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Thais Borges
Publicado em 21 de janeiro de 2024 às 07:00
Imagine um grupo de homens no melhor estilo ‘macho alfa’. Grandes, fortes, ricos - todos bem-sucedidos em suas respectivas áreas. Atletas, cantores, empresários. Ao ver seus relacionamentos ameaçados, eles buscam ajuda em um clube do livro secreto onde leem romances para entender melhor as mulheres e como serem homens melhores. >
Essa é a premissa da série Clube do Livro dos Homens (Editora Arqueiro), que se tornou bestseller no Brasil - e viral no TikTok. Desde 2021, já foram cinco volumes lançados no país. A autora, Lyssa Kay Adams, teve a ideia para a história após o escândalo do vazamento de uma gravação em que o então candidato à presidência dos Estados Unidos Donald Trump se referia a mulheres com termos ofensivos e depreciativos. >
“Muitos homens defenderam a gravação e o que Trump disse. Eles diziam ‘mas é assim que homens falam quando estão juntos’. E eu decidi que eu não ia aceitar”, contou, em entrevista ao CORREIO na última quinta-feira (18). Para Lyssa, a situação se parece muito com a da última semana no Brasil, quando participantes do Big Brother Brasil fizeram comentários misóginos sobre participantes mulheres e foram duramente criticados por isso.>
Por Zoom, Lyssa Kay falou sobre a construção dos personagens, a repercussão da obra entre leitores homens e o que os homens da vida real podem aprender com os homens do clube do livro. >
Confira os principais trechos da entrevista>
O que inspirou o livro? Por que escrever um livro sobre homens que leem romance? >
Uma das coisas que levou ao livro Clube do Livro dos Homens foi uma situação semelhante. Aqui, nos Estados Unidos, em 2016, tivemos uma eleição presidencial muito sórdida, na qual Donald Trump foi eleito presidente. Pouco antes da eleição, houve um vazamento de uma gravação de Donald Trump falando muito depreciativamente sobre mulheres em geral, mas especialmente mulheres que trabalhavam com ele.>
E no fundo você ouve outros homens rindo, encorajando-o a continuar. Isso parece muito similar ao que aconteceu no Brasil. Isso levou a um debate, particularmente entre mulheres que diziam ‘chega, estamos fartas desse comportamento dos homens’. Muitos homens defenderam a gravação e o que Trump disse. Eles diziam ‘mas é assim que homens falam quando estão juntos’. E eu decidi que eu não ia aceitar. >
Se por alguma razão, se de fato existem homens que pensam que é assim que eles devem falar quando estão sozinhos juntos, chegou a hora de eles aprenderem que isso não é mais aceitável. É hora de eles encontrarem um novo meio de se conectarem entre eles. >
Como você pensou nos personagens? Como foi o processo de criação deles?>
Eu sentei e comecei a escrever esse livro sobre homens que não se comportam dessa forma e que realmente repreendem uns aos outros por mau comportamento. Eu queria mostrar homens que são muito bem-sucedidos. Alguns eu até chamaria de macho alfa, porque eles estão no topo de tudo. São homens grandes, muito fortes, acho que poderia dizer que são espécimes perfeitas de homens. >
E eu queria mostrar homens como esses engajados em se tornar melhores aliados para as mulheres. Porque existe esse mito de que, de alguma forma, ser feminista é um traço feminino. Mas, na verdade, não existe nada ‘antimasculino’ em ser um aliado das mulheres. Não existe nada de ’antimasculinidade’ em ser feminista. Então, mostrar esses caras - jogadores de futebol americano, jogadores de baseball, atletas profissionais, CEOs - engajados em conversas sobre o que significa ser um aliado para mulheres teve muito mais impacto. >
Como foi a recepção do livro pelos leitores homens? Você tem leitores homens?>
