Marcos Piangers: ‘Pai de selfie é aquele que pega o filho, tira a foto e devolve para mãe’

Autor do livro 'O Papai é Pop' fala sobre a importância da paternidade e a estreia da adaptação para as telonas, que terá Lázaro Ramos no papel do próprio Marcos

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  • Da Redação

Publicado em 7 de agosto de 2022 às 11:00

- Atualizado há um ano

. Crédito: Giselle Sauer / divulgação

O que é ser um bom pai no país das mães solo? Este é um questionamento que Marcos Piangers leva nas suas palestras, livro e agora filme ‘Papai é Pop’, que estreia no próximo dia 11 de agosto e terá Lázaro Ramos como protagonista da trama. O autor baiano faz o papel  justamente de Piangers, que conta como foi sua transformação paterna no livro de mesmo nome com mais de 500 mil cópias vendidas. A uma semana do dia dos pais, conversamos com o autor que tenta mostrar a importância da vida paterna na família e na vida da criança. Quer melhorar sua postura com seus filhos? Este papo é para você e seus filhos.

Venha, pai!

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Seu livro mostra uma forma leve de abordar algo sério, que é a paternidade. O filme com Lázaro Ramos também segue esta linha?

Tudo que eu fiz, desde quando lancei o livro [há sete anos], é justamente celebrar esta paternidade. Uma paternidade mais atenta, mais participativa e mais amorosa. Uma paternidade apaixonante, que entende que, para um casal funcionar, precisa ser 100% pai e 100% mãe. A criança cresce mais completa com um pai participativo. Um pai presente muda tudo, muda a vida da mãe, muda a criança, a dele mesmo e de toda sociedade. No filme a gente começa com este bom humor, mas termina com a reflexão sobre a importância da paternidade.

Como foi sua transformação de um pai atrapalhado retratado no filme para uma figura paterna que se tornou referência de um bom pai?

Bom, eu até concordo que virei referência de um bom pai, mas não me considero um pai perfeito. É importante fazer esta distinção. Quando a pessoa vê no cartaz o ‘papai pop’, pensa logo que vamos falar do pai perfeito. O filme do Papai é Pop não é sobre o pai perfeito. É sobre  os filhos e como precisamos de dedicação para conhecer esta criança. Um bom pai é um pai responsivo. Não existe um pai perfeito para todas as crianças. Existe um pai perfeito para cada uma das crianças. A gente tem que conhecer e prestar atenção em cada uma delas para poder ser um bom pai. 

É preciso que o pai entre com mais intensidade no universo da gravidez, desde a transformação da mulher, nascimento e período puerpério? Não dá para ficar jogando videogame enquanto a mãe vê a transformação do seu corpo, né?

Eu tenho um olhar empático para alguns homens que não participam. Muitas vezes, equivocadamente acham que já fazem o suficiente, mas só depois percebem que poderiam ter feito muito mais. Eu entendo até meu pai biológico que abandonou minha mãe grávida. Não estou dizendo que está certo. O abandono causa traumas que tornam a sociedade pior, destrói famílias, a mulher, mas eu sei que ele também é um traumatizado, também pode ter tido um pai grosso, agressivo e violento. É importante olhar para este cara e dizer: meu irmão, sei que é difícil, sei que você queria jogar videogame e fugir da bebê que só chora, come e suja a fralda. Mas você consegue, você não precisa ser o seu passado.

Lázaro Ramos faz você no filme. Como foi esta troca de experiências paternas com o autor baiano?Primeiro: o Lázaro é maravilhoso. Ele é talentoso, um pai apaixonado, ele leva humor e leveza para o personagem. No filme, quando ele erra como pai, você não torce contra Lázaro, torce a favor, isso era muito importante pra gente. Acho que Lázaro pode levar mais adiante a mensagem,  mostrar para mais homens que eles podem ser participativos, que as famílias são mais felizes quando dividimos as funções e estamos conectados com nossos filhos. Tenho muita esperança que este filme vá, de fato, fortalecer laços familiares e inspirar o melhor pai dentro de vários homens.  Num país em que temos 11 milhões de “mães solos”, o que é ser um ‘papai pop’ ideal?

Primeiro lugar, não fugir. Ele tem muito incentivo pra fugir. Licença paternidade pequena, muitos amigos chamando pra tomar cerveja, muito chefe dizendo que precisa trabalhar mais, ao invés de cuidar de nossos filhos. Quando você decide encarar, começa a levar com mais leveza e responsabilidade. Recombinar com sua esposa a criação conjunta, renovar este amor pelo filho e família. Como disse, o Papai Pop não é o pai perfeito, é o pai que tenta acertar. Mesmo atrapalhadamente, ele dá o melhor. Pai não é querer ser melhor que os outros. É preciso pensar em ser melhor que ontem. 

Seu Best Seller ‘Papai é Pop’ vai para a telona mostrando um lado dramático (com doses de humor) da paternidade, mas também acende a importância de se abordar a ausência da figura paterna na criação dos filhos. Será um gatilho para a discussão do papel do pai na sociedade brasileira?

Eu espero que sim. Quando eu lancei o livro, em 2015, falava-se pouco de paternidade. Estamos agora discutindo mais o tema, não é mais constrangedor dizer que ama o filho, de pintar a unha com a filha. O filme vai despertar  várias discussões bonitas sobre a família e a participação efetiva do pai.  

Você faz questão de dizer que é filho de uma 'super-heroína', ou mãe solo, o que são sinônimos no Brasil. Como a história de sua figura materna te inspirou no livro? 

