O vexame do Brasil nas Olimpíadas de Paris

Não foi dos esforçados competidores, mas do governo, que estimulou a prática dos esportes olímpicos em 1921 e, sem a motivação da politicagem, não mais apoiou

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  • Nelson Cadena

Publicado em 25 de abril de 2024 às 05:00

Em 26 de março de 1924, o Comité Olímpico Brasileiro comunicou ao COI que, por falta de apoio do governo, o Brasil não participaria das Olimpíadas de Paris. A estratégia de pressão, mobilizando a opinião pública, funcionou. Dois meses depois, 28 de maio, a bordo do transatlântico Orania, embarcava a modesta delegação brasileira, 12 atletas apenas, os vizinhos argentinos enviaram 77, e os uruguaios, 31, após passar a cuia nas repartições federais e na Federação de Atletismo.

Repetia-se o vexame das Olimpíadas de Antuérpia (1920), quando o Senado da República autorizou de última hora o governo a liberar os 150 contos de réis para a viagem da delegação. Na terceira classe.

Paris foi um vexame maior. Em Antuérpia participaram 21 atletas, em Paris apenas 12. Em Antuérpia o tenente Guilherme Paraense conquistou o primeiro ouro olímpico da história do Brasil, na prova de tiro rápido. A equipe do exército levou mais uma prata e um bronze e 28 anos se passariam até conquistarmos outra medalha, o ouro do basquete masculino, com destaque do soteropolitano, que iniciara sua carreira no Clube Bahiano de Tênis, Nilton Pacheco. Em Paris, nenhuma medalha, a nossa melhor performance foi no remo e o sexto lugar de José Galimberti, na prova de lançamento de disco.

Vexame grande. Não dos esforçados competidores: atiradores, remadores e atletas, mas do governo, que estimulou a prática dos esportes Olímpicos em 1921, com o objetivo de fazer bonito nas competições esportivas da festa do Centenário da Independência (1922), e, passado o certame, e sem a motivação da politicagem, não mais apoiou. Foi no ano referido que aportou no Brasil o treinador norte-americano Alexandre J. Hogarty. No currículo passagens como treinador de pista e campo da Duquesne University, na Pensilvânia, e Cavaleiros de Colombo na Europa.

Para as olimpíadas de Paris Hogarty montou uma equipe promissora, revelada nas competições do centenário e provas sul-americanas; meia dúzia dos competidores não viajaram por falta de recursos, o dinheiro era curto, tão curto que os calções dos uniformes foram doados pela Casa Fuchs. As camisas, fundo branco, o globo azul da bandeira estrelado no peito, com o lema “Ordem e Progresso”, o governo bancou. Faltou dinheiro e faltou disciplina. Certa feita Hogarty, num desabafo, falou da dificuldade de impor a seus discípulos a disciplina americana de abstinência de bebidas e de cigarros e o hábito de dormir cedo.

Treinadores estrangeiros não eram novidade no país. A Marinha contratou, pela mesma época, o nadador Robert Flower, treinador da equipe de Harvard, para preparar os esportistas da corporação que competiriam nos jogos do Centenário da Independência. A ideia também era formar discípulos que dessem seguimento a seu trabalho, visando as Olimpíadas na França, mas a equipe de natação, igualmente, não viajou.

Em Paris, o Brasil disputou diversas provas de atletismo, de tiro e remo, este, com a dupla Edmundo e Carlos Castelo Branco, os gêmeos que obtiveram um honroso quarto lugar na prova de duplo skif. Mais honroso, ainda, porque viajaram com recursos próprios e se inscreveram por sua conta e risco. Paris, em 1924, foi uma festa. O mundo assistiu às façanhas do finlandês Paavo Nurmi, que conquistou cinco medalhas de ouro, duas em provas de fundo no mesmo dia, e de Johnny Weissmuller, o Tarzan das películas, que conquistou três ouros na natação e um bronze no polo aquático. Os brasileiros assistiram, meses depois, ao filme distribuído pela Cia Cinematográfica Brasileira.

Nelson Cadena é publicitário e jornalista, escreve às quintas-feiras