'Nadei por quatro horas', diz condutor de lancha sequestrado por bandidos

Marinheiro foi contratado pelos criminosos em Salvador; viagem era para Ilha de Itaparica

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  • Milena Hildete

Publicado em 30 de abril de 2018 às 14:29

- Atualizado há um ano

. Crédito: Marinheiro (de bermuda) nadou por quatro horas - Foto: Milena Teixeira/CORREIO

A lancha Júlia II, apreendida com explosivos por policiais, no bairro da Ribeira, em Salvador, foi roubada do condutor da embarcação, de acordo com informações da vítima, que preferiu não se identificar. Dois homens abordaram o marinheiro na Praça Visconde de Cairu, no Comércio, e alugaram o barco para fazer uma viagem até a praia da Ponta de Areia, na Ilha de Itaparica, na tarde do último domingo (29). 

O roubo da lancha e o sequestro do marinheiro ocorreram na segunda viagem, quando ele foi buscar os suspeitos na Ilha. Ao chegar no local, por volta das 19h, o marinheiro foi abordado por mais quatro homens armados e com fardas da Polícia Civil. "No desembarque veio mais gente. Eles já foram me rendendo e eu só ouvi eles falarem: 'saia do comando'. Nem quis olhar pra mais nada", contou o marinheiro.

De acordo com ele, após o anúncio do sequestro, os momentos foram de terror [veja relato completo abaixo]. Por volta das 21h de domingo (29), os suspeitos jogaram o marinheiro na água. A vítima diz que precisou nadar por mais de quatro horas até avistar a praia do Canta Galo, já na capital baiana.

"Eles me jogaram sem colete, sem nada. Eu nadei por quase cinco horas. Era muito onda alta. A única que coisa boa é que eu sei nadar, mas graças a Deus estou vivo. Agora, a luta continua", afirmou. Por cada viagem, o marinheiro iria ganhar R$ 1,5 mil. Segundo ele, a embarcação pertence a seu patrão - o marinheiro não quis informar o nome do proprietário para o CORREIO.

Ao chegar nadando em Salvador, o marinheiro diz ter procurado a polícia local. Na manhã desta segunda (30), ele esteve no local onde a embarcação foi periciada, na Ribeira, acompanhado por policiais civis. E, na sequência, a vítima foi até a Unidade de Pronto Atendimento (UPA), na Avenida San Martin. Lá, o condutor foi medicado e seguiu para prestar depoimento. Na tarde desta segunda, ele deve ser ouvido pela Polícia Federal. Lancha tinha explosivos que seriam usados em ataques à bancos Foto: Milena Teixeira/CORREIO A lancha foi encontrada, à deriva, pela Polícia Federal sem nenhum ocupante, e foi rebocada até a praia, quando se constatou a presença de 71,5 quilos de explosivos, além de ferramentas, balaclavas e luvas. Na lancha, a polícia encontrou ainda uma mochila com uma marreta, uma picareta e, além disso, dois coletes da Polícia Civil. 

Antes da lancha ser encontrada na praia, moradores relataram que houve troca de tiros no mar. 

"Peritos do Grupo de Bombas e Explosivos da PF estiveram no local e removeram o material. Acredita-se que o grupo planejava um ataque a caixas eletrônicos. Os dois presos foram encaminhados à Superintendência da Polícia Federal em Salvador, para adoção das medidas de polícia judiciária cabíveis, e os demais continuam sendo procurados", destacou a PF.  Explosivos apreendidos na lancha (Foto: Divulgação/Polícia Federal) Procurada, a PF informou que não haveria fontes para detalhar a operação.  

Perícia Uma equipe da Polícia Federal realizou perícia na embarcação, que ficou na praia na Ribeira, durante toda a manhã desta segunda. A lancha Julia II também sofreu avarias no casco - na frente e no lado. A embarcação, segundo os policiais, chocou-se em pedras. Moradores da Ribeira acompanharam a perícia ao longo da manhã.

Relato do marinheiro: Eu fui contratado por dois caras de tarde na Praça Cairu. Eles pareciam clientes normais quando acertaram a viagem até a Ilha. Na segunda viagem, por volta das 19h, eles me renderam e me fizeram de refém. Na segunda vez, tinha mais quatro homens lá . Todos estavam armados, mas eu não vi muita coisa, porque fiquei apavorado.

***

Eles me pediram pra sair do comando e me guiaram no sentido Salvador. No mar, eu contei que eu era pai de família e que precisava criar meu filho, de dois meses, mas mesmo assim me jogaram no meio da água, sem colete. O que salvou é que eu trabalho há muito tempo nessa aréa e, por isso, consegui nadar por quase quatro horas. Quando eu cheguei perto do Canta Galo procurei a polícia. Foi Jesus que me salvou, foi meu filho, de dois meses, que me motivou a nadar por mais de quatro horas.

***O mar estava ruim e as ondas estavam grandes. Também estava frio. Passou tanta coisa na minha cabeça, inclusive, que não ia ver mais minha família. Agora, eu estou com dor na minha espinha e não sinto minha perna direito. Mas graças a Deus estou vivo. Tem coisa na vida que você acha que não vai passar, mas passa. 

 ***Eu sei que vai ter gente pra me criticar, mas eu sou um pai de família, que precisa sustentar a casa. Pra ganhar dinheiro a gente passa por cada uma. Meu coração precisa da minha família agora.

*Com supervisão do chefe de reportagem Jorge Gauthier