Pedagoga ganha quase R$ 11 mil com aulas de reforço e abre seu próprio colégio

Escola de resiliência: na nova estrutura, localizada na Pituba, são ofertadas turmas de Educação Infantil ao Fundamental I

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  • Priscila Natividade

Publicado em 11 de dezembro de 2021 às 16:00

- Atualizado há um ano

. Crédito: Foto: Arisson Marinho/ CORREIO

Como nasce uma escola? Essa história pode ser um pouco diferente das que você já ouviu e daqui a pouco vai dar para entender o porquê. Desta vez, a escola não nasceu de um sonho ou de um grupo de pessoas com o mesmo objetivo, nem de um grande conglomerado de educação, mas sim de um cenário de adversidade. Quando a pandemia chegou, a pedagoga Sheila Barreto trabalhava em uma instituição de ensino como coordenadora pedagógica da Educação Infantil até ter o seu salário reduzido, situação que muitos profissionais atravessaram no último ano.

A redução substancial da receita, o medo de perder o emprego. Ela estava ali, naquele momento cheio de incertezas, quando a mãe de uma aluna procurou Sheila para dar aulas particulares para sua filha. Ela confessa que, no primeiro instante, não se sentia muito motivada para prestar o serviço, mas combinou que faria uma avaliação com a criança.  Nesse processo, ela percebeu que os pais não estavam em busca somente de aulas, mas também de apoio.

“No processo, me encantei. Os pais buscavam um local seguro e capaz de preencher as lacunas deixadas com a pandemia. Queriam integrar os seus filhos aos conteúdos que eles estavam sem acesso. Tinham medo que seus filhos ficassem sem o desenvolvimento compatível com a sua idade e que isso comprometesse os processos cognitivos posteriores”, conta.

A mesma mãe conseguiu mais cinco alunos para Sheila que decidiu dar as aulas particulares. Esse é o primeiro capítulo da história. Não demorou muito para ela montar um espaço pedagógico, no Imbuí, quando a demanda triplicou ao atender crianças de 2 a 9 anos. O ganho financeiro até mais que isso. Se nas aulas particulares era tirava por mês entre R$ 3 e R$ 4 mil, com o  Espaço Pedagógico Bochê (@espacopedagogicoboche), o retorno chegou a quase R$ 11 mil. Como coordenadora, ela tinha um salário antes R$ 2,6 mil.“Tudo aconteceu muito rapidamente, montamos o espaço em 15 dias. Nas aulas particulares, eu desenvolvi uma afetividade muito grande com cada família e a relação de confiança foi se cristalizando cada vez mais. Em dado momento, perguntei para cada um dos pais se eles deixariam seus pequeninos comigo se eu abrisse um espaço. A resposta ‘sim’ foi unânime”.Entre os principais problemas de aprendizagem identificados pela pedagoga, estavam dificuldades com a coordenação motora. Muitos alunos não escreviam. Outros tantos não faziam leituras de pequenos textos, além de não estarem mais acostumados à socialização.

“O maior desafio que tive foi desenvolver a habilidade da escrita com uma das crianças. Ela não tinha coordenação motora fina, portanto, não sabia escrever. Conhecia, apenas, algumas letras do alfabeto. Hoje, essa criança já escreve o seu nome completo, realiza escrita de pequenas palavras, além de ter adquirido conhecimentos específicos de matemática”.

Na metodologia, ludicidade para interagir e aprender, com um atendimento atento às necessidades de cada um. “Daquele momento em diante, tudo que aquela criança fazia, ela me mostrava com uma alegria imensurável. Me sinto parte do processo mais importante, na minha concepção, de uma pessoa. O processo de desenvolvimento cognitivo”, acrescenta. 

Expansão O projeto da pedagoga agora vai ganhar mais um novo capítulo. De espaço pedagógico, o Bochê está se transformando em escola com 360 m2, 100 m2 de área livre e seis salas de aula. Na nova estrutura, na Pituba, Sheila vai ofertar em 2022, os cursos da Educação Infantil até o Fundamental I.

Foram investidos R$ 100 mil e a escola deve gerar, diretamente, 15 empregos – metade desses profissionais de educação havia ficado sem emprego na pandemia. A expectativa é que o faturamento da escola chegue a um ganho líquido de R$ 30 mil, quase 300% a mais que o retorno do espaço.“Comecei a perceber que os pais procurariam, novamente, as escolas e que,  o espaço não mais teria sentido para eles. Assim, os próprios pais começaram a me incentivar a abrir uma escola. Isso me deu uma energia incrível”, afirma a pedagoga.  As pré-matrículas começaram no mês passado e tem 35 alunos em lista de espera. Ao todo, são 90 vagas. “Dentro do nosso projeto, utilizamos o Retrato Pedagógico. Passamos as primeiras semanas entendendo os níveis cognitivos de cada criança e, a partir desta informação, direcionamos as atividades específicas para esse aluno”.

Se por um lado, Sheila ensinou a ler e escrever, por outro ela também aprendeu muito. “O que o Bochê me proporcionou mesmo foi empoderamento, pois passei a perceber que o mundo era muito maior do que eu imaginava e que as minhas possibilidades, portanto, eram enormes.  Enfim, passei a acreditar mais em mim e, com isso, sai da zona de conforto”, pontua.

Para quem chegou até aqui e está curioso sobre a origem do nome – que não é francês – na verdade, é a mistura do apelido de Sheila, ‘Chê’, com o do marido, José Carlos Rocha, ‘Bou’. “As pessoas nos chamam assim, carinhosamente. Mais do que nunca, as instituições de ensino precisam mostrar a sua essência e perceber cada um dos pequeninos dentro das suas próprias realidades. A escola é, sobretudo, intimista, acolhedora e compreensível”.

A LIÇÃO DE SHEILA

. Situações atípicas, medidas atípicas “Esse é o segredo. Se você pensar de forma igual em uma circunstância diferente, certamente, vai sofrer uma derrota”, afirma a pedagoga. 

. Para trabalhar com Educação é preciso amar o que faz. Mas amar mesmo. “Faça diferente, não tente transformar educação em, apenas, uma forma de ganhar dinheiro e o mais importante: quando olhar para um aluno enxergue e compreenda o que ele precisa para conseguir ajudá-lo”.

. Planejamento Faça um bom plano orçamentário e tributário. “Procure também especialistas em cada área e avalie o mercado local”, aconselha. 

. Acredite no seu projeto “Seja honesto em cada passo e não abra mão disso”.

QUEM É  Sheila Barreto Com 11 anos de experiência na área de educação, a criadora da Escola Bochê é pedagoga e pós-graduanda em Psicopedagogia e Autismo Estruturado.