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Carmen Vasconcelos
Publicado em 19 de dezembro de 2022 às 06:00
Dorival Caymmi dizia que “tudo, tudo na Bahia faz a gente querer bem. A Bahia tem um jeito que nenhuma terra tem”. A máxima do velho Buda Nagô também vale para os negócios. Segundo dados da Secretaria da Fazenda do Estado da Bahia (Sefaz-BA), o número de microempreendedores individuais tem crescido no estado desde 2020. >
Os dados revelam que foram 126.737 novos empreendedores em maio de 2021 contra 103.628 em janeiro de 2020. O número de microempreendedores individuais cresceu mais 22% na capital baiana. >
Apesar desse avanço, quem se aventura no mundo dos negócios sabe que ainda são grandes as dificuldades, especialmente no que diz respeito aos tributos e linhas de crédito. O Correio ouviu alguns empreendedores que, com muita garra e coragem, se arriscaram a tirar a ideia do papel e arregaçar as mangas. Eles compartilham suas histórias e dão dicas para quem quer começar em 2023. >
Rodrigo Pinto (@quitandinhadaterra) Rodrigo Pinto sonha com um espaço para comercializar um café da manhã com produtos da agricultura familiar e aconselha a não esperar situação ideal para começar um negócio (Foto: Divulgação) Com foco na venda de produtos da agricultura familiar baiana, em maio desse ano nasceu a Quitandinha da Terra. Todos os produtos desse empório têm o selo da agricultura familiar da Bahia e os produtos são beneficiados pelas cooperativas através das agroindústrias. >
Segundo o criador Rodrigo Pinto, 37, o empreendedorismo nasceu como uma resposta à insatisfação profissional. “Busquei algo que eu poderia usar meus conhecimentos como publicitário, mas de maneira independente, seguindo um caminho mais livre das amarras do mercado e das agências de publicidade”, conta.>
Rodrigo diz que, na sua curta trajetória, é preciso vencer um leão por dia, mas que o apoio da família, amigos e parceiros comerciais são fundamentais nessa luta. “É difícil manter um preço justo com tantos aumentos de insumos, combustíveis. A falta de experiência também é um desafio e me faz questionar sobre aspectos como a participação de feiras, a manutenção de estoques, o pagamento de fornecedores”, desabafa. >
Para ele, o principal diferencial da Quitandinha é o foco nos produtos certificados da agricultura familiar baiana. “Também considero a entrega grátis como uma das formas de me diferenciar no mercado. Apesar de ser uma obrigação, o bom atendimento e a busca por ouvir os nossos clientes, também fazem parte do pacote”, destaca.>
A próxima meta é abrir um ponto físico e oferecer café da manhã com os produtos da agricultura familiar baiana. “Não sei onde e nem quando, mas Salvador e os soteropolitanos terão um maravilhoso cuscuz de milho não transgênico e um café de verdade para começar o dia”, promete.>
Para quem deseja começar, Rodrigo é categórico: “comece agora mesmo e com o que tem. Eu esperei muito para começar, esperando por um ambiente mais controlado. E isso não existe em nenhuma área”.>
Gustavo Ferreira Almeida (@guruproducoes/ @gustavoferreira) Gustavo Almeida lamenta que os empreendimentos nordestinos ainda sejam desacreditados, mas diz que a saída é ocupar os espaços vazios e investir no auto conhecimento (Foto: Divulgação) Gustavo Ferreira Almeida tem 20 anos e é natural de Conceição do Coité, cidade do interior da Bahia, localizada a 200 km de Salvador. Ele iniciou o negócio do ramo de produção audiovisual, que oferece serviços de produção de vídeo, fotografia, branding e marketing digital, em fevereiro de 2021 e batizou de O Guru. “Iniciei o meu empreendimento aos 18 anos, enquanto estudava para conseguir ingressar em uma universidade pública de Medicina. A motivação inicial foi a tentativa de transformar um hobby em negócio e conseguir traduzir minha expressão artística por meio da criação audiovisual”, lembra.>
Ele diz que sempre encarou o empreendedorismo como uma porta que só se abre para quem está realmente disposto a inovar. “Fazer o que já está sendo feito à sua volta é, sem dúvidas, mais cômodo e menos impactante. Por isso, o que torna o meu trabalho uma referência de qualidade na minha região é a inovação e a identidade da minha marca - construída e fortalecida, dia após dia, junto aos meus clientes e nas minhas estratégias”, garante.>