Minha mãe é tudo para mim. Minha mãe me ensinou que eu não precisava ser o meu pai biológico quando chegasse a minha vez de ser pai.  Ela me ensinou que, para devolver o amor que ela me deu, não é dando presentes caros para ela, mas multiplicando este amor e passando para o próximo. Minha mãe é meu norte. Infelizmente ela está doente, está com um câncer, bem fraquinha. O filme é uma homenagem a ela também. Colocar Elisa Lucinda  fazendo o papel de minha mãe  é um jeito de homenagear todas as mães solos no Brasil. Lázaro me disse algo maravilhoso: ‘você achava que seu maior drama era ter sido abandonado pelo pai, mas a sua maior sorte foi ter uma mãe como a sua’. 

Para ser um bom pai, primeiramente é preciso ter consciência do que é ser mãe no Brasil? Se colocar no lugar da figura materna é um bom caminho? Impossível falar de paternidade sem falar de maternidade. São complementares. A mãe pode ‘paternar’, assim como o pai também deve ‘maternar’. Ser um pai que se conecta com o beijo, o carinho, fazer o papel da mãe. Ou seja: podemos ‘maternar ou paternar’, seja homem ou mulher. Somos filhos de pais anteriores aos anos 90, que carregavam a figura machista na educação. Também é preciso acabar com esta herança estrutural para reinventar a verdadeira figura do pai, principalmente na criação de um filho com mais consciência moral e sem preconceitos?

É muito importante. Pesquisas mostram que apenas 10% dos homens conversam com os próprios pais sobre o que é ser um homem. A gente encontra este homem imaturo, infantilizado no pior sentido possível. Este homem que fica apenas no videogame, que mora com o pais até os 45 anos, não aceita desafios, tampouco problema. Precisa ser amadurecido. Mas também tivemos grandes heróis no passado que pavimentaram nossa paternidade de hoje, que foram benéficos também. Nosso papel é melhorar e passar adiante ou fazer diferente, caso não tenha tido o amor de um pai. É hora do homem ter noção das suas virtudes, homens com mais sensibilidade.  

Atualmente surgiu a figura do ‘pai do Instagram'. Nas publicações, parece ser a melhor referência paterna, mas não passa de mais um ausente...

No filme chamamos de ‘pai de selfie’ [risos]. É o pai que pega o filho, tira a foto, publica e devolve para mãe. É o pai separado que só pega os filhos no final de semana. Este é o ‘pai de selfie’, que realmente não participa, não bota a mão na massa, não conhece o nome da professora do filho, da pediatra, não sabe o melhor amigo do filho, vontades... Pai, para ser pai, precisa conhecer o filho. É impossível ser um pai só com um manual. É impossível ser um pai que só diz sim, que só diz não, que é autoritário ou muito permissivo. Estes pais estão  preocupados em não ter trabalho. Está longe de ser um pai ideal. 

Como um pai ausente pode se redimir de suas ações? Há  tempo de corrigir ações do passado?

Sempre há tempo para corrigir. Não importa se seu filho já tenha 50 anos. Hoje é o dia de corrigir. Hoje é o dia de ligar para ele. Hoje é o dia de dizer ‘vou ser melhor’. Ser mais presente, mais atento, paciente e amoroso. Recomeçar a relação com o filho e ser participativo. Tem que dar o primeiro passo. 

Seu livro e palestras certamente inspiraram muitos pais. Tem alguns casos interessantes que você guarda com carinho?

Guardo todos. Guardo com carinho um pai que leu um texto meu chamado  A Vida é Longa. Ele disse que estava pensando em se matar, mas desistiu após ler o texto. Ele reavaliou e pensou que não poderia deixar o seu filho de cinco anos sozinho no mundo. Um  senhor de 80 anos estava em minha palestra e pediu o microfone. Ele disse: ‘ouçam o que este jovem está falando, pois eu não aproveitei meus filhos. Eu não vi meus filhos crescerem e me arrependo disso. Outro pai, um caminhoneiro, me disse que estava há 30 dias na estrada sem ver o filho, até que viu um vídeo meu no Youtube. Aquela foi sua última viagem entregando cargas. Mudou de emprego para ficar mais com a família. É a coisa mais linda do mundo ouvir isso. 

Dias dos pais chegando, filme estreando, mas finalizamos com uma pergunta: é dia de se comemorar ou de muita reflexão?

Os dois, né?  Vamos comemorar o pai que fomos nos  364 dias do ano que passou, mas fazendo uma reflexão de como podemos ser ainda melhores nos próximos 364. 

Sobre o entrevistado

Marcos Piangers nasceu em Florianópolis, Santa Catarina, em 1980. Abandonado pelo pai, foi criado por mãe solo, o que foi uma de suas inspirações na busca pela melhor paternidade para as duas filhas, Anita e da Aurora, o que resultou no best-seller ‘O Papai é Pop’, com mais de 500 mil cópias vendidas no Brasil, Portugal e Espanha. O livro se tornou filme que estreia dia 11 de agosto, com Lázaro Ramos fazendo o papel do próprio Piangers, além de um grande elenco, como Paolla Oliveira e Elisa Lucinda. Com mais de 1,3 milhão de seguidores no Instagram, também é palestrante e sempre enfatiza a importância da figura paterna na criação dos filhos. Seus vídeos sobre paternidade alcançaram 500 milhões de visualizações no Youtube.