O gênio da MPB fez um concerto inesquecível no Teatro Castro Alves

Confira a crítica de Hagamenon Brito sobre o show de João Gilberto em Salvador

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  • Da Redação

Publicado em 7 de setembro de 2008 às 16:00

- Atualizado há um ano

Teatro Castro Alves, sexta-feira, 21h45: 45 minutos após o horário marcado para o início do primeiro concerto de João Gilberto, 77, em Salvador, após dez anos, parte do público já mostra sinais de impaciência. Do meu lado, dois casais de amigos repetem verdades (habituais atrasos) e lendas (o gato do cantor teria se atirado do apartamento, no Rio, por não suportar mais ouvi-lo tocar O pato o dia inteiro) sobre o artista genial que revolucionou a MPB há 50 anos. Nesse momento, o filho mais nobre de Juazeiro já deixou o Hotel Pestana, no Rio Vermelho, rumo ao teatro.

Às 22h10, ele entra no palco acompanhado pelo inseparável violão, é recebido de pé pela platéia e interpreta os primeiros versos de Saudade da Bahia, para depois seguir com Você já foi à Bahia? ,ambas de Caymmi. A morte de seu Dorival, dia 16 de agosto, aumentou ainda mais o carinho e o respeito de João pelo mestre maior da canção brasileira. Assim como no show no Theatro Municipal do Rio, no último dia 24, Caymmi será lembrado outras vezes no set list de 33 canções em duas horas e 17 minutos de apresentação. Nessa histórica turnê patrocinada pelo Itaúbrasil, João parece sentir, melhor do que ninguém, o que Tom Jobim escreveu em Querida:' Longa é a arte, tão breve é a vida'. Continua implicando com o ar condicionado ('Esse ventinho na minha cabeça'), que foi desligado depois da segunda reclamação, e não gostando de tosse na platéia ('Errei alguns versos por causa de uma tosse. Tem um xarope?'), entre outros inconvenientes que atrapalham a sua concentração.

Mas, sem dúvida, nunca vimos um João Gilberto tão complacente com a platéia e, na medida do possível, mais tranqüilo com sua obsessão pela perfeição. O TCA parecia a sala de estar do seu apartamento: declara que viaja por todo o mundo, mas que tocar na Bahia é diferente ('Chego a ficar nervoso'); dedica músicas a amigos como Maria Eugênia ('Ela é psiquiatra. Vou até procurá-la para dar um jeito no meu cabeção'); atende a pedidos do público; e conta várias histórias em tom baixo, quase inaudível às vezes (ainda mais coma mesa de som demorando a encontrar o volume ideal).

'Estou metido a contar histórias, agora', brinca ao lembrar que o compositor paulista Denis Brean, que ele conheceu na extinta TV Excélsior (anos 60), fez a linda Bahia com H sem nunca ter vindo ao estado. Revela que aprendeu a gostar de Morena boca de ouro (AryBarroso) por causa do seu primo, o cardiologista Yulo César. Na juventude, o médico costumava cantar o clássico de Ary Barroso debaixo do chuveiro. Interpreta e traduz os versos italianos da belíssima Estate (Bruno Martino e Bruno Brighetti), gravada em Amoroso (1977).

É difícil imaginar alguém insatisfeito no teatro à 0h27, quando João Gilberto deixa o palco após o bis. Além da importância do artista na história da MPB, com reflexos no jazz americano, vê-lo em um show é um exercício de educação musical que desafia o tempo. Principalmente hoje em dia, quando música é (quase) sinônimo de barulho, quando silêncio é confundido com solidão. João é outra coisa, é uma trompa na orquestra nossa de cada dia.

Cantor fica uma semana na Bahia com a filhinha Luiza

Quem estava nas primeiras filas da platéia do Teatro Castro Alves deve ter estranhado a presença de uma garotinha em umshow de João Gilberto. Era Luiza Carolina Faissol Gilberto de Oliveira, 4 anos, filha do artista com a socialite carioca Claudia Faissol, 36. Ela era casada com o empresário Eduardo Zaide quando a criança nasceu. No início de 2007, porém, o resultado de um exame de DNA confirmou que a menina é filha legítima de João. Os encontros entre Claudia e o músico aconteceram sobretudo no Japão, em turnês.

Atualmente, Claudia (filha de Olympio Faissol, o dentista das celebridades do Rio) é quem administra a carreira de João, tendo demitido Carmela Forsin, que empresariava o artista há duas décadas.

O cantor chegou à capital baiana na madrugada de sexta- feira, à 1h da manhã, de jatinho alugado (o meio de transporte usado por ele nesta turnê nacional, com cachê de R$2 milhões por quatro concertos: dois em São Paulo, um no Rio e um na Bahia). João deve ficar uma semana em Salvador, no Hotel Pestana, acompanhado pela filha.

A turnê em comemoração aos 50 anos da Bossa Nova será encerrada no Japão, em novembro, com concertos em Tóquio (dias 1º e 2) e em Yokohama (3). Todos os shows estão sendo filmados por Claudia Faissol, mas os direitos de imagem pertencem ao Itaú.

(Matéria publicada na edição impressa do CORREIO em 07/08/2009)

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