Seleção Baiana: Mattos, o elegante artilheiro que virou advogado

Ex-jogador do Vitória marcou o único gol do Brasil na Taça O'Higgins de 1957

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  • Da Redação

Publicado em 27 de abril de 2018 às 08:33

- Atualizado há um ano

. Crédito: Antônio Matos
Mattos (à direita) cabeceia para o chão durante confronto contra o Chile por Reprodução Estádio/Chile

Autor do único gol do Brasil e destaque da seleção nacional - que foi representada pela Seleção Baiana na disputa da Taça O'Higgins de 1957 - ao lado do goleiro Periperi e do meia armador Otoney, Mattos é hoje o bem sucedido advogado Samuel Pereira de Mattos.

Lúcido, esbanjando saúde, memória privilegiada e aparentando bem menos do que os 84 anos do registro de nascimento, além de procurador jurídico aposentado da Prefeitura de Salvador, ele ainda tem no currículo fora dos gramados uma passagem pelo Tribunal de Justiça da Bahia, como secretário da Corregedoria Geral, no início dos anos 90.

Embora se considere baiano, a maneira de falar, as vogais fechadas e o leve sotaque carioca às vezes o denunciam. “Deixei o Rio muito cedo e fui morar em São Paulo”, esclarece. Foi lá que o jovem Mattos, então com 17 anos, foi descoberto para o futebol. “O goleiro palmeirense Nascimento me viu jogando na várzea e me levou para o Parque Antarctica, onde fui bicampeão juvenil e campeão de aspirantes”.

Apontado pela tradicional Gazeta Esportiva como futuro astro do Palmeiras, depois de uma exibição primorosa no Torneio Início do Campeonato Paulista de 1952, o destino não permitiu que as previsões da mídia se confirmassem.

Adolescente, estreou entre os profissionais na posição do suspenso Liminha, numa partida pelo Paulistão, contra o Ypiranga, integrando um elenco recheado de craques – Laércio, Jair Rosa Pinto, Humberto Tozzi, Juvenal Amarijo e Waldemar Fiúme – e treinado por Aymoré Moreira. “Dos cobras, somente não participaram daquele jogo Liminha, que cedeu o lugar para mim, e Rodrigues, machucado, substituído por Elzo”, pontua Mattos.

Ingênuo e sem experiência, ele não conseguiu se livrar de uma entrada violenta de um parrudo volante ypiranguense e acabou sofrendo uma séria contusão no joelho, rompendo meniscos e ligamentos. Passou quase um ano afastado dos gramados. 

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Ídolo e campeão estadual pelo Vitória

Como não há mal que sempre dure, recuperado e já de volta ao Rio, treinando no Fluminense, Mattos foi indicado ao Vitória pelo então jogador Gago, ex-Flamengo e zagueiro de área campeão baiano pelo clube em 1953.

Desembarcou em Salvador em 1957, trazido pelo diretor Paulinho Dantas, para fazer história no futebol baiano. Em seu primeiro ano, somente alegria e sucesso: ídolo e campeão estadual pelo Vitória, compondo um ataque arrasador com Enaldo, Teotônio, Lia e Salvador.

Isto sem falar na convocação para a Seleção Baiana, que representou o país no Chile, e na presença do seu nome, em companhia de Otoney (Bahia), numa lista preliminar de jogadores brasileiros que participariam da Copa do Mundo de 1958, na Suécia, elaborada pelo técnico Vicente Feola.

“Os ventos sopravam a favor”, lembra Mattos, referindo-se ao interesse do Audax, campeão chileno de 1957, em adquirir na época o seu passe. “Contrariando os estatutos do clube, que não permitiam a presença de jogadores estrangeiros, os dirigentes chegaram até a anunciar, durante a disputa da Taça O'Higgins, a minha contratação, o que acabou não ocorrendo”.

Confirmando a fama de artilheiro, fez 16 dos 25 gols marcados pelo Vitória na primeira excursão do clube à Europa, em 1960, e que durou quatro meses. “No retorno do exterior, assinei com o Bahia, onde conquistei, em 1961, os títulos de campeão do Torneio Início, do estadual e do Norte-Nordeste do Brasil e de vice da III Taça Brasil”, declara, mesmo reconhecendo que o seu desempenho não foi tão bom como nos tempos de Vitória.

“Atuei, muitas vezes, fora de posição, como volante e ponta direita”, justifica, acrescentando ainda que, já estudante de Direito, na Universidade Católica do Salvador, passou a ter também dificuldade em conciliar os estudos com as atividades futebolísticas. “Além da Taça Brasil, o Bahia viajava muito, com longas temporadas no Norte e Nordeste do país e amistosos no interior do estado, e eu estava perdendo inúmeras aulas”.

Diversas vezes, saia às pressas, direto da faculdade para o aeroporto, ao lado do goleiro Nadinho (campeão da Taça Brasil de 1959), também acadêmico de Direito. “Houve um momento em que, já no terceiro ano, optei pelos estudos e abandonei o futebol aos 28 anos, sem sequer cumprir integralmente o contrato”, explica.

Casado há 54 anos com a advogada e administradora de empresas Vera Peixoto de Mattos, ele tem duas filhas, além de quatro netos, e continua morando em Salvador.