Coronavírus: apreensivos, baianos fazem máscaras e álcool sumirem das farmácias

Viroses tradicionais de carnaval deixam pessoas confusas e gera desabastecimento de itens de proteção nas farmácias

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  • Da Redação

Publicado em 29 de fevereiro de 2020 às 04:00

- Atualizado há um ano

. Crédito: Foto: Acervo pessoal/Leitor CORREIO

Quando sentiu febre e tosse seca com secreção na noite desta quinta (27), a estudante feirense Ísis Oliveira, 22, ficou preocupada. Ela veio curtir pela primeira vez o carnaval de Salvador e ficou com receio de ter sido contaminada pelo coronavírus, já que na folia há gente de todo canto do mundo. A jovem foi direto para a internet ver se os sintomas correspondiam ao do novo vírus e viu que eram parecidos, mas uma amiga a tranquilizou.“Ela me disse que tinha muita gente resfriada, que isso é comum após o Carnaval e me mostrou que eu não tinha um dos sintomas, que era a febre alta”, contou ela.Em Feira de Santana, onde mora, havia uma notificação de caso suspeito até a manhã desta sexta, segundo dados da Secretaria de Saúde do Estado (Sesab), mas foi descartado laboratorialmente no mesmo dia. Em toda a Bahia, cinco ocorrências estão em análise, sendo quatro em Salvador e uma em Camaçari. No país, há 182 suspeitas e um confirmado em São Paulo.

O CORREIO visitou nesta sexta o Hospital Geral do Estado (HGE) e as Unidades de Pronto Atendimento (UPA) de Brotas e Marback. Nos três, todos os funcionários estavam utilizando máscaras de proteção. Esperando atendimento no Marback, Cléber Silva, 20, nem tinha sintomas de resfriado ou coronavírus mas, com medo de se contaminar na fila, ele resolveu usar uma máscara descartável por prevenção. 

“Não quis correr o risco porque [a UPA] está lotada esses dias”, disse. Foi exatamente nesta unidade que houve uma ocorrência suspeita a partir do caso de uma mulher de 42 anos.

Sem encontrar o item nas farmácias, ele teve a ideia de comprar em loja de cosméticos e achou à venda num estabelecimento no Shopping Gaivotas, perto da UPA. Nesta quinta, o CORREIO consultou dez drogarias de diferentes bairros da cidade e só três delas tinham o produto. O álcool em gel também foi difícil de achar. Preocupado com os casos, o designer Ruy Cauby, 25, tentou comprar álcool em seis farmácias de dois shoppings, mas não achou em nenhuma.“Ando muito de metrô e essa semana uma mulher tossiu do meu lado, então fiquei apreensivo. Essa época é propícia para viroses e a gente fica naquela loucura, confundindo as coisas. O medo fica maior porque, em maio, viajo para Toronto [Canadá] e o vírus está se espalhando”, relatou. No país para onde vai já são 14 casos confirmados.Aguardando na UPA de Brotas, uma mulher adulta também fazia uso de máscara e relatou que seus exames deram positivo para gripe. Profissional da área de saúde, ela trabalha no ramo de otorrinolaringologia e lida diretamente com pacientes com sintomas de dificuldades respiratórias, o que a deixou aflita, já que esse é um dos sinais do coronavírus. 

Para proteger a si e os outros, decidiu usar o item que conseguiu no próprio trabalho. “Eu senti dor de cabeça, o corpo doendo e na mesma hora pensei: pronto, vou ficar doente. Não tive dúvida de que era gripe”, disse. Pacientes e funcionários da UPA de Brotas já têm adotado medidas de prevenção (Foto: Betto Jr./CORREIO) O CORREIO esteve nesta quinta no Hospital São Rafael e teve conhecimento de que dois consultórios estavam em sistema de isolamento. De fato, de acordo com a Secretaria Municipal de Saúde (SMS), um paciente com suspeita de contaminação deu entrada na unidade particular. Outros casos suspeitos vieram dos hospitais Aliança e Português.

