Chuvas aumentam risco de invasão de casas por cobras em Salvador; jiboias são as mais comuns

Depois de resgatados, os animais são levados para o Centro de Triagem de Animais Silvestres (Cetas), do Ibama

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  • Thais Borges

Publicado em 6 de março de 2017 às 06:50

- Atualizado há um ano

Uma jiboia desce pela grade da varanda da casa. Perto dali, vizinhos seguram outra cobra da mesma espécie e publicam as fotos em redes sociais. A situação no bairro de Macaúbas, em Salvador, despontou nos noticiários pouco antes do Carnaval: cerca de 20 serpentes do tipo foram encontradas pelos moradores em menos de uma semana. 

Mas essa não é uma exclusividade de Macaúbas. Pelo contrário: em toda a cidade, há animais sendo encontrados dentro de casa pelos moradores. Só que é nos próximos meses, com a chegada das chuvas, que isso deve ficar mais intenso – especialmente com cobras. “A maioria entra em casa, então, nesse período de abril e maio, o número de resgate aumenta, porque elas se locomovem melhor na água. Mesmo assim, sempre chega”, diz o coordenador do Centro de Triagem de Animais Silvestres (Cetas) de Salvador, Josiano Torezani. 

É para o Cetas que os animais silvestres – inclusive as jiboias – são levados, após serem resgatados, entregues ou apreendidos, tanto aqui e na Região Metropolitana de Salvador (RMS) quanto em algumas cidades do interior. Só no ano passado, o centro recebeu cerca de cinco mil animais – desses, três mil eram pássaros. Este ano, está abrigando pouco mais de 500 bichos. Só há três Cetas em todo a Bahia: o daqui e um em Porto Seguro, no sul do estado, ambos ligados ao Ibama, e um em Vitória da Conquista, no Centro-Sul, vinculado à prefeitura local. No dia que o CORREIO visitou o Cetas, no fim de fevereiro, uma guarnição da Coppa chegava com uma jiboia(Foto: Evandro Veiga/CORREIO)

“O ‘silvestre’ o próprio nome já diz: vem de selva, selvagem. São animais livres”, explica Torezani. Todos os dias, eles recebem animais. Os destinos são três: apreensão (como é o caso das operações policiais), resgate ou entrega espontânea. No caso do resgate, as jiboias são as mais comuns. Daí, vem também outras serpentes, como sucuri, jararaca, cascavel, coral... 

Com exceção das apreensões – geralmente, realizadas pelas Polícia Rodoviária Federal – que podem trazer até 500 animais, a maior parte dos bichos chega ao Cetas através do Grupamento de Proteção Ambiental (Gepa) da Guarda Municipal e da Companhia de Polícia de Proteção Ambiental (Coppa). As equipes das duas corporações passam por treinamentos com o próprio pessoal do Ibama. 

'Preparados para a chuva'Só no ano passado, segundo o supervisor do Gepa, Robson Pires, a Guarda Municipal resgatou 917 animais. Mas, quando as chuvas vão chegando, eles já sabem que o número deve aumentar. “Logo a chuva, há um aumento significativo no número de resgates. A gente já fica preparado, porque os locais que elas ficam são locais de baixada. Quando o volume de água sobe, a tendência é sair do local, porque a jiboia e a sucuri gostam de locais úmidos”, diz. Ele estima que, desde 2015, o Gepa já resgatou mais de 200 jiboias. “É um animal de fácil proliferação, reproduz muito e tem muito alimento, porque tem muito rato aqui”. No dia que o CORREIO visitou o Cetas, no fim de fevereiro, uma guarnição da Coppa chegava justamente com uma jiboia. Naquele dia, não tinha chovido, mas a cobra apareceu nas proximidades do Hospital Geral Roberto Santos. Um homem a encontrou e começou a manusear o animal em frente à unidade médica, quando a população acionou a polícia. “É um serviço totalmente diferente, mas não deixamos de ser policiais militares. Sempre tive gosto por animais e, quando cheguei na Coppa, fui me adaptando”, contou o soldado Lismar Santos, um dos que veio trazer a cobra. 

