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Miro Palma
Publicado em 29 de novembro de 2017 às 05:14
- Atualizado há 2 anos
Quis o destino que o Bahia encontrasse a Chapecoense no dia seguinte ao que a tragédia que matou sete torcedores tricolores na Fonte Nova completou dez anos. Quis o mesmo destino que, nove anos e quatro dias depois do desastre no estádio baiano, o avião que levava a delegação do clube catarinense e profissionais da imprensa esportiva tivesse sua viagem interrompida de maneira tão cruel. O último jogo entre os dois times rememorou momentos tristes que marcaram a história do futebol.>
Em comum, as duas adversidades têm a perda de vidas que tinham como uma das paixões o esporte mais popular do mundo, o drama de famílias que, de uma hora para outra, se viram despedaçadas, desamparadas, sem rumo e, também, a falta de uma conclusão sobre a responsabilidade pelo ocorrido.>
As investigações sobre a queda do voo da LaMia, maior desastre aéreo do futebol mundial, seguem na Venezuela, Bolívia e Colômbia, além dos esforços no Brasil. Apenas uma pessoa foi presa até o momento, o diretor-geral da companhia aérea, Gustavo Vargas Gamboa. Mas novos indícios apontam para o ex-senador venezuelano Ricardo Albacete Vidal e sua filha Loredana Albacete Di Bartolomé, que seriam os verdadeiros proprietários da empresa.>
Já aqui, dez anos depois da maior tragédia dentro de um estádio de futebol no Brasil, não há nenhuma culpabilidade definida. Na esfera criminal, o então diretor geral da Sudesb, Bobô, e o então diretor de operações Nilo dos Santos Júnior foram absolvidos dos crimes de homicídio culposo, quando não há intenção de matar, e lesão corporal de natureza culposa. Na esfera civil, ações públicas e individuais seguem esperando julgamento.>
Infelizmente, nos dois casos, existem cenários que prejudicam muito o andamento de investigações e a conclusão da Justiça. O drama da Chapecoense lida com países que têm sistemas precários de investigação e com fatos que mexem com troca de influências entre agentes de governos e de entidades poderosas. A catástrofe baiana, por sua vez, além de envolver diretamente a negligência de um órgão público, atingiu pessoas de origem pobre, com poucos recursos para lutar por justiça. >
Apesar dessas tristes semelhanças, uma coisa importante chama atenção quando observamos as duas histórias: as repercussões das tragédias são completamente diferentes. Logo que foi noticiada a queda do avião da Chapecoense, a comoção coletiva foi imediata. Para além das homenagens feitas por diversos times, o clube fez e segue realizando tributos às vítimas. A imprensa continua vigilante aos passos da investigação e mantém como pauta constante o desenrolar do caso com os sobreviventes e familiares.>
Já as vítimas baianas não tiveram a mesma sorte. As únicas homenagens foram os minutos de silêncio na reinauguração da Fonte Nova, em 2013, e no último jogo diante da Chape, no último domingo. Nesse dia, o Bahia ofereceu a dois sobreviventes da queda um ingresso para assistir à partida de um camarote - somente um deles aceitou - e uma camisa do clube. A data do desastre pouco é lembrada na imprensa, com um pouco mais de espaço em datas redondas, como é o caso desses dez anos. Além disso, a impunidade impera. Será que as sete pessoas que morreram por terem ido torcer pelo seu time mereciam apenas dois minutos de silêncio? Homenagens não apagam a dor, mas a tornam um pouco mais suportável. Nem com esse acalento, as famílias das vítimas baianas puderam contar. >
Miro Palma é subeditor de Esporte e escreve às quartas-feiras>