O Hospital da Bahia informou ter recebido um casal de jovens que haviam retornado de um país com transmissão local do vírus. Ambos estavam em bom estado geral porém preenchiam critérios de caso suspeito. Após coleta de exames e a notificação dos órgãos responsáveis, os dois foram liberados e orientados a ficar de quarentena até resultado final dos exames ou regressão dos sintomas. O casal tem uma boa evolução e é monitorado pelo CIEVS (Centro de Informações Estratégicas de Vigilância em Saúde) do município de Salvador.

No balcão de atendimento do São Rafael havia colado um cartaz com informação ao público sobre medidas de higiene. Lá, quem passava pela emergência recebia máscaras e também tinha álcool em gel à disposição.

De acordo com a Sesab, os profissionais de saúde das redes pública e privada estão sendo orientados a redobrar a prevenção de possíveis contaminações diante de casos suspeitos. As orientações incluem a lavagem frequente das mãos, uso de álcool em gel e utilização de máscaras cirúrgicas para pessoas que têm sinais e sintomas respiratórios de síndrome gripal.

Além disso, também foi indicado que os profissionais tenham local privativo para atendimento das suspeitas.

A secretaria acrescentou ainda que estão previstas capacitações para que os profissionais conheçam a história de deslocamento dos pacientes e seus contatos e também aulas para que aprendam a notificar a vigilância epidemiológica e seguir as orientações dos protocolos nacionais e internacionais.

Para se preparar para receber possíveis infectados, a Secretaria Municipal de Saúde de Salvador (SMS) publicou uma portaria para ampliar a contratação de leitos de isolamento. O serviço de saúde da capital baiana já possui leitos isolados contratados - um dos hospitais que oferecem o serviço para a cidade é o Santa Izabel.

A assessoria da SMS ressalta que só os pacientes graves são encaminhados para um hospital de referência para tratamento e isolamento. Já para os doentes com quadros clínicos leves é recomendado o isolamento domiciliar.

Hospitais privados Na rede privada, os hospitais da Bahia, Aliança, Aeroporto e Santa Izabel afirmam possuir leitos isolados preparados para receber pacientes com sintomas da doença viral. Em nota, o Hospital Teresa de Lisieux informa ter uma “estrutura hospitalar com total condição de atender pacientes com síndromes gripais de qualquer natureza”.

Procurados, o Hospital Português e Hospital Sagrada Família não responderam até o fechamento desta edição. Em nota, o São Rafael apenas informou não possuir casos suspeitos e seguir os protocolos oficiais das organizações de saúde.

Além de seguirem as indicações da Sesab e possuírem estrutura preparada para receber os pacientes, os centros médicos privados de Salvador trabalham para preparar os profissionais de saúde para tratar os possíveis infectados.

O Aliança iniciou o treinamento com os seus profissionais no começo de fevereiro. Ainda de acordo com nota do hospital, antes do Carnaval, foi criado um fluxograma de atendimento, que foi disponibilizado no prontuário eletrônico. 

Parte do Sistema Hapvida, o Teresa de Lisieux treina a equipe de saúde e atualiza semanalmente os coordenadores e líderes das unidades de urgência e emergência sobre como lidar com o vírus.

Em Lauro de Freitas, o Hospital Aeroporto começou o treinamento de sua equipe para atuar no tratamento e prevenção do vírus em 27 de janeiro. O infectologista Antônio Bandeira foi o responsável pela capacitação do quadro de funcionários.

Antes do Carnaval, o Hospital da Bahia iniciou treinamentos na emergência e nas demais áreas do Hospital. Em nota, a unidade de saúde aponta possuir um protocolo desenhado para receber pacientes suspeitos e/ou confirmados por infecção pelo vírus.

Por meio do Serviço de Controle de Infecção Hospitalar, o Hospital Santa Izabel se preparou para receber casos suspeitos da enfermidade. No centro médico, toda a equipe, incluindo recepcionistas e porteiros, recebem treinamento para auxiliar pacientes com suspeita da doença.

A orientação para quem trabalha com contato com o enfermo é redobrar a prevenção de possíveis contaminações frente a um caso suspeito. Mas os pacientes que dão entrada nas unidades de saúde também devem se atentar para evitar contaminações.

Os hospitais Santa Izabel, Teresa de Lisieux e Aliança informaram possuir cartazes informativos sobre a doença nos seus estabelecimentos, em especial, na emergência.

