Restaurante Chez Bernard completa 56 anos valorizando a clássica cozinha francesa

Francês mais antigo da cidade de Salvador viveu muitas mudanças, mas não perdeu o sotaque

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  • Ronaldo Jacobina

Publicado em 7 de março de 2020 às 11:30

- Atualizado há um ano

. Crédito: Foto: Sora Maia/CORREIO

No salão principal com vista total para a baía de Todos-os-Santos, reproduções de quatro antigos cardápios de bistrôs franceses do começo do século 20 ganharam molduras e estão expostos numa das paredes do restaurante Chez Bernard como obras de arte. Sobre um balcão abaixo dos quadros, o cardápio atual do restaurante oferece alguns dos mesmos pratos clássicos que já se comia na França há mais de um século. O recado é claro: ali se respeita a tradição.  Steak au Poivre - Foto: Sora Maia/CORREIO Fundado em 1963, o francês mais antigo da cidade, passou por muitas mudanças, mudou de donos várias vezes, mas não perdeu sua essência. Continua firme e forte, sob o comando do casal Ademar e Verônica Lemos Passos, acarinhando o paladar dos amantes da mais tradicional das cozinhas do mundo. Embora nunca tenha se desviado da autêntica culinária daquele país, o Chez Bernard não deixou de inovar e beber na fonte da cozinha contemporânea que tanto sucesso tem feito nos dias de hoje. Dos clássicos filés Au Poivre, Bérnaise e Bordelaise - que estão no cardápio desde a sua inauguração - às novas criações como o polvo na goma, prato recém-criado pelo atual chef da casa, o belga Laurent Rezette, passado e presente convivem em harmonia.  Polvo untado na goma: corcância e sabor - Foto: Sora Maia/CORREIO Esta nova criação do chef – o Poulpe Crocant à la Gomme de Tapioca et Gnocchi (R$ 96) - vai compor o menu do Goût de France, evento que acontece no próximo  dia 11 de abril, simultaneamente, em milhares de restaurantes franceses mundo à fora. O polvo, que é untado na goma de tapioca, ganha uma crocância que casa bem com o nhoque de batata baroa que o acompanha. O resultado é uma bela composição estética, mas que pode não agradar a todos os paladares.  

Ao longo dos anos, o espaço passou por várias repaginações em sua decoração, mas não perdeu o ar de bistrô. O cardápio enxuto e bem elaborado tem opções que vão de aves aos frutos do mar, de carnes a entradas como o steak tartar (R$ 48).

Mas é um clássico que chama a atenção no cardápio: o Escargot du Bourgogne. A porção, acomodada num vasilhame próprio para servir o molusco, vem com cinco unidades (R$ 74), e é preparada à parte, com um molho de manteiga, ervas e alho. Depois, o molusco já temperado é recolocado na conchinha original, recheado com o molho que é uma tentação à parte, especialmente quando chuchado no pão ou na torrada.  Codorna desossada sobre cama de polenta e molho com uvas - Foto: Sora Maia/CORREIO Quem tem “ginge” com essas iguarias mais exóticas, pode até torcer o nariz ou fazer cara de entojo, mas para quem consegue ultrapassar essas barreiras, vai se refestelar com a delicadeza e o sabor do prato. O bichinho é cozido por mais de três horas antes de ser misturado e, recozido no tempero, por mais um tempo. Mais limpinho impossível. E nada de consistência gosmenta como podem pensar os “entojados”, se formos comparar  a uma outra iguaria, diria que está mais próximo da textura do camarão do que da ostra. 

Outro mito que cerca o escargot, um tipo de caracol comestível, é a dificuldade de consumi-lo já que requer uma certa habilidade manual. Mas acredite, é mais fácil que manusear o hashi na cozinha japonesa. Talvez a má impressão seja em função do cinema e da TV que abusaram de cenas onde personagens, digamos, despreparados, protagonizaram cenas hilariantes com o manuseio das conchas.

Afinal quem não se lembra da clássica cena de Julia Roberts no filme Uma Linda Mulher, que ao pinçar a concha, esta voa e vai parar na mão hábil do maitre do restaurante? Na cena, claro, há certo exagero, afinal, embora pareça complicado, lidar com o prato é mais simples do que se pensa. O segredo é manter a pinça firme sobre a concha sem fazer movimentos e, com um garfo pequeno de dois dentes, retirar o molusco de sua morada e comê-lo. Embora já tenhamos cultivo deste bichinho no Brasil, o do Chez Bernard - o único restaurante da cidade a servir a iguaria - vem da região da Borgonha, na França.

Mas são as vedetes da gastronomia daquele país que a clientela do Chez Bernard vem aplaudindo geração após geração. O Steak Au Poivre, por exemplo, segue a risca a receita dos tempos de Monsieur Bernard, o criador do Chez Bernard.

Desde então, o prato só reduziu um pouquinho de tamanho. Isso por conta do revisionismo feito pelos chefs franceses, na década de 1970, durante o movimento da Nouvelle Cuisine que, dentre outras coisas deixou de herança o uso da matemática na cozinha ao justificar que comida é proporção. Mas se estamos na França, que comamos como os franceses. 

De volta ao filé, a carne, coberta com o molho escuro e grãos de pimenta, vem acompanhada de batata Dauphin - revestida com uma massa leve e crocante, com recheio da própria batata misturado ao profiterole, uma sobremesa consumida na França desde o século 16. Se pedida ao ponto, não há como errar. 

A cereja do bolo dessa viagem pela culinária francesa ficou por conta da codorna desossada que é um dos pontos altos do cardápio. Macia e suculenta, a ave é servida sobre uma cama de polenta e um molho a base de vinho Sauvignon Blanc do Vale do Loire com Uvas sem pele e sem caroços, faz a experiência valer a pena. Depois de tudo isso, a sobremesa foi dispensada, apesar do protesto do chef. Mas se você for daqueles que não abre mão de doce, no dia seguinte amanheça na academia! 

Passo a passo para comer escargot sem dar vexame 1. Pegue a concha com a pinça segurando firme sem fazer movimentos - Foto: Sora Maia /CORREIO 2. Mantenha a pinça firmada sobre a concha e, com um garfo de dois dentes, retire o molusco - Foto: Sora Maia/CORREIO 3. Com o auxílio do garfinho, retire o molusco da concha, tomando cuidado pra pinça não abrir - Foto: Sora Maia/CORREIO 4. Molhe o pão ou a torrada no molho do escargot e bom apetite! - Foto: Sora Maia/CORREIO SERVIÇO  Onde fica: Chez Bernard   Rua Gamboa de Cima, nº 11, Aflitos. Tel. 71 3328 1566 instagram @chezbernard Horário de funcionamento: Terça a sexta, das 12h às 15h e das 19h à meia-noite. Aos sábados e domingo, o almoço funciona das 12h às 16h e o jantar das 19h à meia-noite.