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Millena Marques
Publicado em 9 de janeiro de 2025 às 07:22
A Bahia ainda tem mais beneficiários do Bolsa Família do que trabalhadores com carteira assinada. Ao todo, de acordo com dados do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged), o estado conta com 2,14 milhões de pessoas trabalhando com carteira assinada enquanto acumula 2,48 milhões de beneficiários do programa social, segundo números da Secretaria de Avaliação, Gestão da Informação e Cadastro Único (Sagicad). Especialistas dizem que os índices evidenciam a vulnerabilidade social no estado. >
Para o economista e vice-presidente do Conselho Regional de Economia da Bahia (Corecon-BA), Edval Landulfo, a perda econômica é um dos impactos negativos dessa diferença. “O poder de compra dessa população fica enfraquecido, e as pessoas, muitas vezes, passam necessidade, têm uma alimentação mais precária, deixam de fazer algumas atividades, refeições, muitos não conseguem meios de transporte. Então, não favorece em nada a economia”, diz o economista. >
Em agosto de 2024, a Bahia era o terceiro estado com o maior acúmulo de beneficiários do programa social comparado ao de trabalhadores com carteira assinada, ficando atrás apenas do Maranhão, que tem uma diferença de 564.869 a mais de recebedores do Bolsa Família, e do Pará, que tem uma diferença de 363.648 a mais de pessoas que recebem o auxílio. Atualmente, o valor do Bolsa Família é de, no mínimo, R$ 600 por família, e o salário-mínimo para um trabalhador de carteira assinada é de R$ 1.412. >
"Isso mostra o grande desequilíbrio econômico que existe no nosso país, ou seja, a desigualdade. Os estados nordestinos e os estados do Norte são os que mais sofrem, até por um processo de desindustrialização”, continua Landulfo. >
Criado em 2003 pelo governo federal, o programa Bolsa Família é uma política pública fundamental para a população empobrecida. Estudos nacionais e internacionais, aliás, apontam o impacto positivo na escolaridade e no rendimento do trabalho. Caso do The Long-Run Effects of Conditional Cash Transfers: the Case of Bolsa Familia in Brazil, divulgado pela Universidad Nacional de la Plata. O trabalho aponta um aumento global de 0,8 ano de escolaridade e de US$ 250 de rendimento do trabalho entre os beneficiários. >
A criação do programa social e os impactos dele não são questionados por especialistas. Pelo contrário, o Bolsa Família é defendido como uma “estratégia de redução de impacto das vulnerabilidades sociais”. Doutor em Ciências Sociais pela Universidade Federal da Bahia (Ufba), Umeru Bahia explica que o problema está na política econômica presente. >
“É a manutenção da desestruturação do mercado de trabalho, na precarização, desvalorização salarial e desemprego. Devemos refletir sobre como o nosso modelo econômico ainda não é voltado para uma empregabilidade massiva da população, cabendo ao estado ter que salvaguardar milhões de vidas com um auxílio mínimo", destaca. >
De acordo com Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (PNADC) Trimestral, do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), a Bahia possui a segunda maior taxa de desocupação do Brasil, com 9,7%, atrás apenas de Pernambuco (10,5%). O índice baiano está acima da média nacional, que é de 6,4%. Os dados são referentes ao terceiro trimestre de 2024. >
Além do mercado de trabalho >
Os impactos da diferença entre beneficiários do Bolsa Família e trabalhadores com carteira assinada ultrapassam as questões relacionadas ao mercado de trabalho. A disparidade tem consequências significativas para a previdência social. Quem diz isso é a assistente social Micaela Vergne, especialista em Direito da Seguridade Social Previdenciário e Prática Previdenciária. >
"Com menos pessoas inseridas no mercado de trabalho formal, há uma redução substancial nas contribuições previdenciárias. A ausência de formalização no trabalho implica que muitos cidadãos deixem de acessar direitos trabalhistas e previdenciários básicos, como aposentadorias, auxílios-doença, salário-maternidade e pensões”, pontua. >
Nesse cenário, a assistência social surge como única alternativa para garantir sua subsistência, segundo a especialista. Ela defende, ainda, a criação de políticas públicas que incentivem a formalização do trabalho, promovam a inclusão produtiva e garantam a proteção social dos trabalhadores. “Ao mesmo tempo, é essencial fortalecer a emancipação das famílias inscritas no bolsa família, reduzindo a dependência ao benefício. Políticas integradas, com incentivo à educação, capacitação profissional e fomento ao empreendedorismo”, conclui. >