Chega de saudade: Micareta de Feira está confirmada para setembro

Evento estava suspenso desde 2020; este ano, serão quatro dias de festa, entre os dias 15 e 18

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  • Da Redação

Publicado em 7 de julho de 2022 às 14:28

- Atualizado há um ano

. Crédito: ACM

Tu vens, tu vens. Eu já escuto os teus sinais. O São João passou, mas outra festa já está por vir em Feira de Santana. Após dois anos de suspensão em função da pandemia, a tradicional micareta da cidade está confirmada para acontecer no próximo mês de setembro, segundo anúncio do prefeito Colbert Martins. Procurado, o secretário da Cultura, Esporte e Lazer do município, Jairo Carneiro Filho, confirmou quatro dias de festa, entre 15 e 18 de setembro. Na quarta-feira (6), o prefeito havia afirmado à TV Subaé que o evento aconteceria entre os dias 16 e 18 de setembro. A perda de um dia de festa, no entanto, não agradou aos foliões. A gerente comercial Karla Belmonte de Souza, 45 anos, chegou a marcar Colbert em uma publicação no Instagram, onde protestava contra a decisão. Karla é frequentadora assídua da micareta desde 1987, quando ainda tinha 10 anos. “Antes, era de quarta a terça-feira, quase oito dias de festa na avenida Getúlio Vargas, era ótimo. Depois foi para a Presidente Dutra e ficou de quarta a domingo, com bandinhas. Aí veio o trio, o bloco, e passaram a ser quatro dias”, explica.  A micareta de Feira, patrimônio cultural imaterial do município, acontece desde 1937 e, com mais de 80 anos de história, só não foi realizada duas vezes antes da pandemia: durante a Segunda Guerra Mundial, em 1945, e com o golpe militar em 1964. “Dois anos sem micareta é de lascar o folião. Mesmo reclamando, eu tô indo”, diz Karla, que ainda não está confiante com a realização da festa em setembro. “Ele [o prefeito] disse, mas sempre volta atrás”. 

Estrutura A prefeitura e os trabalhadores do setor de eventos, no entanto, estão se movimentando. De acordo com o secretário Jairo Carneiro, a confirmação da data vem de um extenso diálogo com todos os segmentos envolvidos — artistas, lojistas, imprensa, empresários do entretenimento e blocos. Ainda em fase de planejamento, a gestão municipal tem reuniões agendadas com a Polícia Militar (PM), Coelba, e todos os órgãos que atuam na micareta. Procurada, a PM confirmou que prepara a estrutura que atenderá ao evento em setembro. 

Foram separados aproximadamente R$ 4 milhões para atender aos festejos do município, não somente a micareta. “Vamos tentar otimizar para realizar uma festa bonita”, afirma Jairo Carneiro.  Na última terça-feira (5), a prefeitura publicou no Diário Oficial do Município a licitação para contratação de empresa para locação de trios elétricos, mini trio e carro de apoio para a Micareta e demais eventos coordenados pela Secretaria de Cultura.  Já os artistas têm outra agenda. Os cantores e bandas locais em início de carreira estão se credenciando junto à prefeitura, para que sejam contratados. E aqueles de maior notoriedade passam a ser contatados pela gestão a partir desta quinta, após a definição da data. Em maio, a Câmara Municipal aprovou uma lei que determina o escalonamento entre artistas locais e nacionais. Os camarotes privados também confirmam a presença na festa. Segundo o proprietário de camarote e jornalista fundador da Revista Afirmativa, Girlanio Guirra, integrante dos grupos que pediram a mudança da micareta para o mês de setembro, a categoria entrou em contato com a mesma empresa que fez a estrutura do Lollapalooza, em São Paulo, para montar os camarotes de Feira de Santana. Mesmo antes da pandemia, já era discutida a mudança da realização da micareta de abril para setembro, devido às fortes chuvas que atingem a cidade durante o período. “Tem um grupo do qual faço parte de diretores de bloco, camarote, e lojistas, comerciários, rede hoteleira… levamos a sugestão [do evento em setembro] para o prefeito e ele acatou. De primeira vai ser um teste, mas um teste já valendo, a gente está tendo todo o cuidado com a Secretaria Cultural e prefeitura para ser grande. A ideia é que a data perdure”, afirma Girlanio. Segundo Walter Lima, um dos idealizadores do Bloco Lá Vem Elas, os organizadores da festa estavam sendo prejudicados pelo período chuvoso de abril. “Estava comprometendo pra caramba o padrão da festa. Muita gente perdendo dinheiro — ambulantes, rede hoteleira, artistas”, afirma.  Com 39 anos à frente de um dos blocos mais irreverentes de Feira de Santana, Walter agora só tem um desejo: “Botar meu bloco na rua de fato agora, e fazer um ótimo desfile como a gente sempre faz”. Segundo o folião, este ano promete ainda o desfile de um maior número de blocos. Enquanto a Secretaria da Cultura não pode confirmar a quantidade de grupos, Walter afirma que houve um fenômeno de diminuição de blocos de rua e agora, com o retorno, estão surgindo alguns outros. “A gente vê isso com bons olhos”. 

