Antes dos bloqueios, Centro, Boca do Rio e Plataforma têm grande fluxo de pessoas

As três regiões vão receber restrições mais severas a partir deste sábado (9)

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  • Da Redação

Publicado em 8 de maio de 2020 às 05:00

- Atualizado há um ano

. Crédito: Tiago Caldas/CORREIO

Um ponto de ônibus cheio de gente, vendedores gritando para chamar a atenção dos clientes e pessoas caminhando pela rua. Esse era o cenário do fim de linha da Boca do Rio enquanto o prefeito ACM Neto e o governador Rui Costa anunciavam, por volta das 17h20 desta quinta-feira (7), um bloqueio no bairro. A medida, que também vai impor restrições no centro e no bairro de Plataforma, visa diminuir o avanço da pandemia do novo coronavírus em Salvador.

As três regiões que vão receber restrições mais severas a partir deste sábado (9), terão que se reajustar com o fechamento dos comércios não essenciais, as interdições viárias e ao acesso da população - moradores terão que comprovar residência para entrar nos locais.

De acordo com o Censo mais recente do IBGE, de 2010 - este ano também haveria censo, mas o processo atrasou devido à covid-19 - a Boca do Rio possui 48.032 moradores, enquanto Plataforma tem uma população de 34.034 e o Centro registra 15.695 habitantes.

Em meio aos mascarados que circulavam no Centro, na Boca do Rio e em Plataforma, era possível encontrar quem não seguia a recomendação do uso de máscara. Também existiam aqueles que tinham os itens, mas andavam com a proteção no queixo ou pendurada na orelha. “Eu tenho medo da doença, mas não uso a máscara porque abafa”, contou a estudante Laura Souza, 12 anos, enquanto esperava em frente a uma farmácia na região do Largo do Luso, em Plataforma. A localidade será afetada pelas medidas restritivas anunciadas nesta quinta.

Na Avenida Joana Angélica, próximo ao Shopping Center Lapa, o ambulante Adriano Santos relatou que muitos colegas e clientes até têm as máscaras, mas não usam o item da maneira correta. “Boa parte das pessoas chega aqui com as máscaras, mas vão tirando depois de um tempo”, contou.

A falta de preocupação com a transmissão e a infecção pelo coronavírus não era perceptível apenas no uso inadequado da proteção, mas também no fluxo de pessoas nas localidades. Para a professora Lebina Reis, 38, que agora está trabalhando na loja dos pais na Boca do Rio, os moradores do bairro estão relaxando a quarentena cada vez mais. Alguns clientes até já confessaram estar indo na loja só para passear.“Eu nunca trabalhei tanto. As pessoas vêm pra cá e falam que tão cansadas de ficar em casa. Eu tenho que fazer o pessoal sair daqui para não aglomerar. Tem dia que to mais cansada que o normal. As pessoas acham que usar a máscara é suficiente para enfrentar o problema”, disse.A vendedora analisa que o movimento no bairro está muito grande, parecido com o que era registrado antes da quarentena. De acordo com ela, muitas pessoas saem de casa pela manhã para fazer compras e a quantidade de gente nas ruas vai diminuindo pela tarde. “Aqui tem aglomeração. De manhã chega a ser assustador, nem dá para achar vaga para colocar o carro”. Em Plataforma, na av. Suburbana, o fluxo de pessoas e veículos também é intenso (Foto: Tiago Caldas/CORREIO) Muita gente na rua

O relaxamento do isolamento social também é perceptível na Joana Angélica, onde um homem pregava com a máscara no queixo em frente ao Center Lapa quando a reportagem chegou ao local. Morador da região, o músico Djair dos Santos, 59, contou que muitas pessoas estão se aglomerando, em especial perto do Relógio de São Pedro. “O povo não está levando a sério, cada dia que passa tem mais gente na rua. Tem que fazer os bloqueios mesmo”, disse.

Em Plataforma, a quantidade de pessoas na rua também foi aumentando com o passar do tempo. Uma moradora do bairro que não quis se identificar relatou que muitas pessoas ficam na rua o “tempo todo”. De acordo com ela, o anúncio de que algumas lojas poderiam ficar abertas na quarentena causou um efeito indesejado - o que deveria reduzir o fluxo de moradores na rua, incentivou o vai e vem na localidade. “Nas primeiras semanas, a rua tava um breu e, depois desse anúncio, acabou isso. Aqui tá tudo normal, essa avenida está um terror”, disse a moradora.

