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O poder dos fungos: como os cogumelos viraram suplementos queridinhos de famosos

De Gisele Bündchen aos meros mortais, os cogumelos medicinais saíram da panela e invadiram o mercado de suplementos com promessas de foco, energia e bem-estar. Mas até onde vai a ciência e onde começa o marketing?

  • M
  • Moyses Suzart

Publicado em 11 de outubro de 2025 às 05:00

Gisele Bundchen  tomendo suplemento de cogumelo
Gisele Bundchen tomendo suplemento de cogumelo Crédito: Divulgação

Geralmente o cogumelo está associado a psicodélicos, venenos, remédios e até ao joguinho do Mário Bros, mas estes fungos (sim, são fungos) já invadiram outras esferas da nossa rotina diária, como foco no trabalho e até como suplemento para os marombeiros. Nos corredores das tendências de saúde e bem-estar, os complexos nutricionais feitos com cogumelos medicinais têm ganhado cada vez mais espaço. No Brasil, a comercialização ainda é tímida, mas está ganhando força, principalmente quando alguns famosos, como a ex-modelo Gisele Bündchen, resolveram aderir aos cogumelos.

A promessa destes suplementos é tentadora: mais foco, energia, memória afiada e até reforço para a imunidade. Nos sites de compra, há um cardápio imenso de produtos do gênero e de diferentes espécies.A top model Gisele Bündchen, obviamente, escolheu uma marca americana e, claro, aproveitou para fazer sua ‘publi’. Ela utiliza a marca Gaia Herbs, que custa, em média, R$ 360. Desde 2023 Bündchen utiliza cápsulas de compostos do cogumelo Lion’s Mane Mushroom, o nome em inglês para a juba de leão.

“Há algum tempo que tomo e ele realmente me ajuda na concentração e a aumentar a minha energia”, garante Gisele. O depoimento da top model se encaixa em um contexto cultural em que celebridades influenciam não apenas moda e comportamento, mas também escolhas relacionadas à saúde. Ao incorporar o Lion’s Mane em sua rotina, Gisele coloca holofotes sobre um suplemento que vem sendo estudado pela ciência, ainda que com resultados preliminares. O cogumelo, cujo nome científico é Hericium erinaceus, é usado há séculos na medicina tradicional asiática. Mas até hoje a ciência não bateu o martelo sobre sua eficácia.

O cogumelo juba, apesar de ser a moda do momento, não é a única. Estudos revelam que existem quase 150 mil fungos descobertos em todo o mundo, mas a estimativa é que a natureza abrigue 2 milhões deles perdidos por aí. Entre as descobertas, quase 50 mil são cogumelos. Mas não adianta achar que vai pegar qualquer espécie na rua, comer e achar que vai passar naquele concurso público.

Deste recorte, apenas 2 mil espécies são consideradas próprias para consumo, além de algumas que precisam de algum manejo especial para se tornarem apetitosas para o ser humano. Cerca de 400 vivem no Brasil. Até as comestíveis que apontam uma tendência para habilidades motoras e intelectuais precisam de certo manejo para se tornarem o suplemento prometido. No caso do juba de leão, os compostos Hericenonas e Erinacinas são as promessas para turbinar o cérebro e o pique para enfrentar o dia a dia. Mas nosso corpo não consegue pegar todo seu poder. É aí que entra a manipulação.

Os fabricantes prometem extrair estes componentes, utilizando técnicas que envolvem até álcool. Eles podem ser vendidos em cápsulas, pós e extratos líquidos e, claro, não existe apenas o cogumelo juba de leão à venda. existem outros, como Reishi, Cordyceps, Chaga, Turkey Tail e Maitake, cada um com sua característica peculiar (confira no final do texto).

O Reishi é associado ao fortalecimento do sistema imunológico e ao combate ao estresse, enquanto o Cordyceps ganhou fama entre praticantes de atividade física pela promessa de maior energia e resistência. Mesmo assim, este ano a Anvisa proibiu a comercialização de alguns produtos da marca Mushdrops, por não atender às exigências do órgão regulador. Todos os lotes com os cogumelos foram retirados de venda, mas ainda é possível encontrá-los no Mercado Livre e Shopee. De acordo com a Anvisa, os produtos vinham sendo comercializados como medicamentos.

Os suplementos de cogumelos medicinais, ao menos na teoria, não são proibidos nem controlados pela Anvisa ou pelo Ministério da Saúde porque se enquadram na categoria de alimentos e suplementos alimentares, e não de medicamentos. De acordo com uma resolução do próprio órgão, produtos como fungos com histórico de consumo seguro podem ser comercializados sem necessidade de prescrição médica, desde que não contenham substâncias com efeito farmacológico, psicoativo ou tóxico. No caso dos cogumelos funcionais, como o juba de leão, suas formulações utilizam extratos naturais sem psilocibina, justamente o composto que ‘bate onda’.

