Salles repete ministra e defende 'boi bombeiro' para conter incêndios no Pantanal

Ministro do Meio Ambiente participou de audiência virtual do Senado

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  • Da Redação

Publicado em 13 de outubro de 2020 às 14:39

- Atualizado há um ano

. Crédito: Reprodução

O ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, endossou, nesta terça-feira (13), o argumento de que a criação de gado no Pantanal é uma forma eficaz de diminuir as queimadas no bioma. A exemplo de outras pessoas que defendem a expansão da pecuária na maior planície alagadiça do mundo, rica em recursos vegetais e animais, Salles afirmou que, ao se alimentarem, os animais ajudam a reduzir o estoque de matéria orgânica disponível no solo, eliminando parte do material capaz de alimentar eventuais focos de incêndio durante a época da seca.

“Ouvimos de várias fontes diferentes a necessidade de termos um reconhecimento do papel da criação de gado no Pantanal, uma vez que ele também contribui para diminuir o que há de matéria orgânica [combustível]”, disse Salles ao participar, esta manhã, de audiência pública virtual realizada pela comissão temporária externa do Senado para acompanhar as ações de combate ao fogo na região. 

A teoria de Salles é semelhante ao que disse a ministra da Agricultura, Tereza Cristina, na semana passada, defendendo ‘mais gado’ para minimizar queimadas. Especialistas refutam essas teorias (ver mais abaixo).

Os incêndios destruíram quase 4 milhões de hectares de vegetação pantaneira em Mato Grosso e Mato Grosso do Sul. Cada hectare corresponde, aproximadamente, às medidas de um campo de futebol oficial.

Segundo o ministro, a proporção que os incêndios florestais ganharam este ano, no Pantanal e em outros biomas, se deve a uma soma de fatores, como o volume reduzido de chuvas prévias, as temperaturas elevadas e o clima seco. Porém, ao falar sobre a atual situação no Pantanal, Salles criticou a proibição do uso do fogo controlado, o chamado “fogo frio”, para 'limpar' as propriedades agrícolas e, assim, tentar evitar que os incêndios se propaguem.

“Foram criadas áreas onde não há pecuária, nem o manejo do fogo frio. Com isso, o volume de massa [orgânica] aumenta inexoravelmente. E quando ela queima, o volume de fogo é de grandes proporções, conforme estamos vendo este ano”, disse o ministro, enfatizando que produtores rurais sempre se valeram da presença do gado e do uso controlado do fogo para limpar suas terras e, assim, minimizar os riscos de incêndios.

“É preciso seguir com a política de uso preventivo do fogo, um instrumento importante de combate às queimadas que diminui o volume de massa orgânica armazenada. Feito no momento e da forma adequada, ele contribui sim para diminuir a proporção dos incêndios”, pontuou.

Leia artigo de José Luís Penna: Passa boi, passa boiada, passa a manada inteira

Salles também defendeu o uso de produtos químicos, os chamados retardantes de chamas, no combate ao fogo. No Mato Grosso, bombeiros estão usando um dentre os vários tipos de retardantes existentes para tentar apagar as chamas, inclusive nas proximidades do Parque Estadual Encontro das Águas, conhecida pela concentração de oncas-pintadas. O temor de ambientalistas é que as substâncias provoquem danos à flora, afetando os animais que vivem na região.

“Durante muito tempo, tivemos uma discussão inócua quanto a se devíamos ou não usar o retardante, quando vários países já utilizam esta tecnologia para melhorar o combate às queimadas”, disse o ministro, argumentando que o emprego de retardantes de chamas “aumenta em cinco vezes a capacidade de resposta das aeronaves” usadas para lançar água sobre focos de calor. “Já o havíamos testado em outras oportunidades e o utilizamos agora, na Chapada dos Veadeiros, e foi um sucesso. Esta é uma questão que precisa ser encarada de frente. Esta visão de que o emprego de tecnologia não é salutar é equivocada.”

Ao falar sobre medidas práticas para evitar que a situação deste ano se repita – especialistas apontam que o Pantanal atravessará de quatro a cinco anos de seca semelhante a atual -, Salles confirmou que o governo federal e os governos de Mato Grosso do Sul e de Mato Grosso estudam construir uma base de monitoramento permanente em área pantaneira, na divisa entre os dois estados.

“Esta parece-nos uma boa ideia; algo a ser organizado entre os governos estaduais e federal”, comentou o ministro, pouco antes de mencionar que apenas 6% de toda a área do Pantanal estão sob a responsabilidade federal. “Estamos falando de áreas que compreendem florestas destinadas, unidades de conservação, terras indígenas e assentamentos. Por isso é importante termos os estados envolvidos nisto.”

Especialistas refutam tese A teoria do "boi bombeiro", repetida inclusive pelo presidente Jair Bolsonaro, não procede de acordo com especialistas ouvidos pela BBC Brasil. Um dado, inclusive, aponta que a criação de gado aumentou no Pantanal nos últimos anos, ao invés de diminuir, o que contradiz a ideia de que o boi pantaneiro seria fundamental para impedir incêndios.

Além disso, a queima preventiva não foi proibida totalmente nos últimos dois anos (só foi restrita pelos governos estaduais durante a estação seca, seguindo orientações do próprio Ministério do Meio Ambiente). E a área coberta por unidades de conservação na região é ínfima, de menos de 5% do bioma, de acordo com informações do Uol.

Na verdade, um dos principais motivos para os incêndios é o clima: o pantanal vive a pior seca dos últimos 60 anos, segundo o Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais (Cemaden). As queimadas no Pantanal neste ano são consideradas as piores em décadas. Cerca de 15% da área do bioma já foi consumida pelo fogo até agora.

As chamas já destruíram uma área de 2,3 milhões de hectares no bioma, o equivalente ao Estado de Sergipe, ou quatro vezes a área do Distrito Federal. Com informações da Agência Brasil, BBC Brasil e portal Uol.