Há quem acredite, porém, que não há solução para a movimentação em Plataforma. Dono de uma banca de frutas no largo do Luso, Cleidson dos Santos, 38, afirmou que o fato do bairro ser uma passagem para outros locais da cidade impede o isolamento adequado.

“As pessoas saíram mais depois do auxílio. Agora, estão até fazendo coisas de lazer, como compras, visitas aos amigos e idas em restaurantes”, disse o trabalhador informal, que espera que as novas medidas anunciadas pela prefeitura consigam forçar um isolamento.

Saúde e economia

Para quem mora nas regiões, as novas medidas trazem à tona o debate entre a proteção a saúde e a economia. Ambulante, Adriano dos Santos tentava conversar com os colegas. Para ele, o reforço no isolamento no centro é necessário, apesar das perdas econômicas. “Muitas pessoas vão passar dificuldades, mas elas corriam risco de ficar doente e levar a doença pra casa. A gente sabe que é algo extremo e vai doer, mas agora não é hora de pensar só no dinheiro”, disse Adriano.

Dono de uma pequena papelaria na Boca do Rio, José Santana, 53, reconhecer que muitas pessoas ainda estão na rua. “Dia de sábado o movimento é igual a antes da quarentena”, disse.

Para ele, o aspecto financeiro pesa. “A gente que é comerciante, 70% paga aluguel e, por isso, temos que estar aqui trabalhando”, explicou. Com as medidas, ele vai ter que fechar a loja no fim de linha do bairro.

Do outro lado da rua, no Lojão Mania, Lebina reconhece que as restrições são importantes pois os moradores do bairro ainda não entenderam o papel das medidas de isolamento. “Eu sei que a loja do meu pai vai quebrar, a gente não aguenta ficar fechado. Mas a questão da saúde é mais importante”, ponderou.

A banca de frutas de Cleidson, em Plataforma, deve deixar de arrecadar cerca de mil reais durante os sete dias iniciais que deve ficar parada. Mesmo assim, o vendedor sabe que é necessário suspender as atividades em prol da saúde. Entretanto, ele ressalta que os trabalhadores devem receber algum auxílio no período.“A gente fica preocupado com a possibilidade de prorrogar o prazo. Aqui, todos os ambulantes aceitaram a medida porque muitas pessoas estão infectadas. Tem que ajudar o povo porque muita gente aqui depende do trabalho informal”, disse.Os ambulantes e feirantes que atuam no locais afetados terão acesso a cesta básica oferecida pela prefeitura. O benefício será concedido mesmo se o trabalhador estiver recebendo outros auxílios dos governos municipal e estadual.

Denúncias

O Disque Coronavírus, que reúne denúncias de aglomeração ou descumprimento de decretos, recebeu 127.263 ligações entre 16 de março e 03 maio, de acordo com a Ouvidora da prefeitura. Com as ligações, foram registradas 56.987 demandas - quando a informação é registrada, protocolada e encaminhada ao órgão para que sejam tomadas providências. As reclamações dos denunciantes são sobre bares com aglomeração e atividade sonora, além de estabelecimentos comerciais que descuprem os decretos.

Em Salvador, Cajazeiras é o bairro com o maior número de ocorrências. Foram feitas 2.409 reclamações sobre situações que vão de encontro com as medidas de proteção contra  o coronavírus. Os outros bairros mais reclamados foram: Pernambués, Fazenda Grande do Retiro, Paripe, Liberdade, São Marcos e Itapuã. As três localidades que irão receber os bloqueios não integram a lista de lugares com as maiores quantidades de queixas.

Já os locais com a menor reincidência de contestações são as Ilhas de Maré e dos Frades, Horto Florestal, Areia Branca, Alphaville I e II, Horto Bela Vista, Jardim Placaford e Jaguaribe.

Para denunciar, a população pode ligar 160, enviar um e-mail para [email protected] ou mandar a queixa no portal Fala Salvador (www.falasalvador.ba.gov.br). É possível enviar uma foto da situação pelo e-mail e pelo portal, mas o envio não é obrigatório. Para fazer a denúncia é preciso descrever a atividade que está ocorrendo, a quantidade aproximada de pessoas, se há atividade sonora e dar o endereço com ponto de referência.

*Com orientação da subeditora Fernanda Varela