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Da Redação
Publicado em 1 de abril de 2022 às 16:45
- Atualizado há 2 anos
Rachel Reis, de 25 anos, é um talento de Feira de Santana, na Bahia, que vem se destacando na cena da música alternativa brasileira. Transformando o gingado baiano em sonoridade própria, ela prefere não se limitar. “Eu não quero perder essa naturalidade, essa suavidade que eu percebo, esse frescor que ainda tem na minha música. Então, é uma preocupação que eu tenho de não tentar identificar qual é o meu gênero”, destaca a artista.>
A cantora chegou a largar o emprego de recepcionista para gravar seus primeiros singles, e se dedica a construir sua carreira musical com o cuidado e polimento necessário para transmitir a sua verdade, em meio a shows, faculdade e home-office. Ela chamou a atenção por adicionar a MPB ritmos como arrocha e o chamado “pagodão baiano”, além das batidas eletrônicas. Em fevereiro deste ano, analistas de música do YouTube incluíram a cantora na lista com 10 artistas para ficar de olho em 2022.>
Confira, no vídeo abaixo, um pouco da sonoridade de Rachel. Depois do vídeo, leia a entrevista completa e conheça um pouco mais dessa artista.>
CORREIO - Como iniciou a sua relação com a música? Rachel Reis - Eu já vinha de uma família de pessoas envolvidas com música. Minha mãe, Maura Reys, era cantora de seresta, e na época que eu peguei, tinha uns 7 ou 5 anos, já era o finalzinho do auge dela. Só que eu já via qual era a dimensão, sabe? Via pessoas lotarem a Praça da Matriz, de ir para outra cidade e ter gente com placas na mão com o nome dela, fui acostumada com músicos pela casa durante os ensaios, com todo esse movimento de uma família inserida na música… Faz 15 anos que minha mãe é cantora evangélica, e minha irmã, Sara Reis, é cantora de forró também.>
Só que eu achava que isso não seria para mim e neguei por muito tempo. Acho que tinha esse problema de não me ver nessa posição de destaque. Então eu decidi que iria fazer Direito, fiz um semestre e troquei por Publicidade e Propaganda. Mas, em 2016 foi quando eu decidi que eu iria cantar. As pessoas que andavam comigo sempre falavam que minha voz era bonita e que eu deveria investir nisso. Eu não dava muita ousadia para essa conversa, mas chegou o momento que eu acreditei e falei: “Vamos lá”.>
CORREIO: Nesse primeiro momento você foi lá para os barzinhos da cidade. Como foi? Rachel Reis: Fiz barzinho por dois anos. Todo final de semana, barzinho, aniversário, casamento, eventos, formatura… Tudo que rolasse, absolutamente tudo, que me chamassem pra cantar, eu tava no meio. Só que depois de dois anos, eu fui desanimando um pouco disso. Eu pensei: “Vixe… Para onde que eu vou mais com isso daqui? Quero mais não”. Tava cansada já de fazer cover e não tava agregando mais para mim. Aí nesse período da faculdade, eu fui entender, mais ou menos, como era o mercado e o que eu precisava fazer para me organizar.>
CORREIO: Em 2019, você deu outra virada na vida com a ajuda do Barro, lá de Pernambuco. Explica mais sobre como foi isso. Rachel Reis: E no finalzinho de 2019, coincidentemente, quando eu estava procurando um estúdio para gravar minhas músicas, comecei a conversar com Barro, que é um cantor de Pernambuco. Ele tinha me seguindo no Instagram nesse período e já fui lá falar com ele. Chamei no Direct disse: “E aí, Barro, para a gente cantar junto?” e ele “Oxe, é assim, é?” (Risos). Ele falou que tinha aberto um estúdio em Recife, eu falei que tava me organizando para gravar, e aí bateu, né? Foi assim que surgiu a possibilidade… Na verdade, a possibilidade não surgiu. Larguei meu emprego, era recepcionista de um posto de saúde. Já tava doida, atormentada. Larguei meu trabalho e fui para Pernambuco gravar minhas duas músicas em 2020. E foi aí, em 2020, que eu segui fazendo coisas e não parei mais. Meus dois primeiros singles foram com o artista Barro e o EP Encosta tem a participação de Bruno Zambelli e Marcos Cuper.>
CORREIO - Como foram essas parcerias?>
Raquel Reis - Então, foi bem natural com Barro e, também, com os meninos. Logo que eu finalizei o lançamento das duas músicas (Ventilador e Sossego) a pausa foi bem curta, até que eu falasse com Bruno. E eu sou dessas que tá observando o que é que tá rolando, vendo as pessoas que eu quero trabalhar, e ele foi uma das pessoas que eu me interessei. Só que no período ele tava ocupado, e logo depois veio a pandemia, e foi o ápice assim, sabe? Foi aí que ele começou a fazer projetos que tinha vontade, mas estavam em standy by.>
