Espanhol sugere que Salvador transforme bairro como Barcelona

Região do Comércio tem potencial para virar um distrito de inovação na capital

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  • Da Redação

Publicado em 4 de novembro de 2012 às 13:43

- Atualizado há um ano

. Crédito: Evandro Veiga

Decadente e abandonado pelos poderes públicos, o Comércio (Cidade Baixa) tem uma grande potencialidade para a inovação tecnológica na opinião do engenheiro espanhol Manuel Herce, um dos responsáveis pela reconstrução de Barcelona para os Jogos Olímpicos de 1992. Em sua palestra na última quarta-feira, durante a abertura da terceira edição do Agenda Bahia, Herce disse que o Comércio, área onde estão duas das principais atrações turísticas de Salvador (Mercado Modelo e Elevador Lacerda), guarda muitas semelhanças com o distrito22@, bairro de Barcelona que passou por uma grande transformação nas últimas duas décadas.

“O distrito22@ era um local sujo, sem nenhuma atratividade. Depois de receber muitos investimentos, o bairro ganhou novo aspecto e passou a abrigar empresas voltadas para o desenvolvimento tecnológico, como a Rede Europeia de Biomédica. O Comércio é a mesma coisa. Com obras em infraestrutura e segurança jurídica, dá para atrair empresários para o bairro e toda a cidade será beneficiada”, disse o espanhol.

Além do Comércio, o engenheiro, que é diretor do Programa de Pós-Graduação em Infraestrutura e Meio Ambiente da Universidade Aberta da Catalunha, disse que Salvador necessita colocar em prática outros projetos para melhorar a vida das pessoas.

Convivência

“A cidade precisa recuperar os espaços dos pedestres e de convivência social, investir em uma política integrada de mobilidade sustentável, concluir o metrô, ampliar o calçadão e realizar uma grande intervenção nas praias”, avalia Manuel Herce.

De acordo com o especialista, em apenas uma década, Barcelona construiu ou renovou mais de 100 praças e parques. “Esses locais públicos precisam ser preservados porque são pontos de convergência social. São nas praças e parques que as pessoas se encontram, dialogam, fazem planos e debatem os problemas da cidade”, lembra.

Em um recado direto para os novos prefeitos que vão assumir as 13 cidades que integram a Região Metropolitana de Salvador, Manuel Herce afirmou que a iniciativa privada não pode determinar as obras que serão realizadas nos municípios. “A ajuda (dos empresários) é sempre bem-vinda, mas eles precisam fazer o que as cidades precisam, não o que eles querem”.

Ainda em sua palestra, Herce disse que os futuros prefeitos precisam estimular uma campanha de incentivo à cidadania para resgatar a autoestima da população e realizar convênios com outras esferas administrativas (governos federal e estadual) para executar projetos de interesse das prefeituras.

Viadutos

Crítico da falta de mobilidade urbana em Salvador, o engenheiro afirmou que a construção de estacionamentos e viadutos não resolve o caos que os motoristas enfrentam todos os dias nas principais ruas e avenidas da capital baiana. “É preciso dar mais atenção ao transporte público e oferecer condições para as pessoas caminharem. As calçadas da cidade estão em péssimas condições. Não entendo o motivo, mas aqui, pelo que percebo, os gestores sempre priorizaram os automóveis. É preciso mudar isso enquanto é tempo”, alerta.

Em seguida, citou um exemplo da dificuldade de locomoção do pedestre em Salvador. “Há alguns dias, fui almoçar em um restaurante da Pituba e desisti. Os carros circulavam em uma velocidade impressionante e não consegui atravessar uma simples pista”, conta. 

Uma das obras mais debatidas pelos seis candidatos que disputaram a prefeitura de Salvador este ano, o metrô também foi citado pelo engenheiro em sua palestra. “Houve falhas na execução do projeto, mas agora não adiante lamentar. O metrô precisa sair do papel e chegar até Cajazeiras e Mussurunga, bairros que têm comércio pulsante e grandes potencialidades”.

Um dos últimos temas da palestra de Herce foi o abandono das praias de Salvador. “Vocês têm um litoral lindo e, ao mesmo tempo, abandonado. Uma cidade com uma grande vocação turística como Salvador não pode oferecer aos seus visitantes uma orla degradada, sem opções de lazer, esporte e gastronomia. É preciso mudar esta triste realidade com obras e muita vontade política”. Pedestres e ciclovias

Acostumado a andar muito em Salvador, o engenheiro espanhol Manuel Herce apontou cinco áreas que ele considera ideais para facilitar a locomoção de pedestres na cidade. “Se vocês observarem bem, entre a região do Iguatemi e praia do Rio Vermelho dá para se fazer uma grande área pública, com calçadões mais largos e ciclovias, tudo integrado com a exuberância da natureza. No Itaigara, por exemplo, existe o Parque da Cidade, que é muito mal aproveitado”, sugere.

Segundo o especialista, com um projeto de urbanização envolvendo todo o seu entorno, certamente as pessoas vão transformá-lo em uma referência para o lazer e a prática de esportes, como acontece com as ramblas em Barcelona.

Herce disse também que o mercado de Cajazeiras deveria passar por uma reforma para proporcionar mais mobilidade às pessoas. Ali, também seria construída uma grande área pública, fechada para carros.

“Nas grandes cidades do mundo as pessoas utilizam transporte público e caminham. Cajazeiras tem uma população muito grande e quase nenhum espaço de lazer. Isso, é claro, não está correto. O modelo de Salvador, que privilegia os veículos particulares, está superado há muito tempo”, acrescentou.

De acordo com o espanhol, o trecho que vai da Arena Fonte Nova ao Elevador Lacerda, passando pelo centro de Salvador, também oferece condições para as caminhadas. “Basta ter vontade política para começar. Depois, as pessoas vão perceber que tudo está funcionando bem, que suas vidas melhoraram e, certamente, vão pedir mais obras. Mas, para isso, é preciso ter coragem, dar o primeiro passo e executar o projeto”, lembra. A outra área apontada por Herce é a Avenida Afrânio Peixoto.

*Especial para o CORREIO