Entenda o que muda após homologação da terra indígena Aldeia Velha, no Extremo Sul da Bahia

Homologação do território foi assinada pelo presidente da República na última quinta-feira (18)

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  • Larissa Almeida

Publicado em 19 de abril de 2024 às 19:59

Homologação da terra indígena baiana Aldeia Velha Crédito: Lohana Chaves/Funai

O processo de demarcação da terra indígena Aldeia Velha, iniciado em 1998, teve mais um passo rumo a sua conclusão na última quinta-feira (18). Na ocasião, o presidente da República assinou um decreto de homologação do território em questão, que fica situado em Arraial d´Ajuda, distrito de Porto Seguro, no Extremo Sul da Bahia. Nesse atual estágio, não há mais espaço para contestação dos não-indígenas que têm interesse na área.

Na Aldeia Velha, 1.465 indígenas da etnia Pataxó vivem em uma área que mede cerca de dois mil hectares, sendo que 80% dela é composta pela mata nativa da Mata Atlântica e por uma área de manguezal com cerca de 10 km. O grupo que habita a localidade é relativamente recente e integrado por indígenas desaldeados que viviam na região de Porto Seguro durante o processo de retomada ao território na década de 1990.

Foi esse mesmo povo que viu o início do processo de demarcação do seu território em 1998. Após dez anos de estudo, o local foi reconhecido e delimitado em 2008. Quatro anos mais tarde, passou pelo contrato que demarcou a terra e, agora, quase 12 anos depois, a demarcação foi homologada.

Na prática, o processo de homologação configura uma confirmação da demarcação feita em 2012. “Em cada fase, podia recorrer. [Mas] ao homologar a terra, não tem mais como recorrer. Essa é a importância da terra homologada. Fazendeiros, políticos ou quem quiser recorrer dizendo que a terra não é indígena, já não recorrem mais”, reitera Agnaldo Pataxó Hã Hã Hãe, coordenador geral do Movimento Unido dos Povos e Organizações Indígenas da Bahia (Mupoiba).

Ele destaca que a assinatura do decreto traz tranquilidade ao povo Pataxó da Aldeia Velha. “Até agora, eles enfrentavam a invasão do território e a tentativa de impugnar alguma etapa do processo. Agora, não. Se no território tiver um não-indígena, ele vai ter que sair. Se for de boa-fé, o Governo Federal vai indenizar seus bens. Se for de má-fé, ele tem um prazo para se retirar do território. Então, é muito importante para o povo a terra ser homologada. É a penúltima fase da demarcação”, declara.

Agora, de acordo com a Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai), para finalizar o processo, cabe ao próprio órgão proceder com o registro das terras indígenas na Secretaria do Patrimônio da União e nos cartórios de registro de imóveis, por ser uma terra pública de usufruto exclusivo dos povos indígenas.

A iminência da conclusão desse processo, tendo a garantia de proteção da terra onde nasceu e foi criada, tem sido motivo de celebração para Arnã Pataxó. “Nós estamos muito felizes, é um sonho realizado. Essa carta de homologação veio para dar segurança para os nossos jovens e paz para os nossos anciãos. Muitos estão lutando com a gente e muitos também já se tornaram ancestrais, mas eu tenho certeza de que eles estão festejando conosco. Dia 29, vai ter a comemoração da ocupação do território, mas também vamos comemorar essa conquista. Estamos acionando todos os caciques Pataxó para que venham comemorar conosco”, diz.

Para Angelo Pataxó, professor, liderança e ex-cacique indígena, a homologação é um forte simbolismo de retomada. “Aqui foi o lugar que começou toda a colonização. Fazer uma retomada do que é nosso é muito difícil, é um processo de muita luta, mas para nós significa uma grande vitória, e não só aqui da Aldeia Velha, mas para todos os parentes que iniciaram essa retomada de um território tradicional, os anciões, as lideranças e os parceiros indigenistas. É também motivo de muito orgulho, resistência e memória dos nossos jovens que se foram”, completa.

Processo de demarcação

Segundo a Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai), o processo de demarcação de uma terra indígena passa por cinco etapas. A primeira delas é realizada pelo próprio órgão e consiste no estudo da área reivindicada por indígenas para identificar e delimitar o território. Nesta fase, uma equipe multidisciplinar composta por antropólogos, ambientalistas, historiadores – quando necessário –, engenheiros agrônomos, dentre outros profissionais, são responsáveis por elaborar um estudo e coordenar os trabalhos do grupo técnico especializado que fará a identificação do território.

A segunda etapa só ocorre passado o prazo de contestações administrativas e respostas da Funai. Depois que isso acontece, o relatório é remetido ao Ministério da Justiça e Segurança Pública, a quem cabe avaliá-lo, podendo aprovar, reprovar ou pedir novas diligências. Passado esse procedimento, há a emissão ou não de portaria declaratória pelo Ministério da Justiça de que aquela terra pertence ao povo indígena que fez a reivindicação.

A terceira etapa acontece se a terra indígena em questão for declarada pelo Ministério da Justiça. Uma vez que isso é feito, o processo retorna à Funai para que realize a demarcação física da área, colocando os marcos, as placas e fazendo alguns ajustes que possam ser necessários.

Na quarta etapa, depois que a demarcação física é feita, o processo é encaminhado novamente ao Ministério da Justiça para conferência e, depois, à Presidência da República para homologação. Isso foi o que ocorreu com a Aldeia Velha na quinta-feira (18).

Por fim, a última etapa consiste no registro, feito pela Funai, da terra indígena na Secretaria do Patrimônio da União e nos cartórios de registros de imóveis, por ser uma terra pública de usufruto exclusivo dos povos indígenas.