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Geraldo Bastos
Publicado em 13 de novembro de 2019 às 09:05
- Atualizado há 2 anos
Os jornais brasileiros e a liberdade de imprensa conquistaram uma importante vitória terça-feira (12): uma comissão de deputados e senadores rejeitou a Medida Provisória 892/2019 assinada pelo presidente Jair Bolsonaro que acaba com a obrigação de empresas publicarem seus balanços financeiros em jornais impressos. O relatório da senadora Soraya Thronicke (PSL-MS) foi derrotado por ampla maioria dos votos - 13 a 5. Na sequência, a comissão mista aprovou o parecer da senadora Rose de Freitas (Podemos-ES) pela inconstitucionalidade e pela rejeição da matéria.>
De acordo com o regimento interno do Congresso, mesmo com a rejeição do parecer da senadora Soraya, a MP segue para exame nos plenários da Câmara e do Senado. De toda forma, se a medida provisória não for votada nos plenários das duas casas até o dia 3 de dezembro, ela deixa de vigorar. A MP foi assinada por Bolsonaro, em agosto, em meio às críticas do presidente à cobertura jornalística de seu governo. Foto: Reprodução A decisão da comissão mista foi comemorada pela Associação Nacional dos Jornais (ANJ), empresários, sindicatos e pela Ordem dos Advogados do Brasil. “A comissão especial demonstrou claramente sua rejeição a uma tentativa de uso do cargo presidencial para retaliar os jornais por sua cobertura. É mais uma demonstração do compromisso dos parlamentares com a liberdade de imprensa e a defesa da Constituição”, destacou Marcelo Rech, presidente da ANJ.>
Em pronunciamento no Senado, em agosto passado, durante sessão solene para comemorar os 40 anos da ANJ, Marcelo Rech afirmou que o Brasil, aos olhos internacionais, “começa a ingressar no rol de países que usam instrumentos oficiais para retalhar veículos e intimidar a imprensa” com a edição da medida provisória.>
Força da imprensa O presidente da OAB-BA, Fabrício Castro, lembrou que ao anunciar a medida provisória que dispensa publicações empresariais obrigatórias em jornais, a própria presidência falou em retribuição a ataques que teria sofrido da imprensa.>
“A MP vai contra o princípio da transparência e foi uma retaliação à cobertura que a imprensa vem fazendo do governo federal visando estrangular financeiramente os jornais do país”, diz. “A OAB da Bahia, como defensora da democracia, do Estado democrático de direito e da liberdade de imprensa, comemora a rejeição da MP na comissão mista e espera que a votação na Câmara dos Deputados, e depois no Senado, preserve a força da imprensa nacional e seu papel fiscalizador das ações dos governos e dos poderosos”.>
O presidente do Conselho de Administração da Rede Bahia, Antonio Carlos Júnior, disse que a rejeição da MP na comissão é uma confirmação de que a “liberdade de imprensa é fundamental”. Ele lembrou que, em abril, o próprio presidente tinha sancionado a Lei 13.818, que prevê que a partir de 1º de janeiro de 2022 os balanços das empresas com ações negociadas em bolsa devem ser publicados de modo resumido em veículos de imprensa na localidade sede da companhia e na sua integralidade nas versões digitais dos mesmos jornais. >
“Isto daria tempo para que os jornais de todo o país se adaptassem a uma nova realidade. Só que na sequência, logo em agosto, veio a MP 892 que é uma afronta à liberdade de imprensa", afirmou. >
O presidente do Sindicato dos Jornalistas da Bahia (Sinjorba), Moacy Neves, disse que a rejeição da MP é uma grande vitória não apenas dos veículos de comunicação mas de toda a sociedade brasileira. “Jornais são instrumentos de defesa dos interesses da sociedade. Se eles cumprem ou não esse papel é um outro debate. A imprensa livre, com condição de financiamento, que possa exercer o seu papel de mediador de informações entre o poder público e a sociedade, é fundamental para o fortalecimento da democracia”, diz. O vice-presidente da Associação Bahiana de Imprensa (ABI), Ernesto Marques, diz que a publicação de balanço e editais em jornais impressos deve ser rediscutido. “Mas é evidente que neste caso específico a intenção do governo não é modernizar a legislação e sim retaliar os veículos impressos", afirmou. "Nestes termos, não há dúvidas no acerto da comissão em derrubar a medida provisória, que ameaçava a democracia e a atividade da imprensa em todo o país”, assinalou. >
MP 892 A MP 892 prevê que empresas de sociedades anônimas abertas ou fechadas divulguem seus balanços e demais documentos de publicação obrigatória apenas nos sites da Comissão de Valores Mobiliários (CMV). A MP foi assinada por Bolsonaro, em agosto passado, em meio às críticas do presidente à cobertura jornalística de seu governo. Na época, Bolsonaro disse que a decisão de disponibilizar o Diário Oficial da União para que as empresas publiquem seus balanços anuais a custo zero é uma “retribuição” à forma como foi tratado pela imprensa durante a campanha eleitoral.>
“Quando o presidente se pronunciou dizendo que esse era um instrumento que poderia amanhã esvaziar a imprensa, isso é um demérito para essa matéria”, ressaltou Rose de Freitas. Para ela, a publicação de balanços apenas na internet “pode também abrir espaço para fraudes” seja por falhas técnicas nos sistemas de certificação digital, seja porque a MP autoriza a CVM a dispensar a autorização da certificação digital por ato normatico da comissão.>
Governo federal reduz publicidade na Globo Relatório do Tribunal de Contas da União (TCU) indica que o governo do presidente Jair Bolsonaro destinou maiores percentuais de verbas publicitárias para a Record e o SBT –emissoras que não são líderes em audiência, mas que são consideradas aliadas ao Planalto– em comparação à TV Globo. A informação foi divulgada ontem pelo jornal Folha de S.Paulo.>
O TCU compilou os dados a partir de informações da Secom (Secretaria de Comunicação Social da Presidência da República) sobre os valores pagos, via agências de publicidade, para as três emissoras. Embora seja a mais assistida do país, a Globo tem agora participação no bolo bem menor que a das duas concorrentes, o que não se verificava no passado, segundo o tribunal >
Os dados indicaram uma inversão de tendência. Até o ano passado, a Globo recebia valores mais próximos do seu share, ou seja, da participação em audiência no total de emissoras ligadas.>
Em 2017, ficou com 48,5% dos recursos e, em 2018, 39,1%. Neste ano, com base em dados parciais, a fatia despencou para 16,3%. Os percentuais da Record foram de 26,6% em 2017, 31,1% em 2018 e, agora, 42,6%; os do SBT, 24,8%, 29,6% e 41%, respectivamente. No relatório, concluído em 31 de outubro, os técnicos do TCU dizem ser necessário aferir se a “mudança de comportamento” do governo esteve amparada em critérios “objetivos e isonômicos”.>
A publicidade no governo federal é disciplinada por uma instrução normativa do ano passado, que prevê a audiência como um critério para a compra de mídia, mas não o único. Também são levadas em conta outras características das emissoras, como o seu perfil e alcance no país, além dos segmentos da população que atingem.>
Normalmente, as agências se baseiam em dados da Kantar Ibope para definir o rateio. Segundo dados do instituto, entre janeiro e outubro deste ano a Globo tem 33,1% do público da TV, contra 14,5% do SBT e 13,1% da Record. Os dados se referem às 15 principais regiões metropolitanas. >
Em oito campanhas dos dois últimos anos, a Globo sempre teve participação majoritária, com share entre 37% e 57%. Já as duas concorrentes variaram entre 10% e 24%.>