Saudade Além de Karla e Walter, muitos são os saudosos da tradicional micareta de Feira de Santana. O cantor, empresário e produtor musical Paullo Bindá comemorou a notícia do retorno nesta quinta-feira (7), junto a um grupo de mais de 50 artistas do município.  “Se falava da micareta, mas de forma subjetiva, mas aí veio a confirmação. Estamos recebendo a notícia com muita alegria, a classe artística. Afinal de contas, o setor artístico aqui da região, os músicos, dependem muito da micareta, e a fomentação de uma festa dessas vem para oxigenar todo mundo, além de perpetuar e continuar a tradição", diz.

Bindá conta ainda as dificuldades que enfrentou durante o período da pandemia, quando a micareta não pôde ser realizada. "Nós fizemos lives e eventos particulares com o público reduzido. Mas eu que sou produtor e tenho um estúdio, tive que pegar auxílio do governo porque o estúdio ficou zerado. Nós tínhamos um faturamento em janeiro e fevereiro, mas quando foi março o faturamento zerou”, conta.  Toda a cadeia de trabalho de Paullo depende do entretenimento. Dono de um estúdio, aparelhos de iluminação e cantor, não teve outros meios para faturar durante a pandemia. Junto a ele, outras oito famílias que trabalham em conjunto foram prejudicadas. “Eu senti muito, porque toda minha cadeia foi zerada”, afirma.  Apesar da saudade, Bindá diz que ainda não pensa que essa primeira micareta de setembro será como as anteriores. “As pessoas estão assustadas por causa da pandemia. Vai ser uma micareta atípica — fora da data normal, em pandemia… imagina um evento grandioso de 150 mil pessoas na rua, circulando, com apenas um circuito”, afirma. 

Pandemia  Assombrando todo e qualquer evento desde 2020, o coronavírus ainda assusta a população e pode ser um fator para suspender por mais um ano a festa. De acordo com o secretário de Cultura de Feira de Santana, no entanto, dentro do cenário atual, não é visto nada que possa impedir a festa de acontecer.  "Nós estamos agora em período pós São João e São Pedro, até o dia 15 devemos ter um panorama de consequências referente aos festejos juninos. Até agora, está tudo dentro da previsão”, afirma.  O secretário afirmou sem muitos detalhes que existem critérios para a festa ser realizada e que “de forma alguma a gestão irá tomar algum tipo de posicionamento de maneira irresponsável”.  De acordo com a Secretaria Estadual de Saúde da Bahia, no momento não há nenhuma restrição para realização de festas, e o cenário é avaliado constantemente. Em junho, foram diagnosticados 1.117 casos de Covid-19, em Feira de Santana — maior quantidade registrada nos últimos três meses. O município não presenciava este aumento desde abril, quando a média de exames positivos era quatro por dia.   Mas mesmo com o crescimento significativo de casos, nenhuma morte foi registrada e, no momento, duas pessoas estão internadas por complicações da doença no município, de acordo com o último boletim divulgado pela Vigilância Epidemiológica da Secretaria Municipal da Saúde. De acordo com o infectologista Robson Reis, professor da Escola Bahiana de Medicina, é notável o aumento de casos de Covid-19 no país como um todo, e principalmente no Nordeste após os festejos juninos, mas não há uma grande pressão no sistema de saúde, nem maior número de internamentos. “Tem sido discutido nesse segundo semestre a realização de grandes eventos, principalmente no formato de micaretas e carnavais fora de época. Nós sabemos que esses eventos costumam reunir uma grande quantidade de pessoas, muitas vezes aglomeradas em espaços pequenos, e sem dúvida isso acaba favorecendo o risco de doenças infectocontagiosas, principalmente de transmissão respiratória. Mas vale lembrar que essas festas muitas vezes são não somente atividades recreativas, mas sociais, culturais e que exercem uma importância grande para o turismo local e também para o setor da economia”, afirma.

*Com supervisão da chefe de reportagem Perla Ribeiro