Por unanimidade, ministros decidem não federalizar chacina do Cabula

Terceira Seção da corte entendeu que Justiça baiana deve dar seguimento ao caso

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  • Tailane Muniz

Publicado em 28 de novembro de 2018 às 16:55

- Atualizado há um ano

. Crédito: Foto: Divulgação/STJ

Em julgamento aberto que durou pouco mais de uma hora, a Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu, no início da tarde desta quarta-feira (28), que não vai federalizar a chacina do Cabula - como ficou conhecida uma operação das Rondas Especiais (Rondesp) da Polícia Militar que resultou na morte de 12 pessoas, na região da Vila Moisés, em fevereiro de 2015.

Os dez ministros que compõem a Terceira Seção do STJ entenderam, por unanimidade - por nove votos a zero, já que o presidente do conselho não vota - que o Tribunal de Justiça do Estado da Bahia (TJ-BA) deve continuar à frente da acusão contra os nove policiais militares envolvidos no caso. 

Por meio da assessoria, o STJ informou que a decisão dos ministros considerou a decisão da Primeira Turma da Primeira Câmara Criminal do TJ-BA que, em setembro deste ano, anulou a decisão da juíza Marivalda Almeida Moutinho. Em julho de 2015, a magistrada absolveu dez policiais militares – incluindo um que sequer era investigado."Os ministros entenderam que essa anulação é uma resposta à sociedade e, portanto, não há, ainda, necessidade de trazer o caso para a Justiça Federal", acrescentou o STF. Ainda segundo informações da assessoria do STF, as poucas pessoas que participaram da sessão, se retiraram assim que a decisão foi anunciada. Irmão do mais velho entre os 12 mortos - Ricardo Vilas Boas da Silva, à época com 27 anos -, o funcionário público Linsmar Vilas Boas, 41 anos, disse ao CORREIO que não acreditava na federalização. "Não só eu, mas todos os familiares com quem tenho contato sabia que não daria em nada. As chacinas acontecem todos os dias, esse julgamento foi apenas um protocolo. Sabia que seria hoje, mas não acompanhei", comentou.

Para Linsmar, que continua morando na região da Vila Moisés, e cria dois sobrinhos, filhos do irmão morto, os policiais não serão condenados."Não há luta para causas perdidas. Essa é uma causa perdida e a gente já sabe disso. Primeiro porque os meninos, culpados ou inocentes, não teriam força diante de uma instituição", disse, em referência à Polícia Militar baiana.A negativa Em nota enviada ao CORREIO, o STJ esclareceu que a Terceira Seção decidiu negar o pedido de federalização porque, apesar de reconhecer que "o quadro descrito pela PGR haveria indícios de possível violação de direitos humanos, o que poderia, em tese, gerar a responsabilização do país", os ministros concluíram que o "eventual falta de isenção na coleta de provas efetuada pela polícia civil estadual não chegou a impedir o bom funcionamento da acusação".

Ainda de acordo com a corte, o relator, ministro Reynaldo Soares da Fonseca, ressaltou que no entender do Ministério Público estadual, havia "provas suficientes para embasar uma denúncia". Reynaldo também ponderou que "ainda que cause estranheza a rapidez com que denunciados foram absolvidos pelo primeiro grau, o TJ-BA anulou a sentença absolutória, a pedido do MP estadual e da Defensoria Pública (assistente de acusação)". O ministro disse que o fato já "demonstra que não há nem deficiência de funcionamento, tampouco comprometimento ideológico ou subjetivo do Judiciário estadual que dificulte a análise isenta dos fatos, deixando claro que eventual erro de julgamento poderá, na forma regular do processo, ser corrigido, seja no tribunal de justiça, seja nas instâncias extraordinárias".

Também votaram contra a federalização os ministros Joel Ilan Paciornik, Antonio Saldanha Palheiro, Ribeiro Dantas, Félix Fischer, Jorge Mussi, Sebastião Reis Junior, Nefi Cordeiro, e Laurita Vaz.

Em entrevista ao BATV, o promotor Davi Gallo, que acompanha o caso, afirmou que agora vai "trabalhar nesse sentido, de que o processo tenha seu curso normal". "Com essa decisão do STJ, o processo vai pra vara de origem e as providências, com certeza, serão tomadas pelo juiz que vai ficar responsável por elas", concluiu Gallo.

Federalização O pedido de julgamento na esfera federal foi realizado em junho de 2016 pelo então procurador-geral da República, Rodrigo Janot. À época, ele sustentou a ação com uma “ausência da necessária neutralidade/isenção na condução das investigações” realizadas na Bahia, além das ameaças sofridas pelo promotor de Justiça atuante no caso.

O processo chegou a ter uma data em dezembro do ano passado, mas não foi julgado por conta da quantidade de ações que foram apreciadas na data. O STJ afirmou ao CORREIO que a defesa chegou a solicitar o adiamento da sessão desta quarta-feira (28), mas o pedido foi negado pelos ministros da Terceira Seção.

Os PMs foram denunciados pelo Ministério Público do Estado da Bahia (MP-BA) em maio de 2015 e a denúncia foi aceita pelo juiz Vilebaldo José de Freitas Pereira, da 2ª Vara do Júri, em junho do mesmo ano. No entanto, Vilebaldo saiu de férias e foi substituído por Marivalda, que tomou a decisão monocrática (individual) de inocentar os policiais, poucos meses depois, “após analisar as provas técnicas do processo”, conforme informou o TJ-BA na época. Nove ministros votaram contra levar chacina do Cabula para âmbito federal (Foto: Divulgação/STJ) Absolvição Foram denunciados pelo MP-BA o subtenente Júlio César Lopes Pitta, identificado como o mentor da chacina, assim como os soldados Robemar Campos de Oliveira, Antônio Correia Mendes, Sandoval Soares Silva, Marcelo Pereira dos Santos, Lázaro Alexandre Pereira de Andrade, Isac Eber Costa Carvalho de Jesus e Lucio Ferreira de Jesus, assim como o sargento Dick Rocha de Jesus.

A juíza utilizou como base para a sua decisão um inquérito do Departamento de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP) que concluiu que houve confronto com os suspeitos e que os policiais militares agiram em legítima defesa. De acordo com o inquérito, divulgado três semanas antes da sentença, "os laudos cadavéricos não mostraram indícios de execução, como lesões típicas de tiros à curta distância". 

Na ação da PM, morreram: Adriano de Souza Guimarães, 21 anos; Jeferson Pereira dos Santos, 22, João Luís Pereira Rodrigues, 21, Bruno Pires do Nascimento, 19, Vitor Amorim de Araújo, 19; Tiago Gomes das Virgens, 18, e Caique Bastos dos Santos, 16; Evson Pereira dos Santos, 27, e Agenor Vitalino dos Santos Neto, 19; Natanael de Jesus Costa, 17, e Ricardo Vilas Boas Silva, 27; e Rodrigo Martins Oliveira, 17.