Opinião: A cidade que cada um destrói

O espaço urbano nada mais é do que o reflexo de seu próprio povo

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  • Da Redação

Publicado em 13 de janeiro de 2012 às 10:24

- Atualizado há um ano

Salvatore Carrozzo

Salvador está um caos, suja e violenta como há muito tempo não víamos. As acusações, na maioria das vezes, caem no prefeito. Não estou aqui para acusar nem defender ninguém, até porque certas situações beiram o indefensável. Gostaria, sim, de pedir dois altos. Esqueçam as ruas esburacadas, o aumento dos usuários de crack e o esgoto que engole vergonhosamente a praia da Barra.

Vamos falar de gentileza. Isso tem muita relação com o estado de abandono de Salvador. O espaço urbano nada mais é do que o reflexo de seu próprio povo. Você tem todo direito de discordar de mim, mas acho que não estamos tratando muito bem o próximo, muito menos a cidade.

Farinha pouca, meu pirão primeiro, diz a máxima. Não é bem assim que a coisa anda. Quem fuma, por exemplo, poderia muito bem prestar atenção ao redor. Se o vento estiver levando a fumaça bem pra cima de quem está ao lado, não é tão terrível se afastar uns metros e não incomodar ninguém. Ouvir uma música legal numa praia é uma das coisas mais bacanas que existem. Mas com fone de ouvido, claro. Não banque o DJ da praia – e do ônibus, do elevador, do barzinho... Isso vale para qualquer ritmo. Se cada um fosse ouvir o que bem entende, a situação seria insuportável.

Conviver em sociedade significa abrir mão de certas coisas. Afinal, o planeta Terra é um só, não teremos para onde nos mudar quando todos estivermos incomodados. Bom dia, boa tarde, boa noite. Tudo isso custa um pouco de saliva, mas os resultados são ótimos. Para entrar no ônibus pós-praia é legal tirar toda a areia e se enxugar bem. Afinal, alguém vai sentar no lugar antes ocupado por você.

Outra coisa que não é nenhum grande sacrifício é recolher o lixo produzido na praia. Aliás, custa algo, sim: perder a ideia pré-estabelecida segundo a qual, se pagamos impostos, temos direito à limpeza urbana que cate tudo aquilo que deixamos para trás. Isso pode parecer pequeno frente ao metrô que não anda porque ainda não nasceu de uma gestação de 13 anos. Mas não é nem um pouco irrelevante.

Quando aprendemos a enxergar o outro, automaticamente abrimos os olhos para a cidade. E para nós mesmos. Gentileza não é só distribuir sorrisos. É sorrir para Salvador e transformar a cidade naquilo que queremos.

Texto publicado no Guia Correio na edição impressa