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Maysa Polcri
Publicado em 17 de novembro de 2023 às 16:00
O cotidiano de Matheus Santos de Carvalho, 22, consistia em se dividir no trabalho como auxiliar de padeiro e frequentar as aulas do ensino médio. Tudo mudou quando ele perdeu o emprego, há cerca de quatro anos, e decidiu virar entregador. Em cima de uma moto e sem carteira assinada, Matheus roda 12 horas por dia para ajudar no sustento da família. A realidade do jovem se repete para milhares de pessoas na Bahia, estado em que a informalidade entre negros atingiu o maior patamar em oito anos. >
Apesar de o número de pessoas negras em cursos de ensino superior na Bahia ter aumentado 105% em dez anos, mais da metade dessa população (54,3%) trabalha sem carteira assinada no estado. A taxa de informalidade é a maior desde 2014, quando atingiu o patamar de 54%, de acordo com o estudo ‘Mercado de Trabalho para a População Negra na Bahia’, divulgado nesta sexta-feira (10). >
A pesquisa aponta que em oito anos, entre 2012 e 2020, havia tendência de queda no número de trabalhadores negros informais no estado, com exceção do ano de 2018. O cenário se inverteu a partir da pandemia, quando a taxa de informalidade cresceu sete pontos percentuais em dois anos e atingiu 2,7 milhões de pessoas. Enquanto isso, a taxa de trabalhadores não negros (brancos, amarelos e indígenas) diminuiu e chegou a 48,5% no ano passado. >
“Quando a pandemia chegou ao Brasil, já estávamos em um momento de estagnação econômica. A situação piorou e muitas pessoas ficaram desempregadas. Quando as pessoas puderam voltar a trabalhar depois do isolamento social, buscaram trabalho na informalidade”, explica Ana Georgina Dias, supervisora do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese). >
O estudo foi feito pelo Departamento em parceria com as secretarias estaduais de Promoção da Igualdade Racial (Sepromi) e de Emprego, Trabalho e Renda (Setre). Além de lançar luz sobre a informalidade na Bahia, a pesquisa aponta que mesmo quando os negros possuem maior escolaridade, enfrentam mais obstáculos para se inserir no mercado de trabalho com carteira assinada. >
Na casa do entregador Matheus Costa, na Federação, a situação se repete entre os familiares. O pai dele é dono de um pequeno comércio no bairro e a mãe trabalha como empregada doméstica, quando as oportunidades aparecem. “Assim a gente sobrevive, um vai ajudando o outro”, afirma. Aos 22 anos, Matheus já carrega a responsabilidade de ajudar no sustento da casa. >
O desejo dele é sair da informalidade mas, com apenas o ensino médio completo, é difícil encontrar oportunidades. “Falar em futuro é até um pouco constrangedor. Não tenho expectativa de viver para sempre em cima de uma moto, mas falta oportunidade”, diz. >
Ângela Guimarães, titular da Secretaria de Promoção da Igualdade Racial do Estado da Bahia (Sepromi), que esteve presente no evento de divulgação de pesquisa, no Pelourinho, pontuou que a informalidade entre pessoas negras é uma realidade histórica. “O racismo orienta as relações sociais e determina que, mesmo com maior escolaridade, os negros não alcancem posições de destaque”, diz. >
Para ela, o cenário deve ser combatido com políticas públicas assertivas. “Fazer esse levantamento é o primeiro passo para a consolidação de ações embasadas e efetivas”, ressalta.>