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Da Redação
Publicado em 6 de dezembro de 2023 às 08:30
Unindo elementos da natureza a reivindicações e expressões de revolta, o artista polonês Frans Krajcberg construiu uma obra de pinturas, esculturas, vídeos e fotografias reconhecíveis mesmo de longe. Em especial os troncos e raízes carbonizados de árvores derrubadas pela mão humana, coloridos em sua arte com ‘vermelho, preto, fogo e morte’, como o artista os descrevia. >
Krajcberg, que viveu em Nova Viçosa, no sul da Bahia, de 1972 até 2017, ano de sua morte, doou todo o seu acervo para o Governo do Estado da Bahia em 2009, com o sonho de que o sítio em que morava fosse transformado em um museu e parque ecológico. >
No acervo, estavam o Sítio Natura e mais de 48 mil itens, entre esculturas, pinturas e fotografias, que costumavam ficar no sítio e foram retiradas em 2022, cuja catalogação ainda não foi finalizada. A primeira etapa aconteceu em 2017, oito anos após a doação. De acordo com nota divulgada pela Secretaria de Cultura do Estado (Secult), apenas em fevereiro de 2023 foi aberto o processo para realização do inventário para preservação do acervo. >
Para o professor Roddolfo Carvalho, da Escola de Belas Artes da UFBA, a arte de Krajcberg sempre teve características peculiares, gerando obras de impacto a partir da apropriação dos elementos e materiais da natureza. Segundo ele, por isso mesmo, é necessário que a manutenção seja feita com atenção a cada detalhe.>
“A questão de Frans Krajcberg, especificamente, [é que] ele tem todo um trabalho de buscar tirar esse material primário da natureza e converter em objeto estético. E, a partir do momento em que você tem um material que muitas vezes é tirado de um manguezal, de uma área do semiárido, de uma região específica, você tem que dar a manutenção correspondente ao tipo de estrutura que pertence esse material. Se é madeira, a gente não pode deixá-la exposta em qualquer lugar, ela não pode ficar próxima a áreas muito úmidas se ela não tiver resistência à água, ela obviamente vai ter problemas, acumular fungos e outros tipos de sujeira e pode apodrecer”, diz.>
Segundo o professor, é essencial preservar esse acervo agora. “A gente tem a possibilidade de expandir o campo de pesquisa, o entendimento da nossa própria memória. O momento é agora, para que se tenha nos próximos dez, 20, 30 anos um lastro de pesquisa histórica e artística, de análise museográfica e de materiais, por exemplo”, defende.>
Frans Krajcberg morreu aos 96 anos em novembro de 2017, no Hospital Samaritano, no Rio de Janeiro. Ele nasceu na Polônia, em 1921. Durante a Segunda Guerra, precisou fugir para a União Soviética, se separando dos seus pais. Mais tarde, descobriu que seus familiares morreram nos campos de concentração nazistas.>
Iniciou seu processo artístico na Europa pós-guerra, mas foi no Brasil que ele se tornou um ativista ambiental e artista, transformando a arte em caos conceitual. Desde então, viajou pela floresta amazônica, morou no Rio de Janeiro, Minas Gerais, Paraná e decidiu fixar morada na Bahia entre 1972 e 2017, ano de sua morte. >
Desde então, sua arte e luta pela natureza se tornaram uma só. Entre fotografias, vídeos, pinturas, fotografias e esculturas, o que mais chama atenção são os troncos de árvores, muitos carbonizados, transformados em arte e protesto, como se houvesse uma ressurreição daquela natureza morta.>
“Arte é patrimônio. É patrimônio imaterial, muitas vezes, de toda a população. A partir do momento que a gente dá valor aos artistas que fazem pelo nosso estado, ainda mais uma figura como Frans, que sempre bateu de frente com a mineração aqui na Bahia e com todas as terríveis mazelas que a mineração causou ao nosso estado”, adiciona Roddolfo.>