Cogumelo juba de leão
Cogumelo juba de leão Crédito: Divulgação

Segundo o farmacêutico Gibran Sousa, diretor do Sindifarma, é fundamental compreender que os suplementos naturais, como os feitos a partir de cogumelos, não se enquadram na mesma categoria dos medicamentos. “O medicamento tem um propósito claro de tratar ou prevenir uma condição e passa por estudos clínicos controlados, com doses definidas e indicações específicas. Já o suplemento atua mais como um complemento, que pode auxiliar o organismo, mas sem a pretensão de substituir um tratamento”, explica.

Ele lembra que, por essa razão, a legislação não permite que suplementos façam promessas de cura ou melhoria comprovada de funções, já que “não há um lastro científico controlado como ocorre com os fármacos”. Ou seja: suplementos naturais como os de cogumelos devem ser vistos como aliados, e não substitutos de tratamentos médicos.

Eles têm a força

Pesquisas recentes apontam potenciais efeitos neuroprotetores de diversos tipos de fungos, incluindo os cogumelos, como antioxidantes e até regenerativos sobre células nervosas, levantando a hipótese de benefícios para memória, foco e concentração, como já mencionamos. Ainda assim, os estudos em humanos são pequenos e insuficientes para comprovar todas as alegações, apesar do avanço sobre descobertas de benefícios dos fungos, principalmente em tratamentos da saúde mental. Ainda assim, a ciência não chegou a bater o martelo sobre tais benefícios, ao menos nos dois principais aspectos dos suplementos: foco e saúde.

Esse ponto é importante para distinguir entre três formas diferentes de uso de cogumelos. A primeira é a dos suplementos funcionais, como o que Gisele consome, comercializados legalmente, sem efeito psicoativo e usados com a promessa de melhora no bem-estar. A segunda é a dos estudos terapêuticos com substâncias psicoativas, como a psilocibina presente em alguns cogumelos alucinógenos, investigada em protocolos clínicos para tratar depressão resistente, ansiedade e transtorno de estresse pós-traumático.

E a terceira é o uso recreativo desses mesmos cogumelos alucinógenos, praticado por pessoas que buscam alteração da consciência, muitas vezes de forma não regulamentada e arriscada. Embora compartilhem a origem fúngica, trata-se de universos distintos em efeitos, riscos e objetivos.

Se o efeito em forma de suplemento ainda não tem um embasamento científico probatório, o uso dos cogumelos em tratamentos de algumas doenças, desde que de uso controlado por médicos, já têm evidências mais robustas do que a do uso suplementar.

“A psilocibina é classificada como substância alucinógena, psicodélica, e vários estudos têm mostrado seus efeitos para depressão, ansiedade e transtorno por uso de substâncias. Os resultados favoráveis aos seus efeitos terapêuticos são mais robustos, o que faz a comunidade científica acreditar que em breve será liberada para a utilização médica. No momento, há estudos que a utilizam, principalmente no que se chama Psicoterapia Assistida por Psicodélicos, com resultados promissores. Contudo, sua liberação para uso ambulatorial ainda não ocorreu”, disse Esdras Cabus Moreira, coordenador do CETAD, da Ufba, se referindo ao uso como suplementos. .

No fim das contas, os cogumelos funcionais ocupam um espaço curioso entre ciência em andamento, tradição milenar e marketing moderno. Se para Gisele Bündchen o Lion’s Mane se tornou um aliado de energia e concentração, para o público em geral ainda prevalece o convite à reflexão: até onde vai o real benefício comprovado e onde começa o poder da influência cultural e do desejo coletivo por soluções rápidas para os dilemas de uma vida acelerada?

Reishi Cordyceps por Divulgação

Os cogumelos mais usados em suplementos e suas promessas

Lion’s Mane / Juba de Leão (Hericium erinaceus)

Promessa: melhora o foco, a memória e a clareza mental.

Composto ativo: hericenonas e erinacinas, que estimulam o crescimento e a regeneração neuronal.

• Reishi (Ganoderma lucidum)

Promessa: reduz o estresse e promove equilíbrio emocional e calma.

Composto ativo: triterpenos e polissacarídeos, com ação adaptógena e imunomoduladora.

• Cordyceps (Cordyceps militaris / sinensis)

Promessa: aumenta a energia, resistência física e combate à fadiga.

Composto ativo: cordicepina, conhecida por estimular a produção de energia celular (ATP).

• Chaga (Inonotus obliquus)

Promessa: fortalece a saúde digestiva e ajuda a combater inflamações.

Composto ativo: betaglucanas e antioxidantes como a melanina, que reduzem o estresse oxidativo.

• Turkey Tail (Trametes versicolor)

Promessa: fortalece o sistema imunológico.

Composto ativo: polissacarídeos PSP e PSK, estudados por seus efeitos no aumento da imunidade.

• Maitake (Grifola frondosa)

Promessa: promove a saúde cardiovascular e regula o metabolismo.

Composto ativo: betaglucanas que ajudam no controle da glicemia e do colesterol.