Cadastre-se e receba grátis as principais notícias do Correio.
Moyses Suzart
Publicado em 19 de novembro de 2025 às 05:00
Na noite de 20 de novembro, data símbolo da resistência negra no país, a Casa Rosa abre suas portas para o espetáculo ‘Bahias’, concerto que sintetiza a travessia pessoal e artística de Daniela Nátali. Filha do interior baiano, mulher negra e clarinetista que rompe barreiras, ela transforma o palco em território de afirmação e celebração das raízes da música baiana. É como viajar no tempo no som de sua clarineta. >
O espetáculo integra o projeto Quinta da Casa e propõe uma travessia sonora pelas múltiplas Bahias que moldaram a artista, transbordando identidade e memória coletiva por meio de uma música que funde matriz africana, jazz contemporâneo, improviso e releituras de compositores fundamentais para a cultura do estado, dos mais ao menos conhecido. Com ingressos a preços populares, o concerto será realizado às 20h no Teatro Cambará, no Rio Vermelho, e marca a programação especial do Dia da Consciência Negra na capital baiana. E nem adianta inventar desculpas, pois é feriado. É um feriado de significado especial para nosso estado. >
‘Bahias’ apresenta composições autorais e interpretações de clássicos da música popular brasileira, destacando nomes que ajudaram a construir a história da canção baiana, mas que permanecem pouco reconhecidos fora do estado, como João Mello e Codó. A proposta reforça o compromisso de Daniela com a preservação e a valorização da memória musical da Bahia, além de ampliar a discussão sobre representatividade e protagonismo da mulher negra na música instrumental, um campo onde a artista vem abrindo caminhos de forma pioneira, mas também com muita luta.>
“Enquanto mulher negra, eu me sinto muito honrada e cumprindo a minha missão de levar música para o teatro e ocupar esse lugar de representatividade. Eu me sinto muito vitoriosa por esse momento. É uma grande realização", afirma Daniela.>
A construção do concerto nasceu do mergulho da artista em pesquisas sobre as raízes da música baiana e sobre o papel da clarineta, instrumento pouco presente na cena local, mas de uma profundidade que hipnotiza quem escuta. "O show traz minhas vivências. É muito bonito ver a clarineta como protagonista, porque aqui em Salvador não é um instrumento muito assistido", diz. "Eu espero comunicar às pessoas através do sopro. A música instrumental é a minha linguagem".>
Daniela explica que a ideia do espetáculo surgiu a partir da compreensão de que a Bahia guarda um tesouro cultural inesgotável, revelado por sua trajetória de estudos, mas que nem todas estão ao alcance do baiano. "Cheguei à conclusão de que o nosso tesouro é muito grande. Letieres foi uma pessoa muito importante para mim, porque ele fazia com que a gente olhasse para o que temos aqui", lembra. "Temos um universo rico demais. Eu decidi traduzir isso para a clarineta".>
Ela relembra a figura crucial na música, Letieres Leite. O músico, educador, compositor e arranjador brasileiro nos deixou em 2021. O repertório do concerto inclui choro, jazz, samba de Batatinha, canções de Dorival Caymmi, músicas de Gilberto Gil e obras autorais como Pagode de Madeira, Pedido de Roda e Jacaré. Um liquidificador cultural. "Tem choro, tem standard de jazz, tem samba de Batatinha e tem Caymmi", conta. "Também tem Pagode de Madeira, que é fruto das minhas pesquisas e dessa busca por novas sonoridades para a clarineta".>
Entre outros, a artista destaca Caymmi como símbolo providencial da memória musical baiana. E vai ter Dorival na roda. “Caymmi é uma figura importantíssima. Ele levou a Bahia para o mundo. Mas muitos compositores acabam esquecidos porque ainda damos mais valor ao que é de fora. Salvador é a cidade da música, mas precisa olhar mais para os músicos daqui", diz. Para ela, fazer música instrumental na capital baiana é um ato de persistência e resistência: "Quem faz música em Salvador, principalmente música instrumental, resiste", resume.>
Sua trajetória reflete essa essência. Nascida em América Dourada, Daniela teve seu primeiro contato com a clarineta em um projeto que buscava formar uma filarmônica municipal. Depois estudou de forma autodidata, passou por orquestras no interior, ingressou no Neojiba e mergulhou na pesquisa da música afro-baiana com o maestro Letieres Leite, na escola Rumpilezzinho. "A minha busca sempre foi muito intensa para me aprimorar como musicista", revela. >
No palco, Daniela estará acompanhada por Jordi Amorim no baixo, Lucas Decliê no sax tenor, Lorena Martins na bateria e Caio Ferreira no teclado. O show tem produção da Coliga Produções e faz parte da programação anual do Quinta da Casa, contemplada pelo edital Gregórios Ano IV, da Fundação Gregório de Mattos e da Política Nacional Aldir Blanc de Fomento à Cultura.>
Para ela, a música instrumental é uma linguagem potente de comunicação e sensibilidade. Daniela acredita no poder afetivo da arte. “A música comunica. Eu espero alcançar as pessoas através do sopro da clarineta. É um instrumento especial, elegante e muito bonito. É a minha missão comunicar através da música instrumental e da nossa história tão rica e maravilhosa”, diz. >
Ao celebrar a força ancestral e a contemporaneidade criativa da música negra baiana, ‘Bahias’ faz do Dia da Consciência Negra não apenas uma data comemorativa, mas um ato de afirmação coletiva. É um convite para olhar o passado, reconhecer o presente e fortalecer um futuro da verdadeira música baiana e brasileira, o que dá no mesmo. >
Espetáculo de Daniela Nátali celebra a força da música negra baiana
QUINTA DA CASA APRESENTA: BAHIAS, DE DANIELA NÁTALI >
Quando: 20 de novembro de 2025 (quinta-feira), 20h>
É proibida a entrada após o início do espetáculo>
Onde: Teatro Cambará da Casa Rosa>
(Praça Colombo, 106 – Rio Vermelho – Salvador, Bahia)>
Quanto: R$ 30 (inteira) | R$ 15 (meia)>
Acessibilidade: Arquitetura acessível e tradução em Libras>
Classificação indicativa: Livre>