Então. ele se juntou com Marcos na composição de uma base (de música), que foi a base de Saudade, e falou: ‘Poxa, conheço uma menina que eu acho que vai funcionar muito aqui, para fazer essa composição de letra e melodia com a gente’. Aí me chamou, eu fiz a composição em cima da base e o que seria só uma música se transformou num EP e no álbum visual. O nosso processo foi todo à distância, por causa da pandemia. A gente só se encontrou no finalzinho para gravar, realmente, e depois para gravar o clipe . >
CORREIO - Você fez álbum visual pro EP Encosta, clipe para Saudade, também tem o clipe de Me Veja com Illy. O audiovisual parece estar tudo muito agregado ao seu trabalho musical. Como você se relaciona com isso? Raquel Reis - Poxa, eu sou uma pessoa muito visual também. Eu gosto muito de cinema, sabe? Inclusive, muitas inspirações de coisas que eu escrevo, posso ter achado de um filme. Aí o povo pergunta “Você fez pra quem?” e não foi para ninguém. Veio assim, eu assisti, me inspirou, e quando olhei, criei alguma coisa relacionada a isso. Se eu tivesse mais condição agora, tudo que eu fizesse seria com clipes grandes, realmente… É uma vontade que eu tenho.>
Então isso acaba influenciando na forma de produção, de organização dos projetos, né? Eu sempre penso junto com clipe e eu tenho dado sorte de ter encontrado pessoas que acabam captando essa essência, essa vontade que eu quero transparecer. E aí eu vou lá, dou as referências, a pessoa já vem ‘Poxa, tava pensando nisso aqui também’, e quando a gente vê, tá criando uma coisa bem bonita e bem sincronizada entre todo mundo. Então tem sido natural também esse processo comigo e com as pessoas que eu encontro para trabalhar. E eu espero conseguir fazer mais clipes. Vai vir um álbum aí, eu quero que ele seja bem bonito assim, tanto no visual quanto na produção. >
CORREIO - A sua cidade natal (Feira de Santana) te influencia musicalmente? >
Raquel Reis - Com certeza! Feira é minha casa. Eu acho que não tem como não influenciar, sabe? Mesmo que não seja algo proposital, sempre vai estar ali intrínseco em tudo que eu fizer. Vai ter essa referência, vai ter esse sotaque, sabe? E é aquilo, eu vejo Feira como a minha casa. A gente tem os nossos problemas em casa, mas continua sendo nossa casa. E a gente ama né? Então acaba influenciando todo processo, diretamente, ou não.>
CORREIO - A sua sonoridade é bem tropical, baiana, dá pra perceber os elementos do pagodão, arrocha, etc. Mas, ao mesmo tempo, é uma sonoridade muito sua.Como você se relaciona com essa mistura de gêneros sem cair em estereótipos e criando algo tão seu? >
Raquel Reis - Eu brinco muito com isso, porque o pessoal sempre me pergunta ‘qual é o meu gênero?’. E eu não saberia dizer, assim, quais são os meus gêneros, sabe? Especificar… Eu acho que tenho muito uma coisa em mim, que é tipo ‘Poxa, isso aqui eu gostei muito, eu tô muito na vibe dessa sonoridade aqui, e eu quero fazer algo assim’. E eu não quero perder isso, porque eu sinto que de acordo com o tempo que você vai tendo de mercado, você vai ficando meio saturado e aí você acaba fazendo coisas muito padronizadas ali. Você, às vezes, acaba fazendo uma coisa para agradar mais a cena, do que para agradar a si próprio e as pessoas que vão te ouvir de fato.>
Eu não quero perder essa naturalidade, essa suavidade que eu percebo, esse frescor que ainda tem na minha música. Então, é uma preocupação que eu tenho de não tentar identificar qual é o meu gênero. Aquilo ali tá batendo para mim no momento, está soando legal, tá soando verdadeiro, de acordo com as coisas que eu curto, que eu gosto de cantar e de ler, compor e tudo mais... Se tiver soando, então para mim já foi, entendeu?>
CORREIO - A sua música mais estourada é Maresia, faixa-bônus do EP Encosta, e que carrega bastante a sonoridade do arrocha. Me conta um pouquinho sobre essa música e se você esperava que ela ficasse tão famosa.>
Raquel Reis - Maresia é um caso engraçado. Porque assim, a gente vinha nesse segmento de fazer música com pitadas de gêneros que a gente escuta na Bahia desde pequeno e tudo mais. E ela vinha assim como arrochinha, mas ainda tava numa vibe mais alternativa. Não tava, de fato, um arrocha mais quebradeira, sabe? Ela foi ganhando essa moldura com o tempo, e aí a gente foi gostando. Mas eu tinha um pouco de pé atrás em relação ao lançamento dela, então tinha segurado. Não porque eu não achasse que ela não iria ter um alcance legal. Na verdade, eu achava que ela ia ter alcance muito legal, mas eu tava preocupada de para onde esse alcance poderia me levar.>
