Rio São Francisco tem vazão aumentada e gera expectativa em pescadores

Ação prende 16 por crimes ambientais e resgata animais silvestres

  • Foto do(a) author(a) Mario Bitencourt
  • Mario Bitencourt

Publicado em 27 de novembro de 2018 às 09:42

- Atualizado há um ano

. Crédito: Railton Barbosa/Divulgação

Penalizados com a redução de peixes, consequência de dez anos de chuvas irregulares e desmatamento de matas ciliares e degradação de nascentes, pescadores do Rio São Francisco voltaram a se animar neste mês de novembro com o aumento da vazão.

A notícia boa se dá pelas chuvas que têm caído, sobretudo, no norte de Minas Gerais e na região oeste da Bahia, o que influencia no aumento do nível do rio ao longo dos 266.972 Km2 do Médio São Francisco, que abrange 16 cidades baianas.

Segundo relatório desta segunda-feira (26) da Agência Nacional de Águas (ANA), na região de Bom Jesus da Lapa, no oeste, a vazão do rio está em 1.764 m3/s, e na região do lago de Sobradinho (ao norte) a vazão chega a 1.450 m3/s.

Em comparação com o início do mês de novembro do ano passado, quando estava em 290 m3/s, a atual vazão em Sobradinho é cinco vezes maior. Em Sobradinho, o reservatório do lago está com 22% da capacidade – há um ano era de 3%.

Mas por enquanto ainda não há muitos peixes. Com a seca dos anos anteriores, muitos milhares deles morreram e outros tantos deixaram de se reproduzir. O pior caso foi a morte de milhares de peixes na Lagoa de Itaparica, em setembro de 2017.

Mas nem se houvesse teria como pescar. É que de 1º de novembro a 28 de fevereiro de 2019 o Ibama (órgão federal) proíbe a pesca com todo tipo de malhas e outros equipamentos no São Francisco, devido à época do defeso (de reprodução dos peixes).

Nas lagoas à beira do rio a proibição vai até 30 de abril. Isso porque nessas lagoas é onde estão os berçários do rio. A maior delas, com 24 km de extensão, é a lagoa de Itaparica, entre as cidades de Xique-Xique e Gentio do Ouro, no semiárido baiano.

Para não ficar sem renda alguma ou nem um peixe para comer, os pescadores recebem o seguro defeso do Governo Federal (salário mínimo de R$ 954) e podem pescar de anzol, mas com restrições.

O Ibama permite que eles pesquem com anzol até 5 quilos de peixes de espécies nativas e mais um exemplar de outras espécies, desde que não estejam na lista de extinção, porém o órgão admite que fiscalizar isto é um trabalho quase impossível.

Peixes pequenos Ao longo do rio, a pesca é basicamente artesanal, com amadores, mas também há os que fazem da atividade algo mais profissional. Na região de Bom Jesus da Lapa há cerca de 600 pescadores, segundo estimativas da Colônia de Pescadores local.

Os peixes mais encontrados no Médio São Francisco são matrinxã, xira, piau, pacamã e pirá. “O que temos encontrado no rio não dá pra tirar nosso sustento, se conseguir pegar 5 quilos de peixe num dia é muito”, disse o pescador Osvaldo Guerra, 52.

E o que os pescadores tem mais conseguido são peixes pequenos, sobretudo na região de Bom Jesus da Lapa, Ibotirama e Xique-Xique, os quais foram beneficiários com as ações de peixamento recentes por parte do governo federal.  

Em junho, o Ministério da Integração Nacional distribuiu 150 milhões de alevinos (peixes recém-saído dos ovos) para a revitalização do rio e manutenção dos estoques pesqueiros dos estados de Alagoas, Bahia, Sergipe, Minas Geais e Pernambuco.  

Na Bahia, foram distribuídos 130 mil alevinos de espécies nativas em lagoas marginais do Médio São Francisco. A lagoa Largamar (Ibotirama) recebeu 40 mil, a da Lapa (Bom Jesus da Lapa), 20 mil, e as lagoas Cumprida e Ipueiras (Xique-Xique), 60 mil.

Para a lagoa de Itaparica, hoje com cenário pantanoso, diferente de setembro de 2017, quando era um “mar de peixes mortos”, está sendo preparado um plano de ação pelo Comitê das Bacias Hidrográficas do Rio São Francisco (CBHRSF).

A elaboração do plano ficará a cargo de uma empresa que será selecionada por meio de concorrência pública realizada este mês – a fase de envio das propostas já foi encerrada, mas o nome da empresa selecionada ainda não foi divulgado.

Coordenador da câmara consultiva regional do CBHRSF, Ednaldo Santos disse que, além da recuperação da lagoa de Itaparica, o comitê trabalha na elaboração de planos de saneamento básico para 42 cidades – é um plano para cada município.  

“Com isso, busca-se evitar que esgoto seja jogado diretamente no rio”, disse Santos, segundo o qual outras ações contemplam trabalhos de recuperação de nascentes ao longo do São Francisco prejudicadas por conta da degradação de matas ciliares.

“Há centenas de nascentes que precisam ser recuperadas”, afirmou. “E para isso ser feito é um trabalho de conscientização ambiental que envolve a mobilização de um número bom de pessoas, o que é difícil, pois o Médio São Francisco é muito grande”.

Menos água consumida Além de pescadores, o aumento do nível do rio anima também produtores rurais de Bom Jesus da Lapa, sobretudo os que atuam no Projeto Formoso, que faz a cidade do oeste baiano ser a maior produtora de banana do Brasil.

Segundo a Codevasf (órgão federal vinculado ao Ministério da Integração), o Projeto Formoso consome hoje 10 m3/s nos 1.200 lotes familiares e empresariais que ocupam área maior que 7 mil campos de futebol – antes das chuvas, o consumo era de 14 m3/s.

A água que rega os milhares de bananais é do Rio Corrente, afluente do Rio São Francisco que também foi beneficiado com as chuvas do oeste da Bahia e do norte de Minas Gerais.

“Com mais chuvas, os agricultores gastam menos energia com sistema de irrigação e economizam água do rio”, disse Demétrios Pascoal de Almeida Rocha, técnico da Codevasf em Bom Jesus da Lapa.

Na cidade do oeste baiano, a produção de banana é o ano todo. São 170 mil toneladas anuais, o que representa 2% da produção nacional. A banana da Lapa é vendida para 23 estados – se produz mais as variedades prata e nanica.

“Estamos felizes com essas chuvas que têm feito o rio encher mais, nos dá mais esperança de aumentar nossa produção”, disse o produtor Ervino Kogler, presidente da Associação Banana da Bahia, que reúne 28 grandes produtores do Projeto Formoso.

“O que nos deixa tristes são pessoas que degradam o rio, que derrubam matas ciliares, e acabam ficando impunes na maioria das vezes. Infelizmente, não vemos muito o Estado atuar nessa questão, tão importante para termos um país melhor”, comentou.