Acesse sua conta
Ainda não é assinante?
Ao continuar, você concorda com a nossa Política de Privacidade
ou
Entre com o Google
Alterar senha
Preencha os campos abaixo, e clique em "Confirma alteração" para confirmar a mudança.
Recuperar senha
Preencha o campo abaixo com seu email.

Já tem uma conta? Entre
Alterar senha
Preencha os campos abaixo, e clique em "Confirma alteração" para confirmar a mudança.
Dados não encontrados!
Você ainda não é nosso assinante!
Mas é facil resolver isso, clique abaixo e veja como fazer parte da comunidade Correio *
ASSINE

Segunda autópsia de Juliana Marins e investigação podem explicar o mais importante

Por que caiu? Até aqui, imagens, reportagens e depoimentos estão repletos de estranhezas, contradições explícitas e perguntas a serem respondidas

  • Foto do(a) author(a) Flavia Azevedo
  • Flavia Azevedo

Publicado em 30 de junho de 2025 às 21:24

Juliana Marins
Juliana Marins Crédito: Reprodução

Eu também torci muito pelo resgate de Juliana e entristeci com o desfecho. Agora, com o corpo a caminho do Brasil, a família quer justiça. A precariedade naquela ilha da Indonésia é generalizada e inclui a escassez de recursos para resgates. Pra mim, está parcialmente explicada a demora do socorro e a tragédia resultante disso. Terrível, mas não sei se o adjetivo “criminoso” se aplica a não ser que, sobre a queda, exista algo a esconder. O que a segunda autópsia no corpo e uma investigação minuciosa podem nos dizer é o real motivo pelo qual ela caiu. Esse é o ponto. Imagens, reportagens e depoimentos estão repletos de estranhezas, contradições explícitas e perguntas a serem respondidas. Quer ver? Segue uma lista.

SOBRE O AGASALHO - Na primeira imagem do acidente, gravada por drone, Juliana veste apenas tênis, camiseta, calça jeans e luvas de frio. Ela caiu da trilha por volta das 4h da manhã e nada explica que estivesse sem agasalho, nesse momento, num lugar conhecido pelas temperaturas baixíssimas. Uma das pessoas que caminhavam no grupo confirmou, em entrevista para a TV Globo, que estava muito frio. Assisti a vários vídeos de outros trilheiros, fazendo o mesmo percurso, no mesmo horário e todos estão bem vestidos. Horas antes, ela havia postado um vídeo onde aparece com um casaco cinza. Não há cenário em que faça sentido ela ter escolhido ficar apenas de camiseta, ainda durante a madrugada, com tudo escuro e gelado na trilha. O agasalho também não foi encontrado na mochila, nem em qualquer outro lugar.

SOBRE A MOCHILA – Essa que andaram divulgando com um broche escrito “ele não” NÃO é a mochila com a qual Juliana estava viajando. A imagem foi maldosamente retirada de um post antigo, no perfil do Instagram. A que Juliana levou para o Monte Rinjani não tinha broche nenhum e foi encontrada na trilha, durante o resgate. Outra estranheza: se você já fez qualquer caminhada maior, sabe que, nessas circunstâncias, ninguém se afasta da própria mochila. Mesmo a hipótese de ela ter retirado pra descansar, não faz muito sentido. Uma mochila bem arrumada e ajustada ao corpo ajuda, quase como um recosto, numa parada breve.

SOBRE O CELULAR – Nas primeiras imagens, podemos ver que, quando caiu, Juliana também usava uma pochete. Todos nós sabemos que celulares ficam em lugares de fácil acesso, então o dela deveria estar na pochete. Porém, não há notícias do celular de Juliana.

(Por lógica, portanto, se estava apenas descansando e caiu por acidente, Juliana deveria ter sido encontrada agasalhada, com a mochila e com o celular. Pelo menos nas primeiras imagens, quando da primeira queda, depois da qual ela estava viva, movimentando braços e pernas.)

ELA FICOU COM O GUIA – Duas das pessoas que estavam caminhando no mesmo grupo, ainda em entrevista para a TV Globo, disseram que Juliana, no momento do acidente, estava na retaguarda do grupo, acompanhada pelo guia. Nenhuma delas fala nada sobre o resgate, ainda que tenham – necessariamente – passado pelo local da queda no retorno do vulcão. Ninguém ficou? Ninguém voltou? Ninguém tem nada a dizer? Ninguém viu nada?