Porque ela tem essa sonoridade um pouco mais pop, conversa com mais pessoas… E eu tinha um pouco de preocupação, porque quando você lança uma coisa bem diferente, apesar de não querer ficar tachada de ter um gênero específico, minha preocupação é que quando ela saísse, ela fosse para uma caixa, porque ela é arrocha, de fato. Então fiquei com medo que as pessoas colocassem logo numa caixa de ‘ah, essa menina é cantora de arrocha’. E quando eu chegasse com a minha sonoridade mais diferente, com as coisas que eu já lancei antes, como que as pessoas que me conheceram com Maresia iriam receber isso. Mas, ao mesmo tempo, eu já tava ligando foda-se um pouquinho em relação a minha sonoridade. E eu quero cada vez mais quebrar esse padrãozinho.>
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CORREIO - O que te inspira na hora de compor? Raquel Reis - Eu sou bem aleatória. Minha cabeça é muito, extremamente, aleatória. Inclusive até para falar as coisas. Eu tô aqui conversando sobre algo com alguém, aí eu já tô em outro assunto, venho do nada com mais um assunto nada a ver… E nas minhas composições também funciona muito assim. Eu não tenho ainda uma disciplina de chegar e compor, sabe? De pensar na história minha e compor. Tanto que, as pessoas me perguntam: ‘Essa música que você fez para alguém?’. Pode ter sido, e pode não ter sido.>
É muito misturado. Eu pego muitas referências. Pode ter sido de um filme que assisti, ou de uma história minha, ou de uma história de alguém… Bem fifi. Então não tem muita a regra comigo, não. Até que, no período de composição do álbum, eu tive mais disciplina. Parei em momentos específicos, e falei assim: ‘Não, agora eu vou compor’ e conseguir tirar coisas legais dali. Mas, no geral, assim, não tenho muita regra nas inspirações. Tudo que eu escuto, tudo que eu vejo, pode me mover a vir com uma música, com uma sonoridade diferente…>
CORREIO - Você iniciou seu trabalho autoral e logo veio a pandemia, te impedindo de fazer shows. Como tem sido a experiência de agora poder finalmente ir aos palcos e encontrar com o público? >
Raquel Reis - Muito doida! Muito doida mesmo. Porque, até então, eu não tinha dimensão ainda da coisa. Eu vinha fazendo os trabalhos, as coisas saíam, a galera recebia bem na internet, e eu tinha noção de números. Mas eu não imaginei que aqueles números fossem de verdade, deles se converterem em pessoas me olhando ali na minha frente, que foram lá para me ver cantar. Isso é assustador. Eu tive essa dimensão quando fui fazer meu primeiro show em Salvador no Eco Square. Cheguei lá para tocar, tinha várias pessoas, e eu não tinha me ligado que as pessoas estavam ali porque compraram o ingresso para me ver. Eu só tive essa dimensão quando eu subi no palco e todo mundo começou a cantar comigo. Nesse momento que eu tive a dimensão de que: ‘Poxa, as pessoas realmente pagam pra ouvir isso daqui eu lancei no digital. Que maluquice!’.>
CORREIO - No início do ano você foi a representante baiana da lista de artistas para ficar de olho em 2022 criada pelo YouTube. O que a gente pode esperar de Rachel Reis para 2022? >
Raquel Reis - juízo tá apertando aqui, mas eu acho que vai sair bonito... Tá meio complicado esse ano de 2022, porque tem misturado essa agonia dos festivais e da coisa começando a tomar forma de verdade. A preparação para um projeto meu, só meu. Só eu que dou pitaco em tudo. (Risos). Que é meu álbum de estreia. E minha faculdade que eu não vou largar, eu tô no sexto semestre. Tô no EAD agora, mas não vou largar. E home-office, né? Então, assim, eu tô enlouquecendo. Já tô virada no Coringa. Mas tá funcionando. Tá sendo uma correria legal de estar vivendo. É uma correria, um aperto de mente que eu tô gostando de passar. Não tô prometendo nada mas vai aí mais de Raquel Reis para quem já não aguenta mais escutar o EP e Maresia. (Risos).>
CORREIO - Seu primeiro álbum está em gestação, né? As parcerias serão mantidas? O que a gente pode esperar dele? >
Raquel Reis - Tá parindo, tá nascendo… (Risos). Assim, 80% das músicas a gente já tem a base das produções… Tem uma coisa que eu não vou contar de jeito nenhum, mas é que eu sou boca de caçola. Eu tô doida pra contar pra todo mundo. (Risos). E eu acho que as pessoas que curtem meu trabalho vão gostar. Vai ter clipe, né? Tem que ter. Eu tô nessa correria para entregar o melhor material possível dentro das minhas condições. Ainda sou uma artista independente, que tá caminhando… Ainda bem, graças a Deus, sempre tenho muita sorte de me conectar com pessoas que acreditam muito e querem colar junto comigo, sabe? Eu não tenho dimensão de para onde que ele vai, e o quê que ele vai conquistar. Mas eu sinto que vai ser o pontapé para me inserir no mercado da melhor forma, eu, possível. O álbum está sendo produzido por Barro e por Guilherme Assis, que também é um dos produtores de Sossego e Ventilador.>
*Com supervisão do chefe de reportagem Jorge Gauthier>