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Da Redação
Publicado em 23 de novembro de 2022 às 05:30
No mundo corporativo vigente, a preocupação com três pilares que formam o ESG (sigla de Environmental, Social and Governance, ou, na tradução, Ambiental, Social e Governança) tem progressivamente alterado o funcionamento do mercado na busca pelo cumprimento da agenda que visa gerar valor social antes de capturar valor econômico. Essa mudança de operação e cultura do mercado é um dos fundamentos do capitalismo de stakeholders, ou seja, um capitalismo sustentável e marcado pelas boas práticas de gestão de empresa. >
Em Salvador para o evento Abracom Talks, da Associação Brasileira das Agências de Comunicação (Abracom-BA), nesta terça-feira (22), a criativa Erlana Castro falou sobre ESG e sua importância para os negócios. Com o CORREIO, conversou sobre o contexto que envolve o ESG, os desafios da sua implementação na Bahia e no Brasil, bem como perspectivas para o futuro empresarial sustentável. >
Quem é >
Erlana é baiana, formada em Administração pela Universidade Federal da Bahia (UFBA) e professora da Fundação Dom Cabral (FDC). É especialista em estratégia criativa, fundadora e animadora do #ESGpraJÁ e SXWS speaker. Foi coautora do Radar Antifragilidade, ferramenta de diagnóstico e planejamento para o desenvolvimento da cultura ESG nas empresas. >
Atualmente se ouve falar muito em ESG. Para você, o que essa sigla significa? >
A melhor maneira de enxergar o ESG é como se fosse a nova versão do sistema operacional do nosso negócio. Se o nosso negócio fosse um celular, ou seja, um device [dispositivo] de criar valor para o mundo e para nós mesmos, esse device rodaria em um sistema operacional, que se chama capitalismo. O ESG é como se fosse uma nova versão do sistema operacional do capitalismo. Então, precisamos atualizar o sistema do nosso device para que possamos estar compatíveis. O ESG está além de uma agenda corporativa opcional ou uma narrativa alternativa de negócio. É exatamente o novo jogo do negócio. >
Em que consiste esse jogo? >
Consiste em regenerar e lucrar ao mesmo tempo, em encontrar maneiras e oportunidades de regenerar o meio ambiente e a sociedade, e com isso capturar valor de volta para o negócio. É como dizer que a equação criativa dos negócios mudou. No contexto do ESG, a nossa equação é encontrar meios e modos de lucrar via regeneração. >
Na sua visão, pode haver governança ou sustentabilidade sem impacto social? Ou esses três pilares precisam funcionar juntos? >
Eles são juntos, porque a história é sistêmica. A gente já junta o pacote socioambiental, inclusive, porque não é possível se eximir enquanto empresa e focar apenas na descarbonização do planeta e deixar o ‘pau quebrado’ lá no social. Não existe isso. Então, a pauta está colocada e ela é um inteiro. É responsabilidade social, responsabilidade ambiental e governança corporativa. Essas três coisas funcionam juntas e articuladamente, uma sem a outra não acontece. >
Por que você acha que a agenda ESG ganhou forma e tanta relevância nos últimos tempos? >
A ESG é uma conversa que já tem pelo menos duas décadas acontecendo dentro das grandes organizações. Então, essa pauta já está aí há muito tempo, mas muito no foco de gestão de risco e compliance. Da pandemia para cá, no entanto, a coisa acelerou muito porque experienciamos, juntos, em escala global e simultaneamente, o que poderia ser um MVP do fim do mundo. É por isso que o ESG é contextual e muito potente, porque pela primeira vez a gente vê uma convergência absoluta entre os interesses e prioridades da sociedade e do capital. >
Por que demorou tanto para o capital e a sociedade quererem a mesma coisa? >
A sociedade sempre solicitou isso do setor privado. A novidade é a convergência do capital com essas pautas com tamanha assertividade e apetite. Isso acontece porque é uma rua sem saída. Então, para que o próprio capitalismo sobreviva, ele precisa evoluir. O ESG é uma narrativa de ponte, de transição para esse novo capitalismo de stakeholder. Nessa nova versão, é necessário criar valor para a sociedade para então estar legitimado a capturar valor. >
Como a tecnologia pode auxiliar na implementação de uma atuação responsável no âmbito ambiental, social e de governança? >
O ESG passa por mais tecnologia, mas tecnologia à serviço da humanidade. Inclusive, a tecnologia é um grande acelerador do ESG. As duas coisas se aceleram mutuamente. A tecnologia vai nos ajudar a conseguir o que a gente precisa no tempo que a gente tem. É a principal aliada no processo de transformação. >
Como criadora, pode falar um pouco da criação do Radar Antifragilidade? >
O Radar é uma ferramenta criativa que traz a possibilidade de nos percebermos na perspectiva do contexto. Existe um contexto caótico que está posto para nós, e é muito difícil operacionalizar ele, porque a gente não consegue sequer descrever. A ideia do Radar Antifragildade era justamente descrever esse contexto e ajudar as empresas e marcas a fazerem uma melhor leitura das forças que estão postas e dialogar melhor com isso. >
Já houve algum avanço no Brasil na aplicação da agenda ESG? >
Nós somos potência ambiental, então, no ponto de vista do meio ambiente, o Brasil é parte da solução do problema global. Do ponto de vista social, o Brasil é parte do problema. Isso dá oportunidades diferentes. Mas o Brasil está indo rápido nas discussões e, agora, acho que acelera. A COP-30 de 2025 ser na Amazônia é um grande acelerador de posição para nós. Temos um belo caminho pela frente. >
Quais são os desafios a serem enfrentados na aplicação dessa agenda na Bahia? >
A Bahia não está fora do mundo na aplicação da agenda ESG. Nós temos aqui questões importantes no ponto de vista social em primeiro lugar. Acho que o “S” na Bahia é maiúsculo. Temos pautas importantes, emblemáticas. Toda a pauta do antirracismo é prioritária, potente, então a Bahia está circunscrita. Não consigo imaginar por que aqui seria diferente. >
Quais seriam então os melhores caminhos para a aplicação dessas estratégias nas empresas baianas? >
Cada empresa vai ter que encontrar o seu caminho. Não tem receita. Agora, todas elas vão passar necessariamente por um ponto de partida que é o mesmo para todo mundo. É do propósito para as estratégias e das estratégias para os indicadores. E não o contrário. Esse é um caminho crítico e que não tem atalho, porque todo atalho no ESG leva para um discurso sustentável sem prática efetiva, induzindo as pessoas ao erro. >
*Com orientação da subchefe de reportagem Monique Lôbo>