Para ele, o maior desafio foi conciliar as exigências da empresa com os estudos. “A organização é essencial para o gerenciamento do tempo e para que nenhuma das partes seja realizada com menor prioridade. Mesmo sendo um esforço dobrado, acredito que tive resiliência e apoio para prosseguir e continuar acreditando que era possível”, atesta.>
Gustavo acredita que os estigmas regionais ainda constituem um impasse a ser superado em âmbito nacional para a valorização de empreendimentos criados no Nordeste, na Bahia e no sertão baiano. “Somos capazes de utilizar as nossas vivências enquanto povo e a nossa realidade para fazer do empreendedorismo uma ferramenta de transformação social. É necessário ocupar espaços cada vez mais significativos e reafirmar a nossa potência para que essa voz de inovação e identidade ecoe e traga mais oportunidades aos nossos”, completa.>
Para quem está começando, ele recomenda conhecer as principais habilidades e as principais limitações. “Esse exercício de autoconhecimento é essencial para que, desde o início, você consiga garantir bons resultados e a satisfação daqueles que compram a sua ideia e apoiam o seu trabalho”, conclui.>
Jamille Rocha (@betiacrespa) Jamille Rocha (segunda da esquerda para a direita, com vestido estampado) destaca que o negócio pode surgir das necessidades pessoais, mas é preciso apostar na capacitação (Foto: Divulgação) Engenheira Química, formada pela Universidade Federal da Bahia, Jamille Rocha,33, começou a empreender de forma inesperada: diante da pandemia e da recente formatura. “Pensava o que uma recém formada iria fazer naquela situação. No mesmo período, iniciei meu processo de transição capilar, que foi um momento muito diferente para mim: me reconhecer e ao meu cabelo afro, que havia sido submetido à química desde que tinha 12 anos”, relembra. >
Na época, Jamille pesquisou muito e começou a usar todos os produtos que podia e que estavam disponíveis no mercado, mas nenhum deles alcançou a resposta desejada. “Busquei aperfeiçoamento acadêmico para entender sobre formulação, sobre o que funcionava e nessa busca eu me apaixonei pela área, me encontrei como profissional”, conta.>
Nascia assim a ‘Beti, a Crespa’, uma empresa de cosméticos,especializada em produtos capilares para onduladas, crespas e cacheadas. Atualmente, Jamille concilia a produção dos produtos e o mestrado na área de engenharia Química na UFBA, mas ao longo desses anos, fez cursos de formação na área de cosméticos, dentre eles para cosméticos capilares, veganos, orgânicos e naturais, além de pós-graduação em cosméticos.>
A empresária é enfática ao garantir que ‘Beti, a Crespa’ é uma empresa que se especializou no que faz! “Nós trabalhamos com a biocompatibilidade e afinidade com ativos naturais, afinal cada cabelo é único e precisa ser entendido. Cada cliente tem uma resposta em relação a um tratamento e, para isso, temos uma linha completa com três higienizadores, três tratamentos e oito finalizadores para a cliente escolher qual se adapta às necessidades do próprio fio. Como empreendedora, ela reconhece que os desafios são diários. >
“O que me faz superar todos os desafios é ter a certeza que escolhi a área que me faz acordar motivada todos os dias, eu gosto muito do que eu faço e isso é sensacional! Tenho sorte de contar com pessoas que me apoiam. O meu maior desafio no momento é conquistar as pessoas e mostrar o trabalho da Beti a Crespa, que é um trabalho sério, feito com responsabilidade e muito amor”, diz. >
Para o próximo ano, Jamille quer ampliar a visibilidade da marca e gerar ainda mais empregos e renda. “Se pudesse deixar uma mensagem para quem, assim como eu, quer ter o próprio negócio é: seja bom no que faz, isso será um diferencial, busque cursos, informações para seu negócio, tudo que possa agregar mais valor! E o melhor faça o que gosta se motive todos os dias! Porque uma hora o resultado vem, eu acredito”, finaliza. >
Anderson Mário Freitas (@profandersonfreitas) Anderson Freitas apostou nas ações afirmativas para estreitar laços com o público e tornou a panificadora centenária um local de cultura e encontros (Foto: Acervo pessoal) Há nove meses, Lili Alcantara e Anderson Mário Freitas,46, assumiram a gestão da Panificadora Santo Antônio, uma tradicional padaria de bairro, que fica localizada no Santo Antônio Além do Carmo, que existe a quase 100 anos.>
