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Publicado em 16 de março de 2024 às 16:00
Cinco dias no SXSW, o maior festival sobre inovação e tecnologia do mundo. Dediquei minha presença aqui a acompanhar a trilha sobre Inteligência Artificial. Nestes dias, assisti mais de uma dezena de palestras e painéis sobre esse que é um dos temas mais quentes do momento, por conta da sua ramificação em vários setores da sociedade. >
Em vários momentos, percebi que as pessoas no palco falavam num tom impositivo sobre como urge que adotemos IA em nossas vidas. "Quem não aprender a usar IA ficará para trás". "A IA se desenvolve exponencialmente e em 5 anos ela será 100 mil vezes mais poderosa. Aprenda ou desapareça". "Corra! Aprenda!". "Não fique obsoleto!". "A tecnologia não substituirá o trabalho humano, mas substituirá você se não a acompanhar".>
Estas falas alimentam o FOMO (medo de ficar de fora) em quem ouve, o que não é bom num mundo ansioso como o que vivemos. Por isso, busquei não absorvê-las em natura, mas ruminar um pouco para absorver o que estava na segunda ou terceira camada das apresentações brilhantes que vi. Avaliando-as melhor, cheguei à conclusão contrária à propagada diretamente nas palestras: na verdade, é a IA quem precisa desesperadamente cativar os humanos. E os motivos para isso são vários.>
Primeiro, destaco a fala da professora da Universidade de Boston, Joan Donovan. Ela, que é pesqusiadora do tema e acostumada a dissecar como os modelos de IA são desenvolvidos e aprimorados, disse que a Inteligência Aritificial precisa analisar milhares de textos, vídeos, fotos, audios... criados por humanos. Você não pode treinar uma IA com conteúdo criado por outra IA. A tecnologia precisa ser alimentada pela criação humana, e quanto conteúdo mais (dados) melhor.>
Segundo ponto que trago esteve na fala de Ian Beacraft, um dos principais palestrantes da edição deste ano. Ele falou que é preciso treinar os trabalhadores para usar as ferramentas com Inteligência Artificial para que elas gerem impacto na sociedade. O nome dado a isso é "AI literacy", que pode ser traduzido como letramento em IA. As pessoas precisam saber como usar a Inteligência Artificial porque, bem, são as pessoas que trazem as possibilidades da IA para a realidade. Sem pessoas usando as ferramentas, as funcionalidades da tecnologia são apenas sonhos.>
Por fim, detalho as palavras de Peter Deng, o chefe do Chatgpt, ferramenta de IA mais popular do mundo. Ao ser perguntado sobre em quais áreas a Inteligência Artificial estaria mais madura para gerar impacto hoje, ele exemplificou possíveis casos de uso nas áreas jurídicas e médicas. Estas são áreas extremamente regulamentadas, e para que a tecnologia seja adotada por elas será preciso que os profissionais e ldieranças dessa área definam se e como isso será possível. No Brasil, por exemplo, já houve decisão judicial invalidando petição feita com uso de ferramenta de Inteligência Artificial.>
Não é a IA que vai nos atropelar se ficarmos parados. Somos nós que vamos direcionar a IA e abrir espaço para que ela possa se tornar uma realidade, seja criando os insumos que aperfeiçoará a tecnologia, seja adotando-as no mercado de trabalho e seja definindo as regras e leis que tornarão possíveis usar Inteligência Artificial nas diferentes atividades. Nesta semana, por exemplo, a União Európeia aprovou uma primeira regulamentação sobre o tema no mundo. Dentro do que nós humanos devemos pensar estão as políticas sociais para cuidar de quem, eventualmente, sofrerá impactos negativos com a adoção da IA. Singapura, por exemplo, aprovou um programa de capacitação no tema para pessoas mairoes de 40 anos.>
Devemos ter em mente que a tecnologia não é onipotente. O protagonismo da evolução tecnológica é do ser humano. A tecnologia fará o que nós permitirmos.>
Lucas Reis é CEO da @zygon.digital e PHD em Comunicação >