Cheiros e sabores espalhados em quintais, canteiros, terraços e lajes de Salvador

Atualmente, a Prefeitura analisa 160 solicitações de implantações de novas hortas urbanas na capital baiana

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  • Carmen Vasconcelos

Publicado em 13 de janeiro de 2019 às 07:00

- Atualizado há um ano

. Crédito: Mauro Akin Nassor

Consumir produtos sem agrotóxicos, ter um hobby, estreitar o contato com a natureza, realizar uma alimentação com mais qualidade. As razões que fazem as pessoas plantarem hortas em casa ou em espaços públicos são variados e se constituem como uma tendência nos grandes centros urbanos.  Em Salvador, as hortas urbanas se transformaram numa ferramenta importante de coesão social, aproximando vizinhos que antes sequer se conheciam, funcionando como um hobby individual e coletivo. Em muitos lugares, o excedente da produção tem contribuído com o trabalho de instituições beneficentes, que recebem os produtos para complementar a alimentação dos assistidos.   Para assegurar o suporte técnico e estreitar as relações entre o poder público e a sociedade civil organizada, desde 2016, a Secretaria de Sustentabilidade, Inovação e Resiliência (SECIS) tem auxiliado às comunidades a implantarem hortas em espaços públicos e escolas. Esse ano, a iniciativa também se estenderá aos postos de saúde e a sete terreiros de candomblé. Participação cidadã De acordo com o Secretário André Fraga, após a solicitação do cidadão, os representantes da SECIS vão até o local avaliar as condições do espaço, do solo e se há a necessidade de retirada de lixo. “No entanto, é o engajamento da comunidade que vai assegurar nossa ação porque a continuidade da horta dependerá dessas pessoas”, completa, ressaltando que, atualmente, a secretária analisa 160 solicitações de implantação de novas hortas.  Atualmente, a capital baiana conta com 22 hortas urbanas apoiadas pela Prefeitura, sendo 11 em comunidades e 11 em escolas municipais. Fraga ressalta que Pituba, Itaigara e Imbuí são os bairros onde existem mais demanda para essas ações. “Nesses locais, as hortas possibilitaram que pessoas que estavam depressivas conseguissem vencer a doença, além de ter permitido que a vizinhança se fortalecesse e estabelecesse laços mais afetivos”, completa.   Esse ano, o plano da Prefeitura é implantar meliponários para criação de abelhas sem ferrão que ajudarão a polinizar áreas da capital, além de estações de compostagem para o lixo orgânico junto às hortas que já estão em funcionamento.  O representante da Prefeitura Municipal explica que para conseguir o suporte técnico não há um critério espacial e qualquer terreno pode se habilitar, independentemente do tamanho. “Em algumas situações, percebemos que não cabe horta, mas é possível desenvolver uma horta, por exemplo, ou até mesmo plantar a vegetação nativa da Mata Atlântica”, esclarece. Fraga destaca ainda que as hortas implantadas nos centros de saúde terão um aspecto medicinal e que o poder público também fará a capacitação dos profissionais de saúde para que os mesmos possam acessar os produtos como remédios naturais.  Atualmente, cerca de 11 escolas da rede municipais estão com hortas implementadas que ajudam a merenda escolar e que os alunos aprendem com o cultivo (Danilo Cardoso/Divulgação) Lembranças do interior Quem pensa que a iniciativa de hortas é limitada à comunidades talvez desconheça histórias como a de Jailson Sena, morador de Nova Esperança. Ele não apenas tem uma horta na laje de casa, dividindo a produção com a vizinhança como também realiza seu cultivo aproveitando garrafões de água mineral vencidos.  Nascido e criado na roça no município de Antônio Cardoso (a 139 km de Salvador), Jailson chegou em Salvador e comprou um terreno para construir a casa para sua família. “Estava acostumado com as plantas e sentia falta do verde na minha vida, especialmente no verão, quando o calor e o sol deixam tudo insuportável”, explica. Assim, depois da construção, a laje foi destinada aos pés de couve, hortelã, coentro e outras tantas variedades de ervas e verduras. “Comecei a usar o que tinha à mão. Os garrafões de água era o lixo do depósito do meu cunhado, o adubo para as plantas vem do curral da minha família no interior, tudo natural e sem aditivos químicos”, esclarece, sem esconder o orgulho.  Com restos de madeira e os garrafões, ele foi arrumando tudo aos poucos e foi pegando gosto pela produção que é, generosamente, distribuída entre os vizinhos e amigos. “Cada um fazendo a sua parte, a vida fica mais leve, não é”, completa com sua sabedoria de homem simples.   O Salvador Shopping criou o Terraço Verde e consegue produzir orgânicos para o consumo dos restaurantes além de produzir adubo que é doado para outras hortas(Foto: Roberto Abreu/Divulgação) Terraço Especial Para se ter uma ideia do crescimento desse tipo de iniciativa, basta destacar que a capital baiana fornece o solo para uma iniciativa pioneira no Nordeste que é o Terraço Verde, implementado pelo Salvador Shopping que transformou 1. 500 metros quadrados da sede do empreendimento comercial numa grande horta urbana, com direito a produção de adubo orgânico.  De acordo com o coordenador de Desenvolvimento Socioambiental do Grupo JCPM Fabiano Mehmeri, a proposta surgiu inicialmente numa tentativa de resolver a destinação do lixo produzido pelos bares e restaurantes do Salvador Shopping. “Depois de implantarmos a coleta seletiva e a parceria com as cooperativas de reciclagem sobrava a questão do lixo orgânico e, foi assim que nasceu a ideia de trabalhar esses resíduos por meio de bio otimização, realizando uma compostagem e a geração de adubos”, esclarece. Ele ressalta que, atualmente, a iniciativa conta com 27 restaurantes parceiros e tem capacidade de produzir dez toneladas de adubo.  Da produção de adubo para a implantação de uma grande horta orgânica foi um pulo. “O terraço do shopping se transformou numa área verde, com o plantio de 15 variedades de hortaliças”, diz Mehmeri, ressaltando que, hoje, existem 900 células com mais de 4 mil mudas e com capacidade de dobrar essa produção. “A produção é vendida para os restaurantes parceiros que compram esses produtos com o preço 40% menor que o mercado”, esclarece o coordenador, ressaltando que o custo cobrado é revertido para a sustentabilidade desse espaço. Mensalmente, o Terraço Verde destina 1 tonelada de adubo orgânico para outras hortas urbanas conveniadas com a Prefeitura Municipal.  Para Fabiano Mehmeri, tão importante quanto a produção de adubo e hortaliça, o Terraço Verde possibilitou que dez toneladas de lixo orgânico deixassem de ser enviado para o aterro sanitário de Salvador. “Acreditamos que essa iniciativa acerta quando também serve de exemplo para outros empreendimentos e para a população em geral que, todas as quintas-feiras, vem visitar esse laboratório que já exportou know-how para outros shoppings do grupo em Fortaleza, Aracaju e Recife”, finaliza Fabiano, que destaca que em Aracaju, a produção não se limita às hortas, mas também produz mudas de plantas nativas do mangue que colaboram para revitalizar a área na capital sergipana.