O GUIA SE AFASTOU PRA FUMAR – Em entrevista ao Fantástico, o pai de Juliana, Manoel Marins, disse que o guia relatou ter se afastado dela “pra fumar” e que, nesse momento, ela teria caído. Concidentemente, assisti a um story do @kiki_por_ai (ele também esteve envolvido no mutirão pelo resgate de Juliana) que, hospedado na Indonésia, mostrava como as pessoas eram liberadas para fumar nas áreas comuns e nos quartos do hotel onde estava. O voluntário que resgatou o corpo de Juliana aparece fumando o tempo inteiro em fotos e vídeos, perto de várias pessoas. Ou seja, não parece haver qualquer etiqueta para fumantes, na região. Agora, corta para a cena de Juliana com o guia, em plena madrugada, no meio do nada, ao ar livre. Não é curioso que esse homem tenha se afastado pra fumar um cigarro?

ELA FICOU DESESPERADA – Não sei de onde veio a informação repetida na imprensa de que Juliana, quando sozinha, teria ficado “desesperada por não saber por onde deveria seguir”. Quem viu esse “desespero”? Se alguém viu, ela não estava sozinha. Se ninguém viu, quem supôs o “desespero”? Repare: se o guia a deixou pra trás, fez errado, mas Juliana era uma trilheira experiente e sabia que, em condições normais, deveria esperar o cara voltar. Descansando, já que estava exausta. Para a possibilidade de o guia não voltar, ela também sabia que a trilha é MUITO movimentada (lotada mesmo, em muitas imagens), que outro grupo passaria em breve e, principalmente, que já estava prestes a amanhecer. Quer dizer que, inevitavelmente, ela teria companhia em breve. De todo modo, mesmo que decidisse continuar caminhando sozinha, não precisava ser na escuridão total.

A TRILHA NÃO É ESTREITA NAQUELE PONTO - Todo mundo viu as imagens do grupo de espanhóis que filmaram Juliana, já caída, com um drone. Por mais que a trilha seja difícil (e é!), naquele ponto ela é bastante larga. Também causa estranheza que, justamente naquele ponto, tenha ocorrido a queda.

(Observe que o guia disse que deixou Juliana descansando e seguiu com o grupo, mas depois afirmou que só se afastou pra fumar.)

O PRIMEIRO VÍDEO – O fantástico exibiu “primeiras imagens gravadas depois da queda de Juliana” nas quais aparece apenas a luz da lanterna dela, na escuridão total. De acordo com o pai de Juliana, a queda aconteceu aproximadamente às 4h, porém, as imagens foram gravadas por volta das 6h08, quando o guia fez o registro e enviou ao chefe dele. No vídeo, o guia diz: “ela caiu em um penhasco”. Acontece que, em junho, no Monte Rinjani, o nascer do sol ocorre por volta das 6h da manhã. Por mais nublado que estivesse,  seria 100% escuro, como aparece nas imagens?

Fico com muitas perguntas. Qual é o relacionamento cultural da comunidade com o vulcão? Por que autoridades da Indonésia mentiram que estavam fornecendo alimentos e agasalho pra Juliana depois da queda?  Juliana caiu porque precisou correr, por algum motivo? Juliana foi empurrada? Juliana teve "mal da montanha" e, por isso, agiu de forma inapropriada para a situação? Juliana foi dopada? Juliana estava sozinha quando caiu? Juliana estava com o guia quando caiu? Havia alguém mais nesse cenário? Por que as outras pessoas que caminhavam com Juliana não tiveram sequer a curiosidade de acompanhar a primeira tentativa de resgate? Quando foram avisadas de que Juliana havia caído, não pensaram em voltar, observar, falar com Juliana que ainda podia ser vista viva e acordada? 

Sim, eu sei. Muita gente cai daquele monte. Sim, eu sei, a trilha é difícil. Sim, eu sei, o serviço de guia é terrível. De todo modo, nem por isso devemos deixar de observar todos esses pontos e outras características específicas desse caso. Não podemos esquecer que Juliana era uma mulher viajando sozinha e também perguntar: qual é o relacionamento cultural daquela comunidade com mulheres? Homens e mulheres estão sujeitos a acidentes, mas há “acidentes” que só acontecem com mulheres. Investigar, interrogar, entender a cronologia dos fatos, perguntar ao corpo de Juliana “o que aconteceu?”. Tudo isso é doloroso, trabalhoso e caro. Mas, se a família estiver disposta, é importante ir até o fim. Pela memória de Juliana, em primeiro lugar. Pela família que merece justiça e respostas. Por fim, por todas nós que temos direto a vida plena e a todas as aventuras que, em qualquer lugar do planeta, quisermos experimentar.

Siga no Instagram: @flaviaazevedoalmeida