Conheça Dayane, deputada mais votada da Bahia que quase foi vice de Bolsonaro

'Ele falou que precisava de voz feminina, nordestina', lembra professora feirense

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  • Vinicius Nascimento

Publicado em 9 de outubro de 2018 às 04:00

- Atualizado há um ano

. Crédito: Foto: Reprodução/Facebook

Foto: Reprodução A história de Dayane Jamille Carneiro dos Santos Pimentel dialoga muito bem com o velho clichê: o mundo dá voltas. Há alguns anos ela ajudava um tio filiado ao PT a fazer campanha para o partido, e tinha na esquerda sua identificação política. Hoje, se apresenta como “A Federal de Bolsonaro” em uma de suas redes sociais e, para honrar o título, foi eleita com recorde de votos, no último domingo (7), para a Câmara dos Deputados.

Mais conhecida como Professora Dayane Pimentel, a baiana de Feira de Santana alcançou 136.742 votos, o que a tornou a quarta mais votada entre todos os 473 candidatos à Câmara Federal na Bahia.

Mas a vitória nas urnas baianas quase não aconteceria por um detalhe: há três anos, ela era cotada para ser a candidata a vice-presidente de seu líder político, que enxergava nela, já naquela época, uma boa opção para diminuir a resistência entre os eleitores do Nordeste, única região onde não venceu em nenhum estado no primeiro turno da eleição, no domingo (7).

A futura deputada federal conta que o presidenciável chegou a comentar que as qualidades poderiam melhorar a imagem diante de uma parte do eleitorado que ainda não tem maioria da preferência."Ele falou que haveria muitos bônus porque ele precisava de uma voz feminina, nordestina. Sendo professora, seria excepcional", relembrou a professora, em entrevista ao CORREIO.Segundo ela, Bolsonaro sabia de sua toda trajetória, inclusive o fato de ser uma ex-simpatizante do PT. "Eu sou uma ex-esquerdista e isso quebraria uma série de rótulos que empregam a ele", reforçou Dayane.

O desempenho nas urnas, como candidata ao Congresso, também quebrou paradigmas. Trazendo o recorte para a ala feminina, a professora, em sua primeira tentativa, teve cerca de 10 mil votos à frente de Alice Portugal (PCdoB), deputada reeleita e que também integra o grupo dos dez mais votados pelo baianos na eleição para deputado federal.

A pujança nas urnas também pode ser ilustrada pelos 32 mil votos a mais do que a senadora Lídice da Mata (PSB), que fecha a lista de baianas escolhidas para a Câmara Federal.

Idade barrou Bom, diante da preferência do capitão - que confessou nutrir profunda admiração por ela -, mas o convite não pôde avançar porque a professora não possui a idade mínima para concorrer ao cargo.

Assim como presidentes e senadores, os vice-presidentes precisam ter pelo menos 35 anos para concorrer - e Dayane, nascida no dia 30 de janeiro de 1986, só tem 32. Não deu, mas o apoio declarado (ver abaixo) se converteu em vitória nas urnas.

Quem acabou como vice-presidente da chapa encabeçada por Bolsonaro foi Hamilton Mourão, general que foi transferido para a reserva do Exército no início deste ano.

Primeira viagem Dayane é a única eleita que faz estreia na vida política. Tanto Lídice quanto Alice já têm um histórico consolidado: a deputada comunista vai para o quinto mandato consecutivo em Brasília, além de dois mandatos na Assembleia Legislativa (Alba) entre 1994 e 2003. A socialista tem um currículo ainda mais longo: já foi vereadora, prefeita de Salvador, deputada estadual e federal, e ainda tem a passagem pelo Senado. Já Dayane sequer havia se candidatado em outra eleição. Sorte de principiante? Ela acredita que não.

As redes sociais foram o principal meio de campanha da nova deputada. Seu perfil no Facebook tem 164.226 pessoas curtindo além de outros 192.273 seguidores. Outra rede social muito utilizada por Dayane é o Instagram, que um dia após as eleições registrava 32,9 mil seguidores.

Na última segunda-feira (8) ela publicou uma imagem agradecendo aos eleitores que confiaram o voto em suas ideias e ideais. Nesta mesma publicação, que tem pouco mais de 10 mil curtidas, os seguidores a parabenizaram e fizeram votos para fortalecer a campanha de Bolsonaro na corrida presidencial - o candidato está no segundo turno concorrendo com Fernando Haddad (PT).

A própria candidata confessa que as redes sociais foram um ponto fundamental para a votação expressiva. Segundo pró Dayane, foi através de seus vídeos e publicações que ela conseguiu chegar até o seu eleitorado que são pessoas “conservadoras por natureza e não aguentam mais um país dominado pela esquerda”.

Dayane possui especialização em Educação de nível superior, mas nunca chegou a ensinar em nenhuma faculdade porque estava grávida no mesmo período em que conseguiu a titulação. Após o parto de seu filho Nicolas, hoje com 3 anos, ela diz que mergulhou de cabeça no projeto político.

