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Da Redação
Publicado em 20 de dezembro de 2020 às 16:00
- Atualizado há 2 anos
O transporte coletivo tem papel fundamental na estruturação das cidades, por isto requer atenção especial pelas administrações municipais. A partir dele podemos ter cidades mais eficientes ou tremendamente onerosas, desequilibradas e injustas. É preciso muito cuidado com o ônibus porque ele é um sistema invertebrado, não é estruturador, como os sistemas sobre trilhos. Ao contrário, solto, sem diretriz, o ônibus vai a qualquer lugar para onde seja mandado, servindo assim, por exemplo, a dar cobertura à localização inadequada de conjuntos habitacionais distantes das áreas infraestruturadas onde são assentadas populações mais pobres, onde chegará o transporte, com frequência inadequada aos interesses da população, mas onde continuarão faltando todos os demais serviços públicos relevantes para a vida urbana, inclusive oportunidades de trabalho e renda.>
As sedes municiais muito pequenas sequer contam com sistema de transporte coletivo. É um bom estágio para cultivar a mobilidade ativa – os deslocamentos a pé ou de bicicleta. As prefeituras em geral – todas mesmo – precisam controlar o processo de urbanização, a começar por manter leis de perímetro urbano mais estrito, estimular a densificação, o uso misto do solo, a fachada ativa nas edificações verticais, reduzir o tamanho das quadras, impedir a formação de vazios urbanos, utilizar plenamente as áreas com disponibilidade de infraestrutura, para desenvolvermos cidades compactas.>
Os projetos de infraestrutura urbana precisam deixar de ser projetos viários para se tornarem projetos de mobilidade, com predomínio do transporte coletivo, antes que projetos de novas avenidas e pistas para carros. Em relação ao ônibus o que precisa é privilegiar a implantação de faixas exclusivas em avenidas existentes e a construção de pistas exclusivas em novos projetos. Não mais uma infraestrutura viária que faz de nossas cidades um ambiente dedicado aos carros, antes que para as pessoas.>
Embora seja um sistema de baixo investimento, algumas prefeituras de grandes cidades e o próprio Distrito Federal ainda dispõem de empresas de ônibus estatais, o que é descabido e injustificável. Já não servem mais sequer como padrão de referência, que era o argumento anteriormente utilizado para justificá-las. Hoje, a regulação, a concessão e a fiscalização são bastantes para permitir o controle público da qualidade do serviço, sem precisar alocação de capital inexistente nas prefeituras. Tampouco cabem subsídios, ainda hoje praticados inclusive por São Paulo, o maior de todos os municípios brasileiros.>
O transporte de alta capacidade, pelo elevado volume de capital investido, requererá sempre investimento público, a exemplo dos sistemas metroviários, mas a operação privada é o melhor caminho para a eficiência, a conservação, a renovação e a expansão.>
O BRT – Bus Rapid Transit, que transformou o ônibus em um sistema de alta capacidade hoje difundido por todo o mundo, foi criado no Brasil, em Curitiba, pelo arquiteto e ex-prefeito Jaime Lerner. Com o nome de TransMilenio, pela virada do Século, foi implantado em Bogotá, por outro prefeito inovador, Enrique Peñalosa, para ser o principal sistema de transporte daquela capital nacional, uma metrópole de seis milhões de habitantes. Made in Brazil, este é um modelo aplicável tanto a grandes metrópoles, integrado ou não a outros sistemas de transportes, inclusive metrô, mas também um modelo para reinar sozinho em médias e grandes cidades. Um importante banchmarking nacional.>
Constitui, assim, o transporte o mais importante e estratégico serviço público local em relação ao planejamento e desenvolvimento urbano, precisando ser tratado de forma integrada e umbilicalmente articulada com as políticas de urbanização, de habitação e de expansão urbana, para possibilitar que as nossas cidades possam se reinventar, crescer para dentro de si mesma, preservando é claro os sítios históricos e as áreas de valor ambiental, mas sobretudo respeitando os interesses de toda a população, a quem deve ser assegurada um meio urbano de qualidade.>
Waldeck Ornélas é especialista em planejamento urbano-regional. >