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Emilly Oliveira
Publicado em 10 de dezembro de 2023 às 21:37
Muitas das canções embaladas por protesto e resistência, cantadas pelo Ilê Aiyê, nascem no Festival de Música Negra (FMN), promovido pelo bloco afro há 49 edições. Neste domingo (10), a etapa final do concurso deste ano, ocorrido na Senzala do Barro Preto, sede do bloco, situada no Curuzu, selecionou mais seis músicas para compor o repertório do bloco em 2024, quando ele completa 50 anos. Foram seis selecionadas, em duas categorias: Tema e Poesia. >
As canções vencedoras da categoria Poesia foram: 'Gratidão', de Julinho Magaiver e Rosseline Leite, com participação de Wallace Fernando, em primeiro lugar; 'Ilê tatuado no peito', de Fábio Esquivel e Bruno Leal, em segundo; e 'Imortal da Cidade' de Josiel Teixeira e André Lima, em terceiro.>
Os vencedores na categoria Tema foram: 'Ilé Bodas de Ouro' de Juca Maneiro, Sandoval Melodia e Roberto Cruz, em primeiro lugar; 'Matriarca' de Marco Poça Olho, em segundo lugar; e 'Alafiou Panteras Negras', de Edson Prodígio e Sérgio Baleiro, em terceiro.>
As canções vencedoras foram escolhidas entre 110 inscritas nesta edição - oito na categoria Tema e nove na Poesia. Do total, 17 foram selecionadas como finalistas pelo júri. Na categoria Tema, os participantes compuseram as músicas inspiradas no tema do Carnaval do Ilê em 2024: 'Vovô e Popó - com as bênçãos de Mãe Hilda Jitolu. A invenção do Bloco Afro. A se não fosse o Ilê'.>
Os compositores das canções vencedoras também foram premiados com dinheiro. Na categoria Tema foram pagos, respectivamente, R$7 mil, R$6,5 mil e R$6 mil. Os contemplados no grupo Poesia receberam R$6,5 mil, R$6 mil e R$5,5 mil. Todos os 17 finalistas receberam o Troféu Pássaro Preto e duas fantasias do Ilê Aiyê para desfilar no bloco no próximo Carnaval.>
O característico tom de protesto contra as desigualdades sociais e raciais e a exaltação da cultura e religiosidade negra embalou todas as canções, especialmente as vencedoras do primeiro lugar de cada uma das categorias. "A música precisa ter uma mensagem de conscientização. Queremos letras que, além de entreter, levem ao conhecimento, à crítica e à consciência negra", disse Sandro Teles, diretor musical do Ilê.>
Para Juca Maneiro e Sandoval Melodia, que garantiram o pódio em Tema, representando o parceiro de composição que não pôde comparecer a Senzala, Roberto Cruz, a inspiração para compor 'Ilê Bodas de Ouro' foi a própria história do Curuzu e o desejo de retratar a negritude como majestade. 'Estar sempre fazendo da nossa música afro, a nossa ponte para a gente sobreviver lá na frente e dizer o que somos de verdade. Somos cultura e ancestralidade”, destacou Sandoval.>
Representando os vencedores em Poesia, Julinho Magaiver, contou que a inspiração para a música 'Gratidão' foi Mãe Hilda. “Essa mulher foi super responsável por tudo que está acontecendo hoje. Eu nasci no Ilê e fui acolhido aqui, usando minha pele branca para lutar pelas injustiças vividas pelo meu povo preto”, destacou o compositor.>
Para Vovô do Ilê, presidente do afoxé, consolidar uma tradição de 49 anos que põe a negritude no centro, é derrubar estereótipos. "Foi assim que começamos a contar nossa história pela nossa ótica e a quebrar a imagem de África como terra de Tarzan, de onça, leão, troglodita. Nada disso. [África] é cultura, forte, pulsante. Essa transformação foi através da música, por isso, isso aqui é tão importante", destacou Vovô.>
Também houve muita música durante a etapa final do concurso. Cada um dos 17 finalistas cantaram suas canções para o público acompanhados da banda do Ilê Aiyê, a Band'aiyê. Compareceram na Senzala admiradores do bloco e os associados. Entre eles, Nonato Patuá, 71 anos, que é sócio do bloco Ilê há 39 anos.>
A paixão pela história do bloco afro mais antigo do Brasil o encantou desde o primeiro tambor que ouviu soar da Band'aiyê. Depois de tantos Festivais de Música Negra e Concurso de Deusa do Ébano, o Carnaval é o que ele mais anseia o ano inteiro. "Ja>
Sobre o Carnaval que marca o meio século de resistência do Ilé, Sandro e Vovô adiantam que contará com artistas de fora da Bahia, além das homenagens à Mãe Hilda. A história do Ilê Aiyê mistura-se à história da vida de Mãe Hilda e do terreiro Ilê Axé Jitolu. >
Por aproximadamente 20 anos, o terreiro serviu ao bloco como diretoria, secretaria, salão de costura e recepção de associados. A conexão entre os dois transcende o espaço: o Ilê tem em Mãe Hilda sua fonte de inspiração, conselho e apoio; e na religião sua fortaleza e sustentação.>
A matriarca também dá nome a escola de ensino básico que funciona na sede do Ilê, a Escola Mãe Hilda, que atende crianças do 1º ao 5º ano, gratuitamente. “Além de entreter, as letras das músicas [do Ilê] servem como ferramentas de ensino dentro de sala de aula, onde fazemos o trabalho de conscientização das crianças através da música e dos blocos afros”. afirmou Sandro.>
Com orientação da subchefe de reportagem Monique Lôbo>