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'É difícil lutar diariamente pra sobreviver', diz moradora do Nordeste


 

Leia o relato completo; bairro é alvo de operação após morte de PM e onda de violência

  • Da Redação

Publicado em 12/06/2018 às 11:28:19
Atualizado em 18/04/2023 às 12:44:04

“É difícil estar em um bairro periférico e lutar diariamente pra sobreviver”. Com essas palavras, Tulipa*, uma jovem de 28 anos moradora do Nordeste de Amaralina, sintetizou o fim da noite de segunda-feira (11) e a madrugada desta terça-feira (12) no bairro. O Nordeste de Amaralina é um dos palcos centrais de uma onda de violência que acomete Salvador e a Região Metropolitana (RMS) desde o sábado (9). 

Na sexta, o cabo da Polícia Militar Gustavo Gonzaga, 44 anos, foi morto de uma forma brutal. Morador do Nordeste, ele voltava para casa quando foi abordado por bandidos. Foi torturado e teve o corpo mutilado. Os autores do crime chegaram a arrancar o coração da vítima e deixaram o órgão na localidade conhecida como Boqueirão, a mais de um quilômetro de onde Gonzaga foi assassinado.

Desde então, o Nordeste de Amaralina tem sido alvo de uma “operação ininterrupta” da Secretaria da Segurança Pública (SSP). Para os moradores, fica o sentimento de “temor, impotência e angústia”, como descreve Tulipa. Ela conta que escutou mais de 30 tiros durante uma abordagem da PM que durou mais de uma hora. “O que sei é que há uma nuvem negra, amiga, naquele bairro. Há desrespeito aos moradores quando têm suas casas invadidas”, escreve. Na madrugada desta terça, quatro homens foram mortos pela polícia no Nordeste.

Confira o depoimento na íntegra:

Essa foi uma das piores noites da minha vida, o silêncio da madrugada foi tomado por gritos que ecoavam de várias partes do bairro. Temor, impotência, angústia foram os sentimentos que tomaram conta do meu coração diante da abordagem da polícia militar que durou mais de uma hora na noite desta segunda pra terça. Mais de 30 tiros. Mortos, não se sabe a conta certa.

O que sei é que há uma nuvem negra, amiga, naquele bairro. Há desrespeito aos moradores quando têm suas casas invadidas. Aos empresários, que tentando driblar a crise, precisam driblar também a ostensividade dos policiais que vasculham os estabelecidos. Há falta de sensibilidade da imprensa, quando coloca os moradores no mesmo pacote junto aos transgressores da lei.

É difícil estar em um bairro periférico e lutar diariamente pra sobreviver. É passar diariamente por constrangimento quando precisamos utilizar um serviço básico e vc escuta do taxista ou do motorista de aplicativo que não sobe lá não pq é perigoso. Os anos vão passando e a gente perde a utopia de acreditar que amanhã será melhor que hoje.

Operação no bairro  Na segunda-feira, o titular da SSP, o secretário Maurício Barbosa, adiantou que o Nordeste de Amaralina seria alvo de uma ‘operação ininterrupta’ a partir de agora. Barbosa reforçou que a SSP precisa dar uma resposta rápida à morte do PM. 

“Vamos tratar de forma prioritária, rápida. Temos ações dentro da lei. Não é como cada um fazer o que bem entende, como um faroeste. Temos que avaliar as mortes que ocorreram nesse contexto do fim de semana, fazendo com que essas pessoas paguem pelos seus crimes”, completou, em entrevista coletiva, na tarde de segunda, na sede do Centro de Operações e Inteligência (COI) do órgão. 

Mais cedo, em entrevista ao CORREIO, o secretário afirmou que a SSP investigava se a onda de violência que deixou 30 mortos no fim de semana seria a uma retaliação pela morte de dois policiais militares – além do cabo Gonzaga, o também cabo da PM José Luiz da Hora, 51, morto na quinta-feira (7) em São João do Cabrito. Ele era pastor de uma igreja em Periperi, onde congregava há 17 anos, e não costumava andar armado.

Segundo o secretário, os suspeitos de participar e de ordenar a morte do policial – a que chamou de ‘selvageria’ – já foram identificados. Barbosa ainda lamentou a morte do cabo Gonzaga e disse que a PM perdeu um de seus “mais brilhantes quadros”.