Eu tenho leitores homens e amo que esse tenha sido um dos resultados. Na verdade, eu recebo todo tipo de mensagem. Desde os homens que vêm sendo leitores silenciosos de romances há anos até homens que nunca leram romance antes e, geralmente pelo encorajamento de suas parceiras, decidiram ler meu livro e descobriram que amam romance. >
Mas as minhas mensagens preferidas são de homens que diziam: ‘isso realmente me fez pensar diferente. Esse livro me fez perceber que quando um amigo faz piadas depreciativas sobre mulheres, eu tenho a responsabilidade de dizer ‘ei, isso não é legal, você não pode fazer isso’. Nós temos que pensar em uma nova forma de nos conectar como homens’. >
Eu realmente acho que ajuda os homens a ter um modelo para dizer: é assim que as conversas podem ser. É assim que você pode apoiar mulheres sem perder suas amizades masculinas. É isso que significa se conectar, como homem que não tem nada a ver com depreciar mulheres. >
E as mulheres? O que elas dizem sobre os homens do livro?>
Eu ouvi de mulheres que perceberam que elas estavam em relacionamentos ruins. E não é só por ler o meu livro, mas acho que muitas mulheres quando leem romances percebem que querem ser melhor tratadas e que não estão em bons relacionamentos. >
Eu escutei de uma mulher que o meu livro inspirou a ela e a seu marido a lutar pelo casamento. Mas o que eu mais escuto é que as mulheres gostariam que essas conversas fossem reais, que essas conversas realmente acontecessem entre os homens da vida delas e em geral. >
Por que homens deveriam ler romances?>
Homens deveriam ler romance porque se não leem, estão perdendo ótimas histórias. Eles estão limitando suas próprias escolhas literárias e perdendo boa escrita. >
Acho que homens deveriam ler romance porque eles mostram como um relacionamento saudável deveria ser. E eles também promovem um modelo de que não há nada desmasculinizante em um homem que tem inteligência emocional, que quer e pode expressar emoções. Eles podem dar uma noção aos homens de como falar com as mulheres na vida deles. O modo como as mulheres respondem, o modo como elas querem que falem com elas. >
Nós não criamos homens da mesma forma como criamos mulheres e a eles nem sempre são ensinadas as habilidades de comunicação emocional que são ensinadas às mulheres. Talvez eles precisem ser ensinados e livros de romance são uma forma de aprender isso. >
Que lição você espera que os homens da vida real aprendam com os homens do Clube do Livro dos Homens?>
O que eu espero que os homens aprendam com o Clube dos Livro dos Homens é que você (homem) não precisa fazer isso. Você pode se conectar aos seus amigos homens de outra forma sem perder a sua carteirinha de homem. Não tem nada de legal, não tem nada de masculino em se ligar aos seus amigos homens através da degradação sexual das mulheres. Não está tudo bem. >
E um dos motivos para isso é que as mulheres são seres humanos e devem ter o respeito que é dado aos homens. Mas também porque quando começamos a acabar com esses comportamentos, em um nível individual, quando os amigos começam a corrigir uns aos outros e dizer ‘cara, isso não é legal, não fale coisas assim’, afeta a sociedade como um todo. Começa-se a pensar em como homens tratam mulheres nos escritórios, não apenas mulheres em suas vidas, mas mulheres que estão no governo, mulheres em posições de autoridade quando eles começam a corrigir uns aos outros em nível individual. >
E a outra coisa é que uma vez que você permite que as suas amizades masculinas sejam mais do que a degradação das mulheres, você se abre para amizades muito poderosas. Esteja disposto a ser mais profundo com suas amizades. Não apenas faça piada sobre mulheres e diga coisas sórdidas sobre mulheres como se fosse a única forma possível. >
E para os fãs, o que podem esperar do Clube do Livro dos Homens no futuro?>
A primeira coisa é que o primeiro livro lido pelo clube do livro, Cortejando a Condessa, será lançado. Eu decidi escrever como um livro real. E o sexto livro virá depois disso. >