Com óleo no mar, pescadores param atividades em Conde

Hotéis, pousadas e restaurantes também sentem os impactos da mancha de resíduos

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  • Da Redação

Publicado em 9 de outubro de 2019 às 05:30

- Atualizado há um ano

. Crédito: Arrison Marinho/CORREIO

Na terça-feira (8), o mar não estava para peixe nas praias do município de Conde devido às manchas de óleo, que chegaram na costa baiana na última sexta-feira. Os pescadores da região que foram para o oceano tiveram que voltar para a terra firme.

A decisão foi motivada pelo alerta da da colônia de pescadores da cidade. O presidente da associação, Givaldo Batista dos Santos, explicou que os pescadores são instruídos a não saírem para o mar porque não se sabe se o óleo é prejudicial à saúde. “Os barcos que saíram antes já conseguiram pescar. A gente tá dizendo para eles não fazerem nada enquanto o piche tá aí, porque ninguém sabe a origem. Se trouxer um veneno, pode fazer mal para o trabalhador”, contou. Mesmo quem deseje descumprir as indicações e entrar no mar, vai ter problemas. Givaldo explicou que as redes saem da água sujas de piche.

De acordo com ele, os trabalhadores vão deixar de pescar cerca de uma tonelada por dia. Com o impedimento, os membros da colônia já estão perguntando para o presidente o que pode ser feito para manter o sustento da casa. 

O pescador Paulo Valdeci Silva contou ter tirado a rede no mar na segunda-feira (7). Ele tem medo de se contagiar com alguma substância tóxica ao ter contato com o produto. Antes de parar a pesca, Paulo já usava luvas para realizar o trabalho.“Eu tirei minha rede porque não sei o que é esse óleo e não quero me responsabilizar [se acontecer alguma coisa com os compradores]”, disse Paulo.Conhecido como seu Peteca, Valdomiro Oliveira, foi um dos pescadores que estavam no mar. Ele voltou para casa, em Poças, na segunda-feira (7).  “Lá na área que a gente pesca não tem resíduo. A gente começa a ver o óleo a umas 4 milhas da praia. Segunda, a gente passou por muitas manchas de óleo”, relembrou.

O pescador acredita que os peixes não estão contaminados porque “foram pescados muito fundo”. Peixe morto coberto de óleo em Conde (Arrison Marinho/CORREIO) Os moradores da região também não demonstraram muita preocupação com uma possível intoxicação. A enfermeira Tainara Neto disse que vai continuar a comer frutos do mar. Segundo ela, os moradores contam que o maior problema é para tomar banho de mar, já que sempre gruda uma pedaço de óleo no corpo dos banhistas.

Outro morador que não demonstra preocupações é Breno Santos. O jovem de 17 anos tem costume de surfar na praia de Sítio do Conde e foi ao local na terça para tentar ajudar na remoção dos pedaços de óleo. “Eu queria ajudar as pessoas a tirar o óleo porque com o óleo não dá para surfar. Ninguém disse nada”, afirmou. Ele disse que mexer no resíduo com a mão “não tem nada não”.

Contaminação Segundo a Secretaria da Saúde do Estado (Sesab), não há registro de casos de atendimento nas unidades de saúde devido ao contato com a substância. Mesmo assim, o manuseio não é recomendado por especialistas – o ideal é usar luvas. 

De acordo com o professor Francisco Kelmo, diretor do Instituto de Biologia da Universidade Federal da Bahia (Ufba), quem se alimentar de peixes e mariscos que ingeriram o óleo corre riscos de envenenamento – desde uma reação alérgica até algo mais grave.

Se for alguém que tem uma pele muito sensível, o contato pode desencadear uma alergia na pele. As consequências podem variar de pessoa para pessoa, além da quantidade do material. “Por isso, a recomendação é geral: não pegue e não se alimente de mariscos e peixes que tiveram contato com o óleo”, reforçou Kelmo.

De acordo com os moradores da região, a prefeitura não fez alerta algum sobre possíveis intoxicações pelo óleo nem como agir nesse caso. Entretanto, o coordenador da secretaria do meio ambiente do Conde, Cláudio Teles, afirmou que a prefeitura comunicou a população sobre as manchas de óleo por meio das redes sociais. Agentes trabalham na retirada das machas de óleo em Sítio do Conde (Arisson Marinho/CORREIO) De acordo com Teles, a prefeitura monitora a mancha de óleo desde a última sexta-feira (4). Nesta quarta-feira (9), mais 60 pessoas vão se juntar às equipes do Inema e do Centro de Defesa Ambiental, órgão que é integra a Petrobras, para reforçar a limpeza da costa no município.

