Eu disse que o piso tava solto e o moço ficou zangado

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  • Flavia Azevedo

Publicado em 5 de maio de 2018 às 13:53

- Atualizado há um ano

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Zé me falou que, uma vez colocada a cerâmica, eu devia vir com o cabo de uma vassoura, na vertical, e dar algumas pancadinhas no chão. Se escutasse um som "ôco", podia mandar tirar e fazer de novo. Mesma coisa disse minha amiga Ana que é arquiteta. Pois bem. Eu fui fazer o teste no piso da minha casa. 

Plena manhã, obra a mil. Eu, meu cabo de vassoura e o veredicto: "ô, amigo, tem umas pedras soltas aqui". Pronto. Se você quer saber o que é ser tratada como uma imbecil, aponte um erro numa obra. E mantenha a sua posição, se quiser ser "desagradável". 

A conversa longa (e eu juro que fui educada) terminou no "a senhora fale com o chefe". O rapaz indignado. E o dia acabou com o "chefe" dizendo que ia refazer, mas questionando meu método "do cabo de vassoura" que ele pode nunca ter visto, mas funcionou muito bem e o que importa é o resultado. Um erro fácil de consertar. E ninguém estava sendo execrado. Mas por que o problema, afinal? 

Já vi muito homem falando merda na construção civil e as ginásticas mentais que eles fazem. O interlocutor finge que entende e dá um jeito de concordar mesmo que seja pra discordar em seguida. Como são condescendentes, esses rapazes! Entre eles, claro. Porque se for uma mulher, basta dizer "a prateleira tá torta" pra ter que ouvir gracinha ou provar em que universidade aprendeu a usar furadeira e esquadro.

Eu não sei para as moças que têm doutorado na área, mas sem títulos e diplomas, fica difícil o diálogo. É pura viagem de ego. Vira disputa de conhecimento, prova de título, descortesia, uma coisa ridícula pra qualquer um que preste atenção. 

Uma "reserva de mercado", um "esse negócio aqui é pra macho" que se aplica à mecânica, construção e outras áreas onde parece ser necessário ter um pênis legitimando qualquer opinião que se queira dar. 

(Em futebol, então... haja saco!)

Nem faço questão, confesso. Não teoricamente, não em papos de mesa de bar. Mas sim, sei o básico necessário. E o que eu não sei, pesquiso de acordo com a demanda de cada ocasião. Felizmente, sou alfabetizada e as informações estão aí pra quem quiser acessar.

O "reino" dos "assuntos de machos" também foi derrubado, informo. Primeiro porque tem mulher estudando, trabalhando e dando palestra do diabo a quatro. Segundo, que mulher também constrói casa e tem carro. E cuidamos das nossas obras e de revisões de automóveis. E temos opiniões porque nos apropriamos do nosso cotidiano, cada vez mais.

(Mulher pode citar Zagallo?)

Da mesma maneira que já deviam ter se apropriado, os rapazes. Dos "temas femininos" nos quais não queremos, faz tempo, exclusividade. Dos seus próprios lares, dos seus filhos, das cozinhas que ainda sobram, na maioria das vezes, para as mulheres, nas dinâmicas familiares. 

Existem conhecimentos básicos que todos precisam ter ou estamos terceirizando, normalmente sem pagar nada. Faz tempo que não conheço mulher do tipo "não sei nem trocar uma lâmpada", mas ainda é bem comum o "não sei nem fritar um ovo", na boca de "macho alfa". E é isso que nos incomoda, não o movimento contrário.

(Eu nunca vi mulher dizer "só pode dar opinião sobre comida se tiver uma vulva ou recitar a história da feijoada". Mas devia. Só pra mostrar como é chato)