No ‘Carnaval das lives’, foliões festejam em casa: ‘Deu para sentir um gostinho’

Apresentações de Bell, Ivete, Claudinha, dentre outros, animaram baianos neste fim de semana

  • Foto do(a) author(a) Gabriel Moura
  • Gabriel Moura

Publicado em 14 de fevereiro de 2021 às 21:42

- Atualizado há um ano

. Crédito: Foto: Fábio Cunha / Divulgação

Durante séculos o Forte São Marcelo e seus canhões foram uma das principais defesas de Salvador. Só que contra um inimigo invisível a artilharia é ineficiente. Mas nem por isso a construção deixou de trazer alívio e felicidade aos soteropolitanos ao sediar, neste domingo (14), a live de Carnaval do cantor Bell Marques.

Durante as seis horas de apresentação, o público pôde acompanhar e cantar de casa os grandes sucessos da carreira do artista baiano, sobretudo de quando fez parte do Chiclete com Banana. Bell, que chegou a chorar recentemente por causa da não-realização do Carnaval, não deixou a tristeza transparecer e mostrou disposição e alegria durante todo o show.

Enquanto isso, longe do ‘forte elétrico’, um pequeno Camaleão se formava. Cerca de 10 fãs do cantor decidiram criar seu próprio Carnaval e, uniformizados com o abadá do bloco, se juntaram em uma casa em Vilas do Atlântico, Lauro de Freitas, para acompanhar juntos a transmissão.

Entre eles estava o advogado Edmundo Viana, conhecido como ‘Pinguim’, de 36 anos. Fã de Bell, ele acompanhou todos os carnavais do cantor desde que ele tinha 13, saindo em todos os dias de festa atrás da bandana mais famosa do mundo. 2021 vai ser o primeiro ano de Pinguim sem acompanhar o ídolo em fevereiro.

“Desde que começou a semana de Carnaval veio uma tristeza, que atingiu o auge na sexta, geralmente o primeiro dia de Bell em cima do trio. Mas não tem o que fazer, não há solução ao nosso alcance. O jeito é se conformar e torcer para que ano que vem tudo volte ao normal. Não quero nem pensar em mais um fevereiro deste jeito”, desabafa.

Reunir os amigos de bloco e assistir a live ajudou a diminuir a sofrência, mas não é o suficiente. “Não consigo ficar plenamente feliz. Vendo o show não tem como não imaginar como seria se a gente estivesse atrás do trio correndo, pulando, cantando, curtindo e se abraçando”, lamenta o advogado. 'Camaleãozinho' foi formado em Vilas (Foto: Acervo Pessoal) Não só os fãs de Bell puderam matar um pouco da saudade. Barões da Pisadinha, Preta Gil e Alinne Rosa também comandaram  lives neste domingo. Segunda (15), às 17 horas, vai ser a vez do Psirico. Já o sábado (13) foi marcado por Harmonia, Léo Santana e Parangolé, Maria Bethânia, Sarajane e uma apresentação conjunta de Ivete Sangalo e Claudia Leitte.

No show, que foi chamado pelas artistas como a integração entre os blocos Coruja e Largadinho, as duas fizeram várias menções à festa na rua, enfatizando a saudade que têm de arrastar os foliões com os trios elétricos. “Bora, Barra/Ondina. Que falta eu sinto do nosso carnaval”, disse Ivete. Já Claudinha, lembrou várias vezes de detalhes da festa que não pôde acontecer este ano. “Nessa hora, na avenida, o povo se organiza, espera e começa a pular sem parar dentro do bloco”, falou enquanto cantava.

Pelas redes sociais, os fãs se declararam pelas duas e enalteceram a apresentação. “Meus vizinhos que lutem! A TV está no último! Ivete e Claudia estão servindo muito com essa live”, disse uma fã. Outros ficaram tão emocionados com a live que afirmaram estar sentindo o clima da avenida. “Tô me sentindo no próprio carnaval!  Ivete e Claudinha são as melhores e só minha opinião importa!”, tuitou outra. 

Carnaval sim, senhor O que faz o Carnaval ser o Carnaval? O trio, os blocos e atrações ou os tênis surrados, amores conquistados e dignidades perdidas? Se a festa, então, é feita das histórias, que 2021, o ano em que todos ficaram em casa enquanto o ‘Bloco dos Mascarados’ monopolizou as ruas, seja apenas lembrada como mais uma delas.

Foi esta a mentalidade dos foliões que, cansados de chorar no pé do caboclo, resolveram abraçar o que tinham e curtiram como puderam o Carnaval ‘dendicasa’. “Por mais que eu estivesse desanimada, ao ver a bateria de lives que iam ter me animou. Afinal, Carnaval é a gente que faz, é um estado de espírito. A rua é muito importante, mas não é só ela que importa. O sentimento e a curtição não são o mesmo, mas deu para sentir um gostinho”, diz a jornalista Lara Ferreira, 24, 

E esse gostinho pode acabar, futuramente, tornando-se cada vez mais prato principal. Ao menos é o que vislumbra o historiador e pesquisador de Carnaval Milton Moura. Ele acredita que o efeito já visto nas festas de Iemanjá e São João, onde parte do público prefere celebrar em casa ao invés da rua, pode se repetir na folia.

“Não que a rua vá perder importância. Até porque o Carnaval é a aglomeração prolongada de um número imenso de pessoas. Mas os artistas encontraram, através das lives, uma nova forma de se comunicar com seu público, e isso agradou algumas pessoas. Isso vai estimular reuniões com ‘pequenas multidões’”, analisa o especialista.

O impacto desta mudança vai depender, na opinião de Milton, da midiatização que esta nova forma de curtir a folia vai ter. “Um exemplo é o Carnaval do Rio de Janeiro e São Paulo, onde boa parte dos apreciadores jamais pisou no sambódromo. Os camarotes são algo parecido aqui em Salvador, mas eles ainda estão, de alguma forma, dentro dos circuitos”, pondera.

O Correio Folia é uma realização do jornal Correio com o apoio da Bohemia Puro Malte e da Drogaria São Paulo. A transmissão é da ITS Brasil e E_Studio.