A festa de Santo Antônio da Barra

A festa não tem data de origem comprovada; sabemos que já era realizada em 1847 e que a romaria dos pescadores era um dos eventos dos festejos

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  • Nelson Cadena

Publicado em 6 de junho de 2024 às 05:00

Santo Antônio foi o mais versátil dos santos cultuados na Bahia. Os baianos o entronizaram no imaginário devocional, de um lado, como santo protetor dos marujos e pescadores; do outro lado, dos traficantes de escravos. Essa duplicidade funcional do culto é que fez da Festa de Santo Antônio da Barra, celebrada por quase um século, no balneário que se tornou bairro, uma das mais badaladas do verão baiano, seguramente a mais elitizada das três grandes festas populares da época: Nossa Senhora de Sant’Anna, no Rio Vermelho; Senhor do Bonfim, em Itapagipe; e Santo Antônio, aqui referida.

Quatro personagens despontam como seus mais ativos promotores: João Gomes de Oliveira, homenageado com o nome de uma rua no Rio Vermelho; Gustavo Américo Hasselmann; George Wilson; e Antônio de Lacerda, construtor do elevador que leva seu nome. Gustavo Américo era professor, diretor do colégio da família, Juiz de Paz e tradutor, fluente em cinco idiomas: alemão, Inglês, francês, italiano e, óbvio, português. Sua família atuava em vários segmentos comerciais, em especial prestando serviços de navegação.

João Gomes era um rico comerciante. Na sua fazenda do Rio Vermelho, costumava hospedar o Presidente da Província. Promotor, membro das comissões organizadoras, em épocas diferentes, das festas de Nossa Senhora da Conceição da Praia, Sant’Anna no Rio Vermelho, Barra e concessionário durante muitos anos do Teatro São João, onde realizava bailes de mascarados em benefício do Asilo da Mendicidade da Santa Casa de Misericórdia e outros bailes carnavalescos. João Gomes era um festeiro na veia.

George Wilson, como os Lacerda e os Hasselmann, atuava na área de navegação, os Wilson eram proprietários de navios e importavam e exportavam mercadorias. A família diversificou os negócios com ferrovias e outras atividades e ainda hoje atua na área de rebocagem e afins com a empresa Wilson Sons. Essa sua atividade, digamos naval, é que o aproximou da Festa de Santo Antônio da Barra, onde uma das atrações eram as regatas. Ele e o Lacerda (sua residência, ponto de concentração dos esportistas), foram os pioneiros, fundadores do Clube de Regatas Bahiano, em 1874.

A festa de Santo Antônio da Barra não tem data de origem comprovada (como todas as festas populares baianas, com exceção do Bonfim, que por uma conveniência social mudou a data, a antecipou uma década), sabemos que já era realizada em 1847 e que a romaria dos pescadores era um dos eventos dos festejos. Os homens do mar saiam em procissão carregando o andor do Santo e “à noite tocar-se-á um lindo fogo”, assim registrou o Correio Mercantil, no ano citado. Mais tarde, os veranistas assumiram o comando dos festejos, como em Itapagipe e no Rio Vermelho, e tornou-se festa de duas semanas, realizada no final de janeiro e inícios de fevereiro.

A exibição de Ranchos e Ternos de Reis à noite era uma das atrações. O do Arigofe com seus negros altos, esbeltos e figurino de fraque e cartola, todo ano comparecia. Exibiam-se no palanque e nas casas particulares. Serenatas e “soirées” dançantes com modinhas também alegravam os veranistas. Ainda à noite, soltavam-se balões iluminados, de hora em hora, promoviam-se quermesses e acendiam-se os fogos de planta com a animação de filarmônicas e das bandas da Polícia Militar.

As atividades diurnas consistiam em leilões, provas de natação e de remo, banhos à fantasia, baile infantil, escolha da rainha da festa, desfiles de bandas, corsos e pranchas de bondes, pau-de-sebo, corridas de sacos, quermesses.... e a romaria, repaginada no contexto, realizada no último dia do evento, com salva de tiros de canhão para saudar a passagem das canoas, jangadas, saveiros e vapores.

Nelson Cadena é publicitário e jornalista, escreve às quintas-feiras