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Tailane Muniz
Publicado em 16 de setembro de 2019 às 15:30
- Atualizado há 2 anos
A imensidão em verde, onde estão concentrados pelo menos 61 mil espécimes de vegetais, não é de conhecimento de muitos baianos. Em cinco anos, de 2013 a 2017, as 18 mil pessoas que visitaram o Jardim Botânico de Salvador, que compreende uma área de 160 mil metros quadrados, encontraram um lugar deficiente em infraestrutura e paisagismo. >
Para o próximo ano, no entanto, a ideia é que o parque natural, localizado entre os bairros de São Marcos e São Rafael, na capital, para além da natureza, ofereça conforto, segurança, áreas abertas à visitação e espaço dedicado à pesquisa, cultivo e plantio de plantas consideradas sagradas por religiões de matriz africana. O passo foi iniciado nesta segunda-feira (16), quando o prefeito ACM Neto assinou a ordem que autoriza o início imediato das obras de requalificação, orçadas em R$ 8 milhões.>
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Ao comentar sobre o “abandono” do local pela administração pública, até então, o prefeito tomou para si a responsabilidade de entregar, em 12 meses, o que chamou de novo patrimônio da cidade. O prefeito comparou a obra à realizada no Parque da Cidade, entregue em 2016. "É um espaço com muitos problemas de infraestrutura e que se tornará um destino para crianças, jovens, pesquisadores e acadêmicos que tenham interesse em conhecer nossas espécies preservadas. Daremos segurança a essas pessoas".O prefeito citou, ainda, o herbário - onde estão armazenadas mostras dos vegetais -, que será ampliado durante as intervenções, desenhadas no projeto da Fundação Mario Leal Ferreira (FMLF), sob a coordenação da Secretaria Municipal de Sustentabilidade, Inovação e Resiliência (Secis). A intenção é de que a coleção se torne um centro de referência em pesquisas da Mata Atlântica, com capacidade para acomodar ainda mais espécies. Prefeito assinou ordem de serviuço nesta segunda-feira (Foto: Max Haack/Secom PMS) Secretário de Infraestrutura e Obras Públicas, o vice-prefeito Bruno Reis acredita que "as pessoas de Salvador não sabem que o jardim existe" porque não há, no local, uma estrutura que alimente o desejo de conhecer a reserva, onde um prédio principal com auditório, mirante e energia solar, será construído em área de 2.219,45 m². >
"Além de estar em contato com a natureza, essas pessoas vão ter um lugar a mais de lazer e trabalho", considera, ao destacar que ambulantes da região vão ser livres para comercializar produtos no espaço. Os mais entusiastas do verde têm, ainda, a possibilidade de conhecer as dezenas de espécies de vegetais, incluindo ameaçados de extinção, no percurso de 795 metros de extensão na área preservada.>
Serão construídas edificações de caráter científico, voltadas ao estudo, manutenção e conservação da Mata Atlântica, conectados e acessados por uma trilha elevada em um percurso de 795 m de extensão pela mata. O equipamento ganhará também um edifício principal com área total construída de 2.219,45 m², dividido em dois pavimentos, um subsolo e uma cobertura aberta a visitas. Foto: Max Haack/SecomPMS Convívio com as plantas Dos banhos para tratamento espiritual, comuns nos tantos terreiros de candomblé da cidade, às moquecas preparadas e servidas nas mesas das famílias baianas, as folhas estão presentes. Da aroeira ao coentro, alguns vegetais dão a dimensão do conceito de etnobotânica, relação cotidiana que as pessoas têm com as plantas, especialmente na Bahia.>
Do plantio à colheita, os cultos do candomblé dedicam cuidado às plantas, explica a coordenadora da Associação Nacional das Baianas de Acarajé, Mingau e Receptivo (Abam), Rita Santos, ao comentar a presença de vegetais sagrados, como a aroeira e o dendezeiro, presentes na mata do Jardim Botânico de Salvador. Membro do Conselho Municipal da Comunidade Negra (CMCN), Rita defende que a requalificação do local representa, para ela, "o respeito" aos seus."Atualmente, nós, de terreiro, não temos um espaço bem cuidado onde a gente possa colher nossas plantas, então eu considero que vai ser uma grande conquista para todas as pessoas que, assim como nós, têm respeito e precisam das plantas para suas realizações", destaca. Rita acrescenta, ainda, que os terreiros da cidade têm "cada vez menos espaços apropriados para o plantio", o que aumenta a importância do novo parque. "As plantas estão na feira e a gente acaba tendo que comprar muitas por lá, mas são situações em que não sabemos as condições em que elas foram plantadas e colhidas, e isso importa muito na nossa religião, o tratamento é tudo". >
Conceito Cuidado este que, às várias espécies presentes na área verde preservada do novo jardim, é algo que vai se desenhar ao longo do tempo, explica o secretário de Sustentabilidade, André Fraga. >
Não se sabe, ao certo, quantas e quais são todos os 61 mil vegetais ali presentes, até pela falta de acompanhamento até o momento, reforça André, mas a ideia é que o herbário que já abriga àquelas, após a ampliação, tenha estrutura para manter e possibilitar que as pessoas acompanhem e participem de todo o processo."A culinária, os banhos, tudo isso é a etnobotânica. Ela está presente em nossas vidas, porque nada mais é do que essa relação com as folhas. Então, a nossa intenção é que, a partir de agora, todos tenham a oportunidade desse convívio maior, do entendimento desse contato com a natureza, a partir desse projeto", comenta.O secretário estima que, contando a parte final da execução das obras, que inclui também exposição museográfica no prédio principal, além de pontos da trilha em referência aos orixás, a começar pelos nomes: Xangô, Oxóssi, Oxalá, Exu e o próprio Ossain, representantes das folhas nos cultos do candomblé.>
"Na parte de Iansã, por exemplo, a vegetação vai se movimentar. Oxóssi, um arco e flecha vai servir de representação, porque vamos unir elementos como a linguagem visual, além de atender à demanda dos terreiros". O projeto prevê, ainda, artes em cimento, de autoria do baiano Bel Borba. >