Daniela Mercury leva seu universo para a Bienal do Livro

Em bate-papo com Bruno Brasil, cantora relembrou início de carreira e falou sobre atuação como compositora

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  • Raquel Brito

Publicado em 28 de abril de 2024 às 22:34

Daniela participou de bate-papo na Arena Jovem
Daniela participou de bate-papo na Arena Jovem Crédito: Marina Silva/CORREIO

Ela afirma em alto e bom tom que se fez existir. No início da carreira, já dizia que não precisava que ninguém a descobrisse. A tenacidade de Daniela Mercury faz parte da cantora desde que se entende por gente, e esse e outros assuntos a artista levou para a Bienal do Livro neste domingo (28).

Em bate-papo com Bruno Brasil no painel “O Sol da Liberdade – O Universo que Daniela Mercury Criou Para Nós”, ela contou que ainda sente resistência de gravadoras quando apresenta composições próprias. Para Daniela , isso é fruto da misoginia.

“A gente sempre tem a expectativa que os homens sejam produtores musicais, capazes de reger as próprias carreiras. Muitas vezes, também não fazem isso. Isso tudo é fruto do costume da gente achar que os homens sempre estão na liderança e que as mulheres são sempre comandadas por alguém”, disse.

E ela deu muito nó em pingo d’água desde que começou a cantar, há mais de 40 anos. O início da trajetória como artista envolveu desde fazer as próprias roupas até cuidar da cenografia.

“As pessoas perguntam: ‘por que aprendeu a fazer tanta coisa?’. Porque a gente não tinha dinheiro pra fazer nada! Eu inventava minhas roupas e quando dava errado, dava errado mesmo. Pedia algumas emprestado na Ebateca, que era minha escola de dança. Quem viu meus primeiros shows viu que eu usava uns blazers enormes. Era tudo emprestado”, contou.

No universo criado por ela, a política é indissociável da música. A artista não hesita ao declarar que tudo que faz é político e que ‘ninguém a manda calar a boca’. Nas canções, dá voz às pessoas negras, às crianças, à população LGBTQIA+.

“Salvador é uma cidade muito grande e muito dura também. Não é só alegre, só forte, só cultural, é uma cidade muito desigual. Eu sonho muito que a cultura seja capaz de diminuir essas distâncias”, disse a intérprete de Maimbe Danda, que declarou o seu desejo de que compositores e escritores também captem essa realidade.

Na Bienal do Livro, Daniela não pôde deixar de falar também sobre a influência de movimentos literários na sua música. O movimento antropofágico, corrente da primeira fase do modernismo, foi essencial para as suas obras iniciais e para a lógica de trabalho da artista.

“A antropofagia é o espírito de aprender o mundo. A ideia é engolir o mundo, que tudo que está no mundo é meu. Aprendi com eles, sim, a amar a cultura popular brasileira, desde o Mário de Andrade, ao Caetano e Gil”, declarou.

O canto da cidade

Quando questionada por Bruno sobre a métrica do sucesso para ela, a artista não precisou pensar muito. Sucesso, para Daniela Mercury, é cantar para o seu povo e fazer uma música transformadora.

Foi por isso, também, que recusou estrelar como Carmen Miranda na Broadway e outros convites fora do Brasil. Segundo ela, só faz sentido rodar o mundo cantando em portugês.

“A minha música só faz sentido porque eu tenho por que lutar. Eu nunca vivi somente por mim mesma. Minha graça é fazer meu povo se fortalecer. Minha arte tinha que ser algo para levantar a autoestima da minha gente, então eu tinha que fazer uma música que fosse da gente”.

E deu certo. Prova disso é a autora Lorena Lacerda, que está apresentando seu livro “Os Cantos da Sereia Preta” no evento, e pôde contar pessoalmente à cantora a influência que ela teve para a sua formação.

“Eu contei para Daniela o que ela representou para que eu fizesse esse livro e ela falou no meu ouvido: ‘muito bem’. No momento que eu vejo Daniela como uma figura pública que fala o que pensa e é o que é, ela me fortalece como mulher. Para não ter medo de ser taxada de mal educada por ser mulher e sim ser como eu sou”, disse.

*Com orientação da chefe de reportagem Perla Ribeiro.