EDUCAÇÃO

Ataque ao Colégio Antônio Vieira por bibliografia com autores negros é o segundo caso em cinco anos

Em 2019, o alvo foi uma obra de Lázaro Ramos; está semana os ataques foram ao livro de Djamila Ribeiro

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  • Gil Santos

Publicado em 2 de maio de 2024 às 06:45

Ataques foram publicados em rede social Crédito: Reprodução

Os ataques que o Colégio Antônio Vieira, no Garcia, sofreu por parte de uma mãe inconformada com a bibliografia usada em sala de aula, foi o segundo que se tornou público nos últimos cinco anos. Nesta terça-feira (30), a mulher criticou a escola por usar o livro Pequeno Manual Antirracista, da filósofa Djamila Ribeiro. Em 2019, os ataques foram por conta da obra Na Minha Pele, de Lázaro Ramos. Estudantes e ex-alunos saíram em defesa do Colégio.

Em nota, o diretor-geral do Colégio Antônio Vieira, Sérgio Silveira, pedagogo, mestre em Gestão Educacional e doutorando em Educação, afirma que a escola segue a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, lembra que existe um Comitê para Educação Étnico-Racial e de Gênero no colégio e diz que essa educação é um imperativo de reconciliação e justiça.

Em 2019, estudantes e ex-alunos defenderam a escola e lembraram que o padre Antônio Vieira, que dá nome ao colégio, lutou ferrenhamente contra a escravidão de povos e as discriminações. Agora, eles voltaram a se manifestar contra os ataques. Uma mulher escreveu. “Fui aluna do Vieira, tive aulas de religião e não tenho o que reclamar. Eles fazem um trabalho muito bom de ensino religioso, abordando as mais diversas religiões, enfatizando, sobretudo, o respeito às diferenças”, disse.

A mãe de aluno começa a publicação questionando se o uso do livro seria um “culto à servidão de ideologias”. Em seguida, publica a imagem da capa do Pequeno Manual Antirracista e a relação de livros trabalhados nas aulas de religião do 8º ano, onde a obra aparece abaixo da Bíblia Sagrada. Depois, faz um print da biografia de Djamila, destacando que a mãe da filósofa trabalhava como empregada doméstica e que iniciou a filha no candomblé quando Djamila tinha 8 anos.

“O que esperar de uma aula de religião em um colégio católico? Não seria apenas a palavra de Deus, o código canônico, as histórias de virtudes dos mártires, mandamentos? Qual é o sentido e o objetivo de utilizar uma autora que vem de família de outra religião, no caso específico candomblé? Existe qualquer conexão com a fé católica?”, pergunta.

Um estudante do 8º ano, que pediu para não ser identificado, contou que o livro é usado na sala de aula para reforçar os princípios da fé cristã. O menino disse que a turma fez um podcast sobre racismo, sobre as diversas manifestações dessa discriminação e como enfrentar o problema para ter uma sociedade mais igualitária e fraterna.

“No Cristianismo os tópicos principais são fé, amor, aceitação, compaixão, e ser contra violência, o ódio e a discriminação. O racismo é justamente uma forma de violência e representa tudo o que a religião cristã é contra. O livro é usado no ensino religioso para a gente entender o que é o racismo, para a gente aprender a combate-lo e nos tornar mais cristãos”, explica.

Estudantes contaram que as aulas falam de amor, aceitação e compaixão e que o combate ao racismo, uma violência e um crime desde 1989, é tratado através do livro como um exemplo de como ser um bom cristão. O Colégio Antônio Vieira respondeu em nota. Confira o posicionamento na íntegra:

O Colégio Antônio Vieira, embasado na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, reconhece a importância de garantir o respeito à diversidade cultural religiosa do Brasil. Nesse sentido, adotamos uma abordagem inclusiva que visa tranversalizar toda a nossa prática educativa.

Destacamos a existência do Comitê para Educação Étnico-Racial e de Gênero no Colégio Antônio Vieira, que desempenha um papel fundamental na orientação de ações voltadas para essa temática. As questões antirracistas são trabalhadas em consonância com nosso Projeto Político-Pedagógico, seguindo os fundamentos da Companhia de Jesus e as diretrizes da Igreja Católica, inclusive o Pacto Educativo Global.

Para nós, a educação para as relações étnico-raciais é um imperativo de reconciliação e justiça. Por isso, incluímos livros e materiais didáticos que abordam essa temática de forma ampla e contextualizada em nossas aulas de Ensino Religioso. Essa abordagem não se limita apenas às disciplinas religiosas, mas permeia todo o contexto escolar, refletindo nosso compromisso com a conscientização sobre a importância de respeitar a diversidade.

Reconhecemos a importância da legislação vigente, como a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, a Lei nº 10.639/2003, bem como a Lei 7.716/89 e a Lei 14.532, que fundamentam o racismo como crime e a necessidade de assegurar a efetivação das diretrizes estabelecidas. Nos empenhamos também a cumprir a nota recomendatória da Defensoria Pública da Bahia que ressalta a importante e necessária tomada de medidas para reconhecer e valorizar a história e cultura afro, afro-brasileira e indígena como pilares da formação cultural-identitária do povo brasileiro. Nosso empenho em implementar essas leis é amplo e eficaz, pois nossa missão vai além do ensino acadêmico; buscamos formar cidadãos comprometidos com a construção de um mundo mais inclusivo e solidário.

A mulher apagou a postagem após a repercussão. Procurada, ela ainda não se manifestou.