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Donaldson Gomes
Publicado em 8 de outubro de 2024 às 05:00
Não se deve esperar muita coisa da oposição na Câmara dos Vereadores de Salvador a partir do próximo ano. A bancada minguou. Quem diria que depois de dar as cartas na casa legislativa por anos – boa parte deste período como um fiel vereador governista –, o vice-governador Geraldo Junior (MDB), que desde 2022 aderiu à base do governo estadual, seria o responsável por praticamente implodir a oposição municipal? Como adversário de Bruno Reis (UB), reeleito no último domingo, Geraldo facilitou mais a vida do prefeito no último domingo do que quando era aliado. >
Quando se imagina a formação da oposição apenas com partidos que sistematicamente se posicionam contra as pautas do prefeito, a bancada ganhou força com o Psol, que contava com apenas uma parlamentar e agora passa a contar com dois. Por outro lado, o PT, tradicionalmente o principal partido oposicionista na capital baiana, amargou a perda de 75% dos seus espaços, passando a contar com apenas uma das quatro vagas conquistadas em 2020. O desempenho pífio de Geraldo na disputa, mesmo tentando colar em Lula, refletiu-se na bancada. >
Deste tamanho, vai ser muito difícil encontrar espaços relevantes na agenda do parlamento, ou trazer algum tipo de dificuldade para Bruno Reis.>
O que não se pode deixar de registrar é o trabalho hercúleo que os candidatos dos partidos aliados de Geraldo tiveram. Boa parte optou por aparecer sozinha nos santinhos, ou apelou para os padrinhos do emedebista – Lula, Jerônimo, Wagner e Rui. Geraldo mesmo foi visto poucas vezes. Do outro lado, Jorge Araújo (PP), vereador mais bem votado, usou e abusou da imagem de Bruno Reis e do ex-prefeito ACM Neto. Carlos Muniz (PSDB), segundo mais votado e atual presidente da Câmara, foi na mesma linha. >
Com as pesquisas indicando uma vitória fácil do prefeito desde o início, quem pôde desfilar ao lado dele, aproveitou. Quem não pôde, escondeu o candidato a prefeito. >
Na oposição, só o Psol, impulsionado pela votação de Kleber Rosa, cresceu – tinha uma vaga e agora terá duas. O MDB de Geraldo foi incapaz de aproveitar o espaço na cabeça de chapa da majoritária e ficou agora com metade das vagas conquistadas há quatro anos, quando era da base do prefeito. O PCdoB (duas vagas), PV (uma vaga), PSD (uma vaga), PSB (uma vaga) e Pode (duas vagas) continuaram do mesmo tamanho. Já o Solidariedade e o Avante tinham uma cadeira cada há quatro anos e saem da eleição sem nenhuma. O Agir, antigo PTC, não tinha nada antes e continua do mesmo jeito. >
Este ano, os dez partidos que apoiaram a candidatura do vice-governador, contando com o seu MDB, conseguiram eleger apenas nove parlamentares. Há quatro anos, estes partidos saíram das urnas com 15 vereadores eleitos em Salvador, o que representa uma redução de 66% em suas bancadas. Quando se consideram apenas os sete parlamentares dos tradicionais partidos de oposição – PT, PCdoB, Psol e PV –, a bancada representa apenas 16% das 43 cadeiras. E mesmo que todos os nove parlamentares eleitos na coligação de Geraldo, somados aos dois do Psol, decidam se posicionar contra o Executivo, ainda assim, chega-se a 20% do total. >
Com sete ou com 11 (todos os nove da coligação, mais os dois do Psol), o grupo segue distante dos números necessários para conseguir fazer algum barulho na Câmara que seja capaz de trazer incômodo para Bruno Reis, no Thomé de Souza, do outro lado da rua. Para se tornarem capazes de impedir a votação de matérias mais complexas, os oposicionistas de Salvador ainda precisariam de mais oito integrantes, levando-se em conta o histórico partidário, ou de quatro integrantes, se todos os eleitos na coligação liderada pelo MDB e o PT, mais os dois do Psol, votassem contra os interesses da administração municipal. Seriam necessárias essas 15 assinaturas para a instalação de uma comissão parlamentar de inquérito, por exemplo. >
A votação de um eventual parecer pela reprovação das contas do município, por outro lado, demandaria a adesão de 29 parlamentares, ou mais 20 votos além daqueles que a oposição vai dispor a partir de 1º de janeiro. Mesmo para obstruir votações que considerar contrárias aos seus interesses o bloco da minoria deverá enfrentar enormes dificuldades. >
A obstrução legislativa, umas das atuações mais comuns dos blocos minoritários, acontece nas situações em que a oposição discorda fortemente de uma proposta ou política e utiliza artifícios para retardar ou mesmo evitar a votação do assunto. Entre as principais “táticas” usadas estão a verificação de quórum, quando algum dos vereadores pede que o presidente da sessão contabilize quantos parlamentares estão presentes. A depender do assunto, podem ser necessárias metade das presenças, enquanto em outras pode ser preciso contar com dois terços. É fácil perceber que o grupo que apoia o prefeito terá facilidade para conseguir o número mínimo, ou para esvaziar o plenário, quando bem entender. >
Uma estratégia bastante comum para obstruir é aquela em que os parlamentares se revezam em discursos, para ganhar tempo. Acontece que serão apenas sete, ou, na melhor das hipóteses, 11 vozes. Vale a pena ponderar que alguns dos nomes eleitos em partidos da coligação oposicionista têm proximidade com a base governista, o que coloca em xeque estes números. >
Historicamente, os blocos oposicionistas cumprem um papel central nos debates democráticos. Cabe a eles o papel de fiscalizar o Executivo, trazer outros olhares para os debates de políticas públicas e dar voz a minorias, além de propor ações alternativas. A verdade é que quando a oposição é bem feita, ela é capaz de ajudar o governo, seja ele qual for, a melhorar. O problema é que o trabalho que se coloca diante de uma oposição minúscula é gigantesco.>