Capitão é da família Diferente do que acontece com Mourão, Bolsonaro e Dayane têm uma relação muito boa e com poucas rusgas. Ela conta que “Bolsonaro é praticamente alguém da família”. A relação nasceu há cerca de três anos quando um vídeo do filho de Dayane, à época com um mês de vida, chegou até o candidato à Presidência.

“O meu bebê com um mês de vida já fazia propaganda para Bolsonaro de uma forma inusitada. Todo o mundo queria saber quem eram os pais daquela criança e aí um vídeo meu chegou até Bolsonaro e ele quis me conhecer. Entramos em contato com ele, ele me fez o convite e, desde então, estamos juntos”, juntos”, relembra Dayane.

Apesar das portas abertas, ela não pensa em um cargo maior. Pelo menos por enquanto, a prioridade é fazer valer o voto dos mais de 130 mil conservadores que digitaram seu número nas urnas baianas no domingo.“Eu acho que o brasileiro começou a entender suas reais necessidades. O Brasil quer resgatar a segurança, emprego, levantar a família, valores cristãos e o patriotismo que se perdeu durante esse tempo que a esquerda esteve no poder”, declarou a futura congressista.'Puxou' desafeto Dayane faz parte do Partido Social Liberal (PSL), o mesmo de Bolsonaro. Na Bahia, a legenda faz parte de uma coligação que conta com outros três grupos partidários: PRTB, PPS e PHS. Este último é o partido de Igor Kannário, cantor baiano que exercia o cargo de vereador após ser eleito em 2012 e também acaba de ser eleito deputado federal. O feito do pagodeiro só foi possível com seus 54.858 votos por conta dos votos da professora.

A explicação está no coeficiente eleitoral. A votação de Dayane Pimentel foi muito expressiva e acabou “puxando” mais dois candidatos da coligação para a Câmara Federal. Um deles o pastor Abílio Santana, que teve 50.345 votos, e o outro foi Kannário, um candidato com ideias que vão de encontro a tudo que Dayane acredita, segundo ela.

Temas como redução da violência policial e legalização de drogas como a maconha são amplamente defendidos por Kannário e combatidos por Dayane."Quem puxou o segundo colocado (Kannário) foram os eleitores dele. Somos antagônicos e no que depender de mim as bandeiras dele serão todas derrubadas pelas leis que criarei e votarei", prometeu.A deputada eleita diz que representa "a ordem, os policiais, a igreja, o progresso" e que luta "contra todos que pensam o contrário".

Projetos A professora Dayane só assume a cadeira no início do próximo ano, mas já tem alguns projetos em mente para propor em seu mandato. O principal dele é um que já existe e gera polêmica no país: o Escola Sem Partido.

"Eu acredito que aprovando a Lei Escola Sem Partido já estamos dando 80% de um passo bem largo. Eu tenho vontade de retomar o ensino moral e cívico, quem sabe também o ensino religioso. Eu acredito que essas duas esferas podem contribuir muito com a disciplina, hierarquia e a ordem dentro das nossas salas de aula", adianta.

Dayane também quer derrubar o estatuto do desarmamento e promete lutar do início ao fim por isso.

Passado na esquerda e influência do marido Dayane vive e segue hoje valores ultraconservadores, mas não foi sempre assim. A deputada do PSL tem um “passado esquerdista”, que ela fala com naturalidade. A professora diz que esse passado se deve ao fato de o Brasil ser um país que, após a redemocratização, viveu imerso em governos de esquerda que "aparelharam o estado".

Para ela, esse "aparelhamento" acontece desde as salas de aula, "porque os professores têm a esquerda como ideologia principal". O mesmo acontece com a universidade, segundo a deputada eleita. Foi após o casamento que ela começou a mudar sua visão de mundo. O seu marido foi fundamental para o que ela chama de “metamorfose”.“Eu também tive a oportunidade de morar fora do país, encontrar um país capitalista, um país republicano e fazendo esses comparativos eu pude ter propriedade e entender qual é a ideologia que me representa. O fato de querer ser mãe e desejar um país melhor para meu filho também ajudou nessa metamorfose”, revelou.***

Bancada feminina cresce As mulheres representam mais da metade do eleitorado baiano, contudo a participação política ainda é considerada pequena. Nesta eleição foram 365 candidatas concorrendo junto a 805 homens. O fim das apurações das urnas por aqui, durante a noite de domingo, apontou que o estado elegeu o mesmo número de mulheres em relação a 2014. Foram três deputadas federais eleitas, sendo que nesta ocasião apenas Alice Portugal se reelegeu.

O cenário em Brasília é animador: houve um crescimento de 51% no número de mulheres que vão exercer o cargo de deputada federal. Saiu de 51 e foi para 77 mulheres em 2018. Apesar da crescente, as mulheres continuam em minoria esmagadora dentro da Câmara e representam apenas 15% dos eleitos.

No âmbito estadual, houve uma crescente e a Assembleia Legislativa contará com 10 mulheres, três a mais do que em 2014, quando a Alba era uma Casa de sete mulheres.

No Brasil, houve um aumento no número de eleitas tanto para a Câmara quanto nas assembleias, em geral. O Senado segue com sete senadoras, número igual ao registrado em 2014.

*Com supervisão dos editores Mariana Rios e João Galdea.