O empreendedorismo não era novidade para Anderson que, desde muito novo já tinha o desejo de ter o próprio negócio e havia tido experiência com academia e loja online, além de estar desenvolvendo uma startup no segmento tecnológico e atuando com o empreendedorismo social. “A responsabilidade em empreender é muito grande, não é somente o ‘ganhar dinheiro’, mas também conseguir lidar com relacionamentos...com o público, funcionários e fornecedores. É um processo de aprendizagem que você precisa se permitir experiências todos os dias”, diz. >
Desde que começaram, os sócios ampliaram a atuação do negócio, promovendo uma série de ações afirmativas, a exemplo de mostra literária, bate papo sobre Gordofobia, Racismo estrutural, entre outros, numa perspectiva de desenvolver mensagens de cidadania e unificação de ideias com o público. >
“Empreender é um desafio diário, e não podia ser diferente. Dentre tantos, atribuo lidar com processos de Inovação. Nós não temos a cultura da Inovação, ainda estamos em uma condição de desenvolvimento nesse quesito. Precisamos superar essa deficiência com investimentos não só do poder público, através de políticas públicas especificas, mas também com a boa vontade dos empresários”, afirma. >
Para Anderson, nesse processo, o principal entrave ainda é a questão tributária. “Lidamos com altos encargos financeiros no Brasil, o que acaba por inviabilizar o desenvolvimento de novos negócios”, pontua. Apesar disso, o empresário diz estar esperançoso e num momento de afirmação e consolidação do negócio. “Para 2023, a principal meta é de buscar um crescimento de forma saudável e consistente”, defende.>
Para quem deseja começar, ele sugere que se estude o tipo de negócio que pretende empreender. “A desinformação é um grande aliado ao fracasso. É preponderante que se tenha conhecimento dos processos de gestão inerentes ao modelo de negócio que será implantado. O aprendizado é uma condição continua, a busca pela especialização precisa ser constante”, destaca. Anderson lembra que é preciso ter a clareza que, no próprio negócio, o empreendedor irá trabalhar mais do que qualquer um. “Empreender é estar disponível ao seu negócio a qualquer tempo, por isso é fundamental, definir objetivos e metas, além de criar estratégias para alcançá-los.>
Tarcila Assis (@umboloeumaprosa / @buffettarcilavasconcelos) Tarcila Assis travou na primeira experiência, mas defende que para empreender é preciso coragem e resiliência. Em 2023, ela quer ampliar as atividades no Cantinho da Prosa (Foto: Acervo pessoal) Um ano antes da pandemia, a empreendedora Tarcila Vasconcelos de Assis, 38 anos, abriu uma confeitaria chamada Um Bolo e uma Prosa para agregar novos serviços para o Buffet batizado com o nome. Formada em Gastronomia, os dois negócios foram uma resposta para uma atuação profissional mais autoral, depois de ter trabalhado em restaurantes em Salvador e Praia do Forte. >
“Sempre pensei em ter meu próprio negócio, mas precisava passar pela experiência dos restaurantes. Feito isso, resolvi sair e abrir meu próprio negócio. Passei por alguns desafios, errei e hoje, estou tentando acertar. Meu negócio está na mesma linha de vários outros. Porém, acredito que a produção dos pratos é realizada de modo a colocar profundas porções de amor e sabor, possibilitando que o resultado tenha um quê de acolhimento, encanto e sabor”, afirma.>
Para ela, o maior desafio foi abrir o próprio espaço. “No passado, havia começado um pequeno restaurante. Na época, precisei superar muito medo e pressão, a ponto de viver um grande apagão. Superei com muita dificuldade e hoje tenho essa experiência que possibilita sonhar com a manutenção do Cantinho da Prosa. Um local que tem estilo bistrô, dentro de uma casa, com um quintal no fundo, localizado no centro de Salvador, onde será servido comidinhas voltada para a cultura nordestina. Essa será minha meta para 2023, colocar esse projeto para frente”, pontua.>
Tarcila acredita que a cultura empreendedora baiana bebe na ancestralidade e na história, mas carece de educação formal através de cursos, palestras, seminários voltados para o tema. “Tem muitos empresários que ainda não conseguem acessar essas oportunidades e precisam de visibilidade, aliado a isso, o crédito ainda é muito difícil”, desabafa.>
Para quem quer começar, a chefe de cozinha orienta a não desistir, mesmo com as dificuldades que surjam. “ Não é fácil, é abrir mão de muita coisa para consegui o objetivo, a vontade é de desistir, ainda mais no nosso País. É focar, estudar, planejar e acreditar que vai dar certo. Mesmo que tudo leve a acreditar que você não é capaz. Não desanimar no primeiro problema”, afirma.>