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Publicado em 10 de setembro de 2025 às 12:24
A violência contra a mulher é o grande marcador de desigualdade do nosso tempo, inclusive na advocacia: 80,6% das advogadas brasileiras já sofreram violência de gênero durante o exercício profissional em processos judiciais, segundo pesquisa do grupo Carmim Feminismo Jurídico da Universidade Federal de Alagoas (Ufal). As pesquisadoras responsáveis pelo levantamento — Soraia Mendes, Isadora Dourado e Elaine Pimentel — cunharam o termo “lawfare de gênero” para definir o uso do Direito como instrumento de opressão contra mulheres, sejam elas partes ou advogadas. Esse cenário, que envolve desde desqualificação simbólica até assédio explícito, expõe a gravidade de uma realidade que não se restringe a dissabores cotidianos, mas ameaça a dignidade profissional e a própria democracia. >
Violência contra a mulher é tema forte, e, infelizmente, cada vez mais constante nos noticiários, apesar de não ser um fenômeno recente, mas sim expressão de uma realidade histórica, enraizada em estruturas de poder que consolidaram a desigualdade entre homens e mulheres. Mais do que estatísticas ou manchetes, são histórias reais de mulheres que enfrentam agressões físicas, psicológicas e emocionais em seus lares ou relações, muitas vezes silenciadas por medo ou dependência.>
Todavia, a agressão à mulher não se limita ao âmbito íntimo: também se manifesta em esferas familiares, profissionais e sociais, revelando um padrão de desrespeito que transcende fronteiras pessoais. O patriarcado, aliado a modelos tradicionais de família, reforçou a ideia de domínio masculino e obediência feminina. Nesse reflexo, no ambiente de trabalho, a desvalorização da mulher segue presente, agora com maior visibilidade graças ao rompimento do tabu que antes mantinha as vítimas no silêncio.>
Esse modelo de submissão e domesticidade gerou marcas profundas, inclusive em profissões de prestígio, como a advocacia. A presença feminina no Direito, historicamente tardia, ainda é acompanhada por desconfiança em espaços de autoridade e decisão. Não à toa, a Ordem dos Advogados do Brasil tem criado comissões de proteção à mulher advogada e campanhas de conscientização, mas persiste o desafio da subnotificação e da resistência cultural em reconhecer a gravidade dos casos.>
Romper com a naturalização da violência exige mais do que medidas formais: é preciso coibir práticas discriminatórias e promover uma advocacia inclusiva, livre de assédio, violência simbólica ou agressões físicas. O enfrentamento desse problema não é apenas questão de proteção individual, mas compromisso ético e institucional com uma sociedade mais justa e igualitária. A igualdade real só será alcançada quando as mulheres puderem exercer plenamente a advocacia — e qualquer profissão — sem o peso de violências ou preconceitos.>
Michelle Allan é advogada, gaduada em Direito pela Universidade Federal da Bahia (UFba) e possui especialização em Direito Processual Civil pela Faculdade Baiana de Direito.>