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Roberto Midlej
Publicado em 8 de novembro de 2023 às 06:00
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Prezado leitor, pense em Dercy Gonçalves. Sou capaz de apostar que você pensou nela daquele jeito desbocado e, muito provavelmente, soltando um monte de palavrões. E, se duvidar, pensou nela botando os seios para fora na TV, como fez no programa Sai de Baixo há quase 30 anos. E juram que a atitude da humorista naquele dia pegou todo o elenco de surpresa.>
Mas Dercy foi muito mais que isso. Foi uma mulher de vanguarda e a transgressão dela ia muito além de ficar nua na TV ou falar palavrão a torto e a direito. E é isso que mostra o espetáculo Nasci Pra Ser Dercy, que será apresentado de sexta-feira (10) a domingo (12) no Teatro Sesc Casa do Comércio.>
No monólogo, Grace Gianoukas interpreta Vera, uma atriz que entra num estúdio para viver Dercy Gonçalves em um filme. À medida que conhece o texto do filme, Vera fica revoltada porque o roteiro está repleto de estereótipos e reforça uma imagem preconceituosa sobre Dercy. A candidata ao papel resolve então mostrar ao público quem era realmente a comediante, revelando a verdadeira história dela.>
Grace Gianoukas
atriz que protagoniza Nascy Pra Ser DercyE o público vai finalmente descobrir como e por que o palavrão foi parar nas peças de Dercy e como a atriz enfrentou a ditadura militar, que queria censurá-la.>
Grace, que na carreira se destaca pelas suas atuações cômicas, reconhece que sempre teve admiração especial por Dercy, mas só quando estava envolvida na montagem do monólogo se deu conta de quanto a velha comediante foi importante para sua formação artística: "Ela foi importante no meu conceito de graça. Mas ela já estava 'instalada' em mim e só quando comecei a estudar para o espetáculo é que me dei conta do quanto ela me influenciou. A mim e a uma série de gerações, porque ela criou um estilo brasileiro de fazer comédia que era só dela", afirma.>
Grace diz que, embora sua personagem às vezes 'incorpore' Dercy, ela não tem a intenção de imitar a antiga comediante: "Meu rosto não parece com o dela, meu corpo não parece com o dela. Mas há um trabalho de caracterização que arredonda meu olho".>
Segundo a atriz, Decimar, filha de Dercy, se emocionou quando ao assistiu ao espetáculo, principalmente porque a história fala da importância dela para a cultura brasileira. "Nossa história é contada sempre sob o olhar masculino, afinal vivemos numa sociedade machista, onde a história da mulher é deixada para escanteio", revela Grace, em tom indignado. Nasci Pra Ser Dercy estreou em janeiro deste ano, em São Paulo e Decimar morreu no último domingo.>
Num encontro que teve com Dercy no início da carreira, Grace notou que a comediante sabia o significado da transgressão: "Fui assistir a uma peça dela junto com outras atrizes que estavam começando na comédia: Denise Fraga e Rosi Campos. Fomos encontrá-la no camarim e nunca vou esquecer do que ela nos disse: 'meninas, não fiquem mostrando seu corpo à toa. Deixem para mostrar na minha idade, porque isso, sim, é rebeldia, é transgressão. Na idade de vocês, é exploração do corpo feminino!".>
Embora seja muito associada à comédia, Grace diz que não direcionou sua carreira para este gênero e foi naturalmente levada a ele. Mais que isso: ela sequer planejava ser atriz. Na verdade, queria ser socióloga ou antropóloga e viver estudando indígenas ou quilombolas. "Mas fui me inscrever no vestibular e na segunda opção - que nem sabia que existia - marquei teatro porque pensei: 'ah, deve ser um povo legal!'", lembra a atriz.>
Já atuou em diferentes gêneros do teatro e, por isso, se considera simplesmente atriz e não comediante: "Mas encontrei na comédia uma ferramenta muito interessante para entrar em assuntos delicados e para retratar comportamentos da sociedade. A comédia critica e expõe as mazelas, mas nos pegando no colo".>
Nasci Pra Ser Dercy. Sexta e sábado (10 e 11), às 20h; domingo (12), às 19h. Teatro Sesc Casa do Comércio (Av. Tancredo Neves). Ingressos: R$ 100 | R$ 50 (mezanino); R$ 120 | R$ 60 (plateia). Clube CORREIO: 40% de desconto>