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Larissa Almeida
Publicado em 10 de abril de 2025 às 05:00
As exportações da Bahia para os Estados Unidos devem registrar perdas de pelo menos U$ 65 milhões – cerca de R$ 379,6 milhões – após o tarifaço de Donald Trump, que estabeleceu a taxa mínima de 10% para os produtos brasileiros que adentrarem o país norte-americano. A estimativa é de Arthur Souza Cruz, coordenador de Acompanhamento Conjuntural da Superintendência de Estudos Econômicos e Sociais da Bahia (SEI), que avalia que a indústria deve ser o setor econômico baiano mais afetado. >
Atualmente, a Bahia e os Estados Unidos possuem uma relação comercial que movimenta mais de U$ 3,7 bilhões – aproximadamente R$ 21,6 bilhões – anualmente. Só em 2024, o estado dos baianos exportou U$ 882 milhões em produtos para o país norte-americano – o equivalente a cerca de R$ 5,1 bilhões. Com isso, os EUA foram o segundo principal parceiro comercial da Bahia, atrás somente da China com US$ 4,36 bilhões. Os dados são da SEI. >
Como destino dos produtos baianos, em 2024, os Estados Unidos ocuparam a 3ª posição com compras de US$ 882,1 milhões, atrás de China e Singapura. Entre os cinco principais produtos exportados para os norte-americanos, quatro pertenciam ao setor industrial: dois tipos de celulose, borracha e benzeno. Juntos, eles representam 40% dos valores movimentados com a exportação e não devem ser os maiores impactados pelas tarifas estadunidenses, uma vez que há maior pressão sobre o ferro e o aço. >
A pressão existe porque, no mês passado, Donald Trump já havia imposto tarifas de 25% sobre o aço e o alumínio importado. Com os 10% divulgado na semana passada, são 35% de encargos tarifários para o ferro e o aço exportado pela Bahia, daí a estimativa de perdas consideráveis para a indústria baiana. >
“De fato, é o setor mais prejudicado”, avalia Arthur Souza Cruz. Ele, no entanto, não indica razões para que o pessimismo se instaure. “As exportações baianas de ferro e aço só representaram 8% das vendas baianas para os EUA em 2024 e 0,54% do total das vendas externas do estado nesse mesmo ano. No contencioso, há margem para negociação que o governo brasileiro prioriza, antes de qualquer retaliação”, pontua. >
Em escala global, o tarifaço de Trump fez com que os mercados financeiros reagissem de imediato, derrubando bolsas de valores em todo o mundo. A movimentação traduziu o clima de incerteza em relação à economia mundial, que pode entrar em recessão diante dos desdobramentos do protecionismo americano e das respostas a ele. A China, por exemplo, que decidiu impor 50% de taxas aos EUA, agora pagará taxas de até 104% ao país norte-americano. >
O economista Uitan Maciel analisa que, apesar do impacto ter sido menor no Brasil – tendo em vista que alguns países tiveram taxação de 50%, há impactos negativos dos quais os brasileiros não conseguirão fugir. “Haverá redução da competitividade, visto que os produtos brasileiros ficam mais caros nos EUA, perdendo espaço para concorrentes; queda nas exportações, que impacta diretamente o PIB, empregos e arrecadação de estados exportadores”, aponta. >
Outro impacto negativo é na produção industrial. Na perspectiva do especialista, a taxação de peso contra o ferro e o aço pode desestimular a produção industrial diante da menor demanda. Isso vale para a Bahia, cuja fabricação de ambos os produtos é direcionada para o mercado exterior. O ferro baiano, inclusive, foi um dos produtos mais exportados para o Canadá no ano passado. >
No que tange à celulose, produto baiano mais exportado para os Estados Unidos, o efeito do tarifaço recai quanto à competitividade, que deve ficar mais acirrada com país como Canadá e Chile. O benzeno, por sua vez, é um produto químico sensível à nova política tarifária norte-americana. “Ele pode ser substituído por fornecedores locais americanos, reduzindo espaço brasileiro”, alerta Uitan Maciel. >
Para Carlos Henrique Passos, presidente da Federação das Indústrias do Estado da Bahia (Fieb), o momento atual exige cautela e atenção para os movimentos que estão acontecendo. “A maior ameaça para a indústria brasileira é o fato de que todos os países que não puderem exportar para os Estados Unidos vão mirar a exportação para outros mercados e o Brasil, por sua dimensão, pode ser um deles”, ressalta. >
“Outro setor que deverá ser afetado é o agro, em especial a exportação de soja e algodão. Ainda não temos como saber qual será a extensão dos impactos dessa guerra de tarifas iniciada pelos Estados Unidos, mas estamos falando de um cenário de tensão instalada que afeta o humor do setor produtivo e da sociedade como um todo”, completa o presidente da Fieb. >
Em proporção bem menor, a exportação de manga e derivados do cacau também deve ser impactada, porque são produtos agrícolas com margem apertada, logo, pequenas tarifas já diminuem as chances deles se tornarem competitivos. O mesmo ocorre com a borracha, que já enfrenta a concorrência asiática. >
Antes mesmo de Donald Trump anunciar o pacote tarifário mundial, a Câmara dos Deputados havia aprovado, em caráter de urgência, o pedido para votar o projeto que permitia que o Brasil pudesse retaliar os Estados Unidos, isto é, impor as mesmas taxas que viesse a receber. No entanto, após o anúncio da taxação mínima de 10%, o governo brasileiro não deu sinais de seguir adiante com o plano. >
Na perspectiva do economista Uitan Maciel, a possibilidade de retaliação é mínima, mas não nula. “O Brasil costuma adotar postura conciliadora, evitando medidas que possam prejudicar a balança comercial. Mas se houver pressão interna, seja da política ou de setores econômicos, a retaliação pontual é possível”, afirma. >
Caso haja retaliação, o cenário fica mais tenso e a relação entre Bahia e Estados Unidos mais delicada. “Teríamos como efeito aumento de tensões comerciais, prejudicando exportadores de ambos os lados; produtos americanos mais caros em todo o país, impactando consumidores e empresas brasileiras que dependem desses itens; e risco de escalada, que pode afetar setores que nada têm a ver com o conflito original”, completa o economista. >
Nesse cenário, a Bahia teria como únicas saídas para compensar a atual relação com os EUA o direcionamento de foco maior para outros mercados, situados no Oriente. Atualmente, os mercados que mais importam produtos baianos são os da China e Singapura, ambos asiáticos. >