Óleo no mangue Agora todos os pescadores da praia da Barra da Siribinha pararam de pescar no mar. Resta apenas o rio. Entretanto, essa fonte de recursos pode estar comprometida. Os pescadores acreditam que o óleo deve chegar ao mangue com a cheia da maré. 

José Batista é um dos que tira o sustento do rio. “Se o óleo chegar no rio, pode dar problema no aratu e no caranguejo. Até agora está normal, vendo meu peixe para os comerciantes e na feira”, disse.

A prefeitura também se preocupa com a possibilidade do óleo chegar ao mangue, na península da Siribinha. “Segundo os pescadores, a maré fica mais e se houver a entrada no mangue, pode infectar uma grande área. A gente está tentando fazer uma contenção nessas áreas, através de bóia. A área de mangue é bem sensível, tem muito marisco ali e pode ter uma mortandade e a comunidade vive da pesca artesanal”, afirmou Teles. De acordo com ele, alguns resíduos já chegaram ao mangue, mas ainda em níveis baixos e não preocupantes.

Setor turístico se preocupa O turismo da cidade do Conde já registra prejuízos com chegada da mancha em menos de uma semana. “No final de semana, tivemos seis cancelamentos de grupos de pessoas que deixaram de vir por conta das manchas de óleo”, disse Carlos Joilson Rios, recepcionista de um hotel em Sítio do Conde.

“Esperamos que nos próximos dias consigam limpar tudo, pois o hotel está com reservas lotadas para o próximo final de semana. A mancha de óleo está a 50 metros do hotel”, afirmou Joilson, segundo o qual o hotel recebeu seis funcionários da Petrobras na sexta-feira (4).

O hotel Portal do Mar fica na mesma praia e também teve reservas canceladas. O dono do estabelecimento, Josué Ribeiro, afirmou que foram 12 desistências no último final de semana. Já para o feriado do dia das crianças, no sábado (12), foram quase 20 cancelamentos e outros hóspedes já informaram que podem não viajar. “Aqui é um hotel bem familiar, sempre vem os pais com os filhos, por isso estão com medo. Para o feriado, estamos com uma certa apreensão porque o pessoal tá vendo as notícias”, pontuou.

Em Siribinha, o movimento caiu na pousada Sol de Verão. O gestor do estabelecimento, Ediel Paiva, conhecido como Didi, contou que reservas já foram canceladas. Agora, a família de cinco pessoas que depende do lucro da hospedaria tem que esperar um pouco mais para ver a pousada lotada. “É complicado porque no inverno inteiro a gente não consegue ter cliente. A partir de agora que começaria a ter esse movimento e com esse óleo quem viria não vem mais”, ressaltou

De acordo com o gerente de planejamento e gestão da secretaria de turismo de Conde, Lúcio Rufino, são 55 hotéis, pousadas e restaurantes registrados na prefeitura. Ainda há outros estabelecimentos que não foram contabilizados pelo município e os que só abrem para o verão.

Em Esplanada, a mancha de óleo atinge a praia do Baixio e de Mamucabo, contudo donos de hotéis relataram que o turismo ainda não foi afetado. A reportagem não conseguiu contato com a prefeitura de Esplanada.

Em Jandaíra, as manchas atingem os povoados de Mangue Seco e Coqueiro. A Prefeitura informou que faz uma mobilização para auxiliar na limpeza, junto com o Inema e Petrobras.

No Litoral Norte da Bahia, segundo hotéis e pousadas consultados pelo CORREIO, não existe associação que os represente. Barraca de Joseval Santos é afetada pela falta de banhistas (Marina Hortélio/CORREIO) Mesmo em baixa temporada, os restaurantes da região também começam a sentir a o impacto dos cancelamentos e da redução do número de banhistas. Joseval Santos é dono do Village do Pu, em Sítio do Conde. Em dias de semana, são cerca de seis mesas ocupadas na barraca de praia. Nesta terça, apenas um casal estava consumindo no local.

“Agora, na baixa estação, eu vendo até R$ 600 por semana. Mas na segunda, eu só vendi R$ 88”, disse Joseval.

Os frutos do mar servidos no restaurante Recanto do Mar são do mês passado. O dono, Jessé Costa, escolheu não comprar peixes com os moradores da Siribinha por agora. De acordo com o coordenador da secretaria do meio ambiente, a maior parte da população na localidade vive da pesca.

*Com orientação da chefe de reportagem Perla Riberio