendada para hoje.

“O presidente manifestou interesse em rever a situação para que o preço seja previsível para os caminhoneiros”, afirmou Padilha. Ele minimizou a alta e disse que com o dólar subindo e o petróleo subindo internacionalmente, era certo que haveria variação no combustível no Brasil. 

Em um dia marcado pelos protestos em todo o país, a Petrobras anunciou um novo aumento no preço dos combustíveis de  0,9% para a gasolina e 0,97% para o diesel nas refinarias - 7º aumento consecutivo do produto.