Armando Avena: a Bahia se modernizou, mas segue aprisionada a um enigma

Seja no agronegócio, na cadeia do petróleo e da petroquímica, o estado segue dependente da produção de commodities

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  • Armando Avena

Publicado em 15 de janeiro de 2019 às 05:15

- Atualizado há um ano

. Crédito: foto/Arquivo Correio

Até a metade do século passado, a economia baiana estava presa a um enigma: o enigma baiano. A Bahia de então era um estado rico, gerador de excedentes e com forte especialização no comércio exterior, especialmente na produção de cacau. Mas era também um estado pobre e sem dinamismo, já que o excedente produzido por essa economia não era reinvestido aqui e vazava para outros estados transformando-se em  consumo supérfluo e improdutivo.

O enigma baiano foi decifrado nos anos 50 com a implantação da Petrobras e a construção da Refinaria Landulfo Alves (RLAM), depois com a instalação do Centro Industrial de Aratu e, finalmente, em 1978, com a entrada em operação do Polo Petroquímico de Camaçari. A industrialização parecia ser a saída e, a partir daí, novas indústrias se instalaram na Bahia como o complexo da Ford, o polo de celulose, indústrias de pneus, informática, calçados, bebidas e outras e, mais recentemente, o complexo acrílico da Basf e as empresas de energia eólica.

A economia se fez mais complexa  e a região Oeste transformou-se num dos maiores polos agroindustriais do país, enquanto a fruticultura irrigada, as florestas plantadas, o café, a avicultura e outros segmentos tornavam-se ilhas de modernidade. Ao mesmo tempo, o turismo se expandiu e, junto com ele, a indústria do lazer e do entretenimento, e o estado ampliou sua especialização no setor serviços, hoje responsável por cerca de 70% do PIB baiano. A Bahia se modernizou, mas continua aprisionada a um novo enigma.

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O enigma de hoje é semelhante,  pois a economia baiana permanece vinculada às commodities e suas oscilações no mercado internacional.   Seja no agronegócio, com a soja e a fruticultura irrigada, na cadeia do petróleo e da petroquímica, na celulose ou nos minérios, o que se verifica é o aprofundamento da nossa dependência na produção de commodities agrícolas e industriais. E com um agravante: a Petrobras, que representava 30% do Valor de Transformação Industrial em 2015,  representou apenas 15% em 2017 e está em fase de desinvestimento. A indústria petroquímica ainda permanece atuante, mas sua âncora, a Braskem,  tornou-se uma empresa multinacional e a Bahia já não tem tanta importância no seu portfólio de investimentos. Para completar, essa economia tem enorme deficiência de infraestrutura, o que amplia o chamado custo-Bahia e reduz sua competitividade.

Como decifrar esse novo enigma baiano que nos indaga sobre um estado que  ainda é um dos mais pobres e desiguais do país, cuja industrialização foi excessivamente concentrada em poucos setores e que possui grandes gargalos na sua infraestrutura?

Antes de mais nada, é preciso recriar o sistema de planejamento, que é fundamental pois fornece subsídios às lideranças empresariais e políticas para que elas possam lutar por projetos factíveis e decifrar o novo enigma, a saber:  a) como a Bahia pode aprofundar e diversificar seu perfil industrial e agroindustrial, para inserir-se no novo ciclo de investimentos industriais e pós-industriais?  b) como destravar investimentos estruturantes e fundamentais como a Ferrovia Oeste-Leste, a construção do Porto Sul e a modernização do Porto de Aratu, só para citar os mais emblemáticos? c) como priorizar recursos, orçamentários ou extraorçamentários, para estimular o desenvolvimento e a inovação  tecnológica  e o investimento maciço em educação, fatores que determinam a competitividade no mundo moderno?

A Bahia precisa responder a essas perguntas. Precisa repensar seu modelo econômico, dar-lhe novo rumo, tentando ampliar a transformação de bens no nosso território, verticalizando a produção, aumentando o conteúdo tecnológico da economia, diversificando a base produtiva, estimulando as startups, fazendo turismo de forma profissional e colocando a infraestrutura certa no local certo e na hora certa.

A academia e nossas universidades precisam sair da posição cômoda de doutores da teoria pura e integrar-se ao mercado, articulando-se com a indústria e o agronegócio e gerando conhecimento que se transforme em tecnologia e inovação e possa gerar lucro.  E o poder público necessita agir para, além do trabalho no âmbito da dotação de infraestrutura, estimular a inversão em novas tecnologias e na indústria 4.0 e nos segmentos do agronegócio e criar vantagens competitivas em setores como o turismo e os serviços, atuando como intermediador e catalizador dos novos investimentos.

Armando Avena é escritor e economista. Membro da ALB, é doutor em Ciências Sociais e professor da Ufba. Foi secretário estadual de Planejamento e presidente da Fundação CPE