Ataque em Jaguaribe: bandidos receberam R$ 30 e R$ 50 para transportar atiradores

Os dois motociclistas presos confessaram ao delegado como ocorreu negociação

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  • Bruno Wendel

Publicado em 7 de janeiro de 2021 às 14:53

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(Foto: Arisson Marinho/CORREIO) Observar se havia blitz ou policiais na região, sinalizar a localização do alvo, aguardar a execução e ainda dar fuga aos assassinos. Essas eram as missões dos dois motociclistas que receberam R$ 30 e R$ 50, cada um, para ajudar os atiradores no crime da Praia de Jaguaribe, na tarde de terça-feira (5), quando três pessoas foram mortas e outras duas ficaram feridas.

A dupla foi presa no dia seguinte, nesta quarta-feira (6), após ser reconhecida com o auxílio de câmeras de segurança. As motos usadas no crime foram apreendidas pelo Departamento de Homicídio e Proteção à Pessoa (DHPP), responsável pelas prisões. Ao todo, dois homens armados invadiram a praia.

Segundo a polícia, o alvo do ataque era Lucas Santos da Cruz, 27 anos. Ele ocupava um cargo de liderança da facção Bonde do Maluco (BDM) na Boca do Rio. Lucas era o gerente do traficante Claudomiro Santos Rocha Filho, o Nicão, morto numa emboscada por rivais em Patamares.

No dia do crime em Jaguaribe, Lucas foi surpreendido pelos assassinos na areia da praia e tentou correr, mas foi atingido e morreu no local. A estudante de biomedicina na Escola Bahiana de Medicina e Saúde Pública, Juliana Celina da Santana Silva Alcântara, 20, e o adolescente, Igor Oliveira Lima Filho, 16, que não tinham nenhum envolvimento com os criminosos e sequer conheciam Lucas, estavam na linha dos tiros e acabaram sendo baleados e mortos.  Os dois acusados presos nesta quarta, que não tiveram os nomes divulgados pela polícia, foram localizados no bairro de Valéria. Um deles tem, de 31 anos, tem três termos circunstanciados por posse de drogas.  

“Eles admitiram a participação no crime. Narraram como tudo aconteceu, desde o momento que levaram os autores do crime à praia, até o momento da fuga. Eles também apontaram onde Lucas estava”, disse o diretor do DHPP, delegado José Bezerra,  na manhã desta quinta-feira (7), ao lado do titular da Delegacia de Homicídios Múltiplos (DHM), delegado Odair Carneiro.  Odair Carneiro e José Bezerra falam sobre o caso (Foto: Arisson Marinho/CORREIO) Eles foram pegos em casa. Além das motos, a polícia encontrou com os dois as roupas usadas no dia do crime e os capacetes. “Tudo isso será confrontado com as imagens das câmeras e depoimento de testemunhas. Mas, de antemão, os dois já confessaram e estão colaborando com a investigação”, pontuou Bezerra.  Ao delegado, eles disseram que não tinham contato com Lucas e que foram contratados apenas para levar e dar fuga aos assassinos. “Já temos pistas dos autores e estamos concentrados esforços para localizá-los”, declarou Bezerra.

O bairro de Valéria, onde os motoqueiros foram presos, é também área de atuação da facção Katiara. Perguntado se os dois têm ligação com o grupo criminoso, Bezerra negou. “Nas nossas investigações iniciais, não detectamos até agora a ligação deles com o grupo criminoso”, declarou.  Bezerra disse também que a morte de Lucas está associada a uma desavença antiga, com um grupo rival que também atua na Boca do Rio. Ao ser questionado se atiradores, que estão foragidos, fazem parte de alguma facção, Bezerra prefere manter sigilo. "Estamos ainda no ápice da investigação e, por isso, não podemos dar detalhes que podem comprometer o trabalho da polícia”. Bomba relógio Na quarta-feira (6), o CORREIO retornou à Praia de Jaguaribe e conversou com quem trabalha na praia para saber como está segurança na região. “Isso aqui era uma bomba relógio. Eu sabia que isso ia acontecer, mas não imagina que fosse por aqui”, declarou o proprietário de uma barraca de praia. Ela disse que há quatro anos o tráfico de drogas tomou conta da praia. “Estão fazendo aqui de ponto de venda. E ninguém resolve isso!”, disse ele.  De acordo com ele, o problema vem acontecendo há cerca de quatro anos. “Antes, aqui era frequentado por pessoas de bem, turistas, tinha cliente até da Barra que vinha para cá por causa da tranquilidade e a faixa de areia, que é extensa em relação ao Porto da Barra. Mas, de lá para cá, muitos jovens de vários cantos de Salvador, passaram a frequentar aqui por causa da facilidade de consumir drogas”, declarou. Um garçom relatou que a venda e o consumo de drogas são a qualquer hora do dia. “Eles chegam em grupo sentam e iniciam a movimentação deles. Tem que vem pra cá só para pegar e vai embora. Outros ficaram por aqui mesmo. E a gente não pode falar nada, casa contrário morre”.  Questionados nesta quinta (07) sobre a denúncia, o diretor do DHPP, delegado José Bezerra disse desconhecer a situação. “Não há relatos disso, pelo menos não chegou até nós, mas peço que toda denúncia seja realizada ao Disque Denúncia (3235-0000)”, declarou.  Crime Por volta das 15h desta terça-feira (5), banhistas se divertiam na Praia de Jaguaribe, quando  dois homens armados invadiram a faixa de areia atirando contra Lucas, que correu, mas foi alcançado e morto no local. Juliana Celina e o Igor estavam na linha dos tiros e acabaram sendo atingidos e mortos. 

A mãe de Juliana Celina estava na hora quando a filha foi baleada. “Diante da situação, ela passou mal”, disse Bezerra, esclarecendo que a mulher não foi baleada, conforme informação dada anteriormente por autoridades. Já André Luiz Cunha dos Santos, que também não tem envolvimento com a criminalidade, foi atingido e sobreviveu. Ele foi levado para o Hospital Geral do Estado (HGE), onde passou por cirurgia. No dia seguinte, o trecho onde ocorreu o ataque não tinha cadeiras, garçons, movimentação de ambulantes, sequer havia alguém tomando sol. Era um vazio na extensão da sempre cheia Praia de Jaguaribe. As marcas da violência ainda estavam na areia com os rastros de sangue das vítimas. A barraca ainda permanece fechada, mas, na quarta-feira (06), o CORREIO conversou com um dos funcionários que foi ao local somente para limpar uma cadeira usada pela estudante de biomedicina Juliana Celina. Ela estava com a mãe e o primo sentados debaixo de um guarda-sol próximo onde Lucas e o seu grupo estavam.  Ele falou também que Igor era cliente da barraca, que por várias vezes o adolescente comprava água de coco quando terminava o futevôlei.