Mas não são apenas as cobras que invadem as casas. Só o Gepa já resgatou mais de 50 espécies de animais nos últimos dois anos. Em média, são quatro resgates por dia, mas, nas épocas chuvosas, o número diário passa para seis ou sete. Logo depois das jiboias, vêm as corujas, sariguês e gaviões. A maior parte dos resgates, segundo Pires, é no bairro da Pituba, mas eles ainda não conseguem identificar a razão. 

Entre o final de outubro e novembro do ano passado, o geólogo Jaime Vasconcellos, 77 anos, precisou acionar a Guarda Municipal duas vezes porque encontrou sariguês em sua casa – que, na verdade, é como os gambás são chamados na Bahia. Morador de Boa Vista de Brotas, numa certa feita, se deparou com uma fêmea da espécie presa em um balde dentro de uma casinha de cachorro, em seu quintal. Como a casa dele fica próximo a uma área de mata, ele acredita que a gambá tenha ido ao local para procurar algum tipo de comida, mas acabou caindo dentro do balde. 

Para completar, ela, que é um marsupial (como os cangurus) estava com dois filhotes na bolsa. “Acredito que ela tenha ficado até uma semana lá, presa, até a gente perceber. Nunca tinha aparecido um sariguê em minha casa e o pessoal ficou com medo. É um animal que não agride, mas, se alguém pegar, pode ficar mais selvagem”, diz. 

Pouco depois, já em novembro, ele recebeu a segunda visita. Dessa vez, era um sariguê macho. Esse estava indo em busca das mangas do quintal de Seu Jaime. Ele, então, avisou à Guarda Municipal novamente, que foi resgatá-lo. “Eles eram grandes, relativamente. Tinham mais ou menos uns 30 centímetros. Vi que não era um rato por isso e porque tinha um rabo muito grande”, lembra. “Com esse avanço da construção civil, cada vez mais os animais vão frequentar os ambientes urbanos”, opina. 

Na terça-feira de Carnaval (28), um filhote de iguana foi encontrado por uma turista paraense próximo ao circuito Barra-Ondina. Na verdade, ela avistou o réptil nas mãos de um homem e, para conseguir devolver o bicho à natureza, comprou-o. “Fiquei com pena e adquiri a iguana por R$ 30, após isso busquei orientação e me informaram que podia ligar para a Guarda Civil”, disse, à Guarda Municipal.O filhote de iguana foi encontrado próximo ao circuito da Barra-Ondina, durante o Carnaval(Foto: Divulgação/Guarda Municipal)

Depois, entrou em contato com o Gepa e entregou a iguana. Segundo o supervisor do grupo, Robson Pires, ela explicou que mora na zona rural do Paraná e que lá, costuma cuidar dos animais. “Vender, possuir um animal silvestre é crime”, reforça Pires, que adianta que, ainda neste primeiro semestre, a Guarda Municipal deve começar a atuar na apreensão de animais silvestres no município. 

Mas a verdade é que não há como evitar a entrada dos animais. “É um problema de urbanização, do habitat do animal que está sendo destruído. O animal vai procurar um lugar que tenha água, sombra... E isso é na casa das pessoas”, opina Pires. Importante é não manusear o bicho – seja lá qual for. Até uma coruja pode ferir alguém. 

Para o coordenador do Cetas, Josiano Torezani, os maiores desafios são lidar com o desmatamento e a criação ilegal de animais. “O maior problema é a educação, como em qualquer área. No dia que as pessoas tiverem conhecimento e entenderem que o lugar do animal silvestre é na natureza e que, mesmo que apareça em sua casa, tem que chamar o órgão responsável, a situação vai melhorar”. 

O Gepa e a Coppa trabalham 24 horas por dia. Para entrar em contato com eles, caso algum animal entre em sua casa, basta ligar para 3202-5312 (Gepa) ou (71) 3116-9150 a 9158 (Coppa). Além disso, se alguém quiser fazer uma denúncia de crime ambiental, pode contatar o Inema (0800-71-1400), o Ministério Público da Bahia (71-3103-0390) ou a própria Coppa. [[saiba_mais]]