Briga entre grupos rivais deixa três mortos e dois feridos em Castelo Branco

Mãe caminhou 1,5 quilômetro para conseguir caixão pro filho

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  • Bruno Wendel

Publicado em 23 de março de 2021 às 17:00

- Atualizado há um ano

. Crédito: (Foto: Bruno Wendel/CORREIO)

Assim como viver, morrer também demanda dinheiro. Com a grana contada para voltar pra casa, a doméstica a Maria*, 39 anos, andou por 1,5 quilômetro do Instituto Médico Legal Nina Rodrigues até uma funerária conveniada com a prefeitura, na Federação. Ela encarou o sol forte, de 29ºC, na manhã nesta terça-feira (23), porque queria enterrar o filho de maneira digna. O vendedor de temperos Ezequiel da Cruz Reis, 19 anos, é um dos três rapazes que foram assassinados nesta segunda, no bairro de Castelo Branco. Outras duas pessoas ficaram feridas.  "De verdade, não sei o que aconteceu. No domingo (20) ele trabalhou pela manhã, almoçou em casa e saiu para beber à tarde, foi encontrar com os amigos. Na segunda, soube que ele e mais dois estavam mortos. Nenhuma mãe espera enterrar o filho. Independentemente de qualquer coisa, quero dar enterro digno e, por isso, vim até aqui, andando, mas consegui", declarou Maria, pouco depois de deixar a funerária, por volta das 10h, na companhia da sogra da filha, que é auxiliar de limpeza e tem 43 anos. Além de Ezequiel, morreram Carlos Roberto de Jesus Santos Junior e Bruno Oliveira Sales Benvindo, ambos de 24 anos. Os três foram encontrados na Rua Adriana Faria, localidade conhecida como “Creche”, limite entre os bairros de Sete de Abril e Castelo Branco. A mãe de Ezequiel e a sogra da irmã dele também moram em Castelo Branco, mas disseram não conhecer Carlos e Bruno.  Em relação ao triplo homicídio, a Polícia Civil informou que a Delegacia de Homicídios Múltiplos (DHM), com apoio da 2ª Delegacia de Homicídios (DH/Central), investiga o confronto entre integrantes de grupos criminosos rivais, que resultou nas mortes dos jovens. Na mesma ocorrência, a PC informou que outras duas pessoas foram baleadas. "Durante a troca de tiros, dois homens ficaram feridos, um deles teve o mandado de prisão, referente a tráfico de drogas, cumprido por equipes do DHPP (Departamento de Homicídio e Proteção à Pessoa)".

Usuário  Apesar do posicionamento da polícia, a mãe de Ezequiel disse que o filho nunca foi preso e não tinha envolvimento com a criminalidade, mas confirmou que ele era usuário de maconha. “Hoje em dia, qual o jovem que nunca fumou um cigarro (maconha)? Mas o meu filho trabalhava para pagar as contas dele e ajudar nas despesas da filha de três anos”, disse ela.  Ezequiel morava com a irmã e o cunhado na Terceira Etapa de Castelo Branco. “Ele trabalhou a manhã inteira de domingo, vendendo temperos da entrada do bairro até a terceira etapa. Depois de muito andar, ele foi pra casa, almoçou e dormiu um pouco. Finalzinho da tarde, saiu para beber, como todo jovem, e não voltou. Ficamos preocupadas. No dia seguinte acordei com a notícia dele morto”, contou a mãe do rapaz.  Os corpos foram encontrados na Rua Adriana Faria, na Creche (Foto: Burno Wendel/CORREIO) Ela disse desconhecer o motivo pelo qual o filho foi assassinado. “ Não faço ideia. Ele não tinha inimigos. Era uma pessoa adorável com todo mundo, tanto que muita gente fazia questão de comprar os temperos nas mãos dele. Eu sou a primeira pessoa que querer saber o porquê e quem foi”, declarou a mãe, pouco antes de encerrar a conversa

A Polícia Militar contou disse que, por volta das 7h, policiais da 47ª Companhia Independente da PM (CIPM/Pau da Lima) e 50ª CIPM (Sete de Abril) foram acionados para atender uma ocorrência de disparos de arma de fogo, na rua da Abelha, entre os bairros Castelo Branco e Sete de Abril. No local, as guarnições encontraram três mortos por disparos de arma de fogo.  A PM informou ainda que, antes desse episódio, por volta das 4h, policiais da 47ª CIPM, foram informados que dois homens feridos por disparos de arma de fogo deram entrada na Unidade de Pronto Atendimento (UPA) de São Marcos, socorridos pelo Samu. 

Creche Na manhã desta terça, o CORREIO esteve na Rua Adriana Faria, na localidade da “Creche”. O local onde os três corpos foram encontrados fica atrás de uma igreja católica. Uma das poucas pessoas que aceitou falar com a reportagem, uma senhora que aparentava ter mais de 70 anos, disse que estava em casa quando escutou muitos tiros. Segundo ela, a situação é comum na região, já que facções criminosas acirraram uma disputa. “Até outro dia, não era assim. Agora, é tiro todo o dia. A briga é entre eles, disputa por espaço, e a população é quem paga o pato. Outro dia, estava evangelizando na rua e eles começaram a atirar um no outro. Me vi num fogo cruzado e me joguei no chão. A situação está tão perigosa aqui, que nem Uber quer vir”, contou.  A idosa disse que entre os baleados há um inocente. “Todo mundo está comentando que uma pessoa que não tinha nada a ver foi baleada. Mas não sei se morreu. É o que o povo diz. Quando a pessoa é ruim, todos sabem. A mesma coisa acontece com quem é do bem. O que eu sei que ontem foi tanto tiro, mas tanto, que não ficou ninguém na rua. Foi um ‘salve-se quem puder’”, disse.  Já um outro morador, visivelmente mais velho, relatou que a rixa é entre os traficantes de Castelo Branco que não querem perder o território da Creche para os rivais de Sete de Abril. “O final da Creche faz divisa com Sete de Abril, onde é uma outra facção. Aí o pau come. A bala para todo o lado”, relatou.  

* Nome fictício, alterado a pedido da entrevistada.