No Aliança, os enfermos com suspeita da doença devem sinalizar os profissionais da unidade. Em caso de suspeita,o paciente recebe uma máscara cirúrgica, é orientando a higienizar as mãos e conduzido para uma sala reservada com prioridade de atendimento.

A distribuição de máscaras e álcool em gel é uma rotina no Santa Izabel, informa nota da assessoria. O Hospital Aeroporto entrega máscaras cirúrgicas para todos os pacientes com sintomas respiratórios que estejam na recepção do estabelecimento.

No Hospital da Bahia, os pacientes são orientados a adotar as principais medidas de precaução, como: higiene das mãos com maior frequência, etiqueta respiratória e em casos específicos utilização de EPI.

Apesar do esgotamento de máscaras cirúrgicas nas farmácias de Salvador, os Hospitais da Bahia, Aeroporto, Aliança e Teresa de Lisieux declararam possuir estoques destes equipamentos, bem como outros produtos necessários para evitar contágio pelo vírus, como o álcool em gel.

Como é a identificação de caso suspeito

O Ministério da Saúde possui um protocolo para considerar e diferenciar cada caso clínico. Um caso é considerado suspeito quando o paciente apresenta febre com pelo menos um sintoma respiratório como tosse, dificuldade para respirar e batimento das asas nasais e histórico de viagem para área com ocorrência de transmissão nos últimos 14 dias anteriores ao aparecimento dos sinais ou sintomas. Leva-se em conta ainda se a pessoa teve histórico de contato próximo de pessoa com caso suspeito ou confirmado para o novo coronavírus.

Entenda as diferenças e os sintomas de cada uma das doenças:

Coronavírus – febre muito frequente (pode passar dos 38°C), tosse muito frequente; coriza está presente nos primeiros dias, porém não é muito frequente; dor de garganta pouco frequente; dor de cabeça de leve a moderada; presença de dores no corpo; diarreia ocorre raramente; falta de ar a partir do 6º ou 7º dia.

Resfriado comum – febre pouco frequente; tosse pouco frequente; coriza muito frequente e abundante; dor de garganta de leve intensidade; dor de cabeça não é comum; ausência de dores no corpo; diarreia de forma rara; ausência de falta de ar.

H1N1 (gripe) – febre que geralmente vai até 38°C, tosse presente (mas não tanto quanto no coronavírus e nem tão pouco quanto no resfriado); coriza (não tanto quanto no resfriado); dor de garganta frequente e de moderada intensidade; dor de cabeça com pouca intensidade; presença de dores no corpo; possibilidade de diarreia; falta de ar apenas em casos raros. 

SAIBA QUANDO RENOVAR A MÁSCARA E O ÁLCOOL EM GEL

Médica infectologista coordenadora do Serviço de Controle de Infecção do Hospital Aliança, Áurea Paste explica que, no protocolo da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), constam dois tipos de máscaras para prevenção contra a contaminação com o coronavírus: a cirúrgica descartável e a do tipo N-95, mais potente.

A máscara cirúrgica é a popular, com elástico, baratinha e encontrada na maioria das farmácias, e que pode ser usada por qualquer pessoa, inclusive profissionais da saúde atuando em procedimentos comuns de unidades hospitalares. Segundo a doutora, essa proteção pode ser usada por até 4h. “Porém, se ficar úmida, se sujar, deve ser trocada antes”, indica. 

Já a máscara N-95 tem sido indicada para profissionais que estão lidando com pacientes com suspeita de contaminação, junto com outros equipamentos de proteção individual como óculos, avental impermeável e luvas. Essa máscara pode durar até sete dias e deve ser usada quando o profissional precisar realizar procedimentos de nebulização ou entubação de um paciente. Geralmente, essa proteção é indicada para casos de outras doenças como sarampo e varicela, altamente contagiosas.

Quanto ao álcool em gel, a médica explica que qualquer marca tem a mesma eficácia, desde que seja o álcool na proporção 70%. Paste indica que se a pessoa for se alimentar, o melhor é lavar as mãos com água e sabão. Se por acaso sujar as mãos, também é preferível lavar com água e sabão, mas em situações de rua, como estar no carro, ônibus, metrô e ao tocar superfícies, o álcool em gel é um antisséptico aliado.

*Com orientação da chefe de